- Valor Econômico
Mantega, o BNDES e os desafetos Palocci e Henrique Meirelles
O Brasil conseguiu interromper uma brutal recessão ao alcançar crescimento econômico de 0,2% no 2º trimestre do ano em relação ao 1º, período em que Produto Interno Bruto (PIB) avançou 1%. O Brasil levará alguns anos para apenas neutralizar a queda do PIB superior a 7% apurada em 2015 e 2016. Até por esse motivo, não há razão para jogar para o alto as expectativas mais favoráveis, a reação do consumo e a chance de o país lentamente, muito lentamente, reduzir seu estoque de milhões de desempregados.
O contingente de famílias endividadas tende a diminuir, também progressivamente, com o aumento de renda e/ou sua preservação graças à inflação que deve se manter baixa durante meses e à queda dos juros.
Nesta semana, o Comitê de Política Monetária do Banco Central (Copom) deve reduzir a taxa básica em mais 1 ponto, para 8,25%, e confirmar o esperado por 100% de 42 economistas entrevistados em pesquisa realizada pelo Valor PRO de terça a quinta-feira da semana passada.
Para dezembro, a maioria dos analistas vê o juro entre 7% e 7,5%, mas há projeção no patamar de 6% - menos da metade de 14,25% em outubro de 2016, quando teve início o ciclo de alívio monetário. Essa queda abissal é um incentivo e tanto ao consumo e, por tabela, à expansão da atividade. No PIB do 2º trimestre o consumo mostrou seu potencial, embora tímido. O governo bateu bumbo e apontou o consumo como o "motor do crescimento". Nem todos concordam.
O economista Carlos Antonio Rocca, presidente do Centro de Estudos do Mercado de Capitais (Cemec) do Instituto Ibmec, alerta em entrevista aos jornalistas Sérgio Lamucci e Catherine Vieira, publicada nesta edição, para a fragilidade do consumo sem investimento no setor real da economia. O investimento está num nível baixíssimo, que "mal cobre a depreciação" do estoque de capital fixo. "Não há crescimento sustentável com uma taxa de investimento dessas", diz.
Após cinco anos da primeira e única experiência, o cálculo do rendimento da caderneta de poupança deve mudar de 0,5% ao mês mais Taxa Referencial (TR) para 70% da Selic mais TR a partir de 7 de setembro, se a Selic cair ao menos a 8,50% - nível definido em maio de 2012, quando a Selic rompeu esse patamar tornando-se uma ameaça ao financiamento da dívida pública por pagar ao aplicador 6,17% ao ano além da TR. Essa alteração, quem sabe definitiva se o governo for feliz em manter de vez o juro baixo, amplia a soma de eventos que torna excepcional e promissor este momento da economia brasileira.
E daí?
Se você, leitor, fez essa pergunta, acertou. Ela é a mais oportuna a se levantar a quatro meses do Natal e a um ano da eleição presidencial de 2018 sem que haja sinalização segura de que eventos políticos, jurídicos e policiais deixarão de impor retrocesso aos avanços da conjuntura econômica.
Nos últimos três dias, o Palácio do Planalto e o presidente Michel Temer passaram recibo a críticos do governo. O presidente, ainda na China onde participa da reunião do Brics, tenta manter distância das pressões políticas evidentes no entorno da Operação Lava-Jato, mas suas últimas manifestações despertaram justificada preocupação. No fim de semana, o presidente disse não se importar com o que está acontecendo no Brasil em função de vazamentos de informações sobre a delação de Lúcio Funaro, conhecido como operador financeiro do PMDB, e prestes a ser homologada.
O Palácio do Planalto, em nota distribuída na sexta-feira à noite pela Assessoria de Imprensa e Comunicação Social da Presidência da República, atirou para todos os lados ao tentar defender antecipadamente Michel Temer. A nota desqualifica Lúcio Funaro, Joesley e Wesley Batista, sócios do Grupo J&F, e a Procuradoria-Geral da República.
Funaro é chamado de "criminoso notório e perigoso", Joesley de "grampeador-geral da República" e mentiroso. A nota do Planalto cita o envio autorizado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) de informações complementares à delação fechada em maio pela JBS, e diz que os colaboradores [irmãos Batista] mentiram e omitiram fatos, "sobretudo em relação às falcatruas contra o BNDES ". O procurador é tratado como "camarada" dos delatores. A defesa de Funaro e a assessoria da PGR não se manifestaram.
Também em nota, Joesley Batista reagiu ao Planalto e chamou o presidente Temer de "ladrão-geral da República" que não consegue se defender dos crimes que comete. Na ânsia de divorciar o presidente de acusações que poderão vir a público neste início de semana, a nota do Palácio do Planalto desqualifica explicitamente supostas revelações feitas por Lúcio Funaro e pode ter aproximado ainda mais o presidente da República de eventuais ações criminais levantadas pela Lava-Jato.
As revelações de Funaro - desqualificadas ou não - devem ser usadas na construção do argumento que pode resultar na segunda denúncia da Procuradoria-Geral da República contra Temer. A primeira denúncia contra ele - por corrupção passiva - foi consequência de revelações feitas pelos irmãos Joesley e Wesley Batista. Contudo, a Câmara dos Deputados, em troca de benesses, livrou Temer da investigação pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Numa segunda votação a ser encaminhada pela PGR, os deputados terão o mesmo apelo para amparar o presidente?
A resposta a essa pergunta deve inquietar o governo. Mas ela não é a única questão a ofuscar o horizonte. Governo, parlamentares e empresários estão desconfortáveis com o acordo firmado entre o ex-ministro Guido Mantega e o Ministério Público Federal (MPF) acerca de uma conta bancária por ele não declarada que mantém na Suíça.
Se sabe que o acordo evita um eventual pedido de prisão preventiva de Mantega no âmbito da Operação Bullish que investiga operações do BNDES; não se sabe o que o ministro poderá detalhar sobre o banco de fomento que presidiu durante o governo Lula. Mantega também foi ministro da Fazenda de Dilma. Em oito anos na pasta, Mantega conquistou dois desafetos: Antonio Paloci e Henrique Meirelles. Palocci está preso. Meirelles é o titular da Fazenda de Temer.
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