Declarações desastrosas sobre inquérito que envolve Temer reforçam o mal-estar em torno de Fernando Segovia e o inabilitam ao cargo
Já foi um início de gestão pouco usual, o de Fernando Segovia na direção-geral da PF. A sua escolha, para começar, passou ao largo do superior hierárquico da Polícia Federal, o ministro da Justiça, Torquato Jardim, tendo surgido na cúpula do PMDB, em especial na área de influência do ministro Eliseu Padilha, da Casa Civil, e do ex-presidente José Sarney, os dois da forte retaguarda política do presidente Michel Temer, este sob investigação da própria PF. Eram, e são, ingredientes explosivos.
Adicione-se a esta mistura potencialmente letal o fato de Fernando Segovia substituir Leandro Daiello, nomeado pela petista Dilma Rousseff, e que teve um comportamento à frente da PF bem diverso ao que demonstra o atual diretor.
Daiello tomou posse em janeiro de 2011 e deu apoio à Lava-Jato, de cujo bojo saíram denúncias demolidoras contra Lula e outros petistas de alto escalão. Também saiu da Lava-Jato a descoberta do envolvimento da JBS (Joesley Batista) nos esquemas de corrupção instalados pelo PMDB, atingindo de forma direta Temer.
Segovia não seguiu o exemplo de Daiello. Logo depois de tomar posse, minimizou o fato de o ex-assessor de Temer Rodrigo Rocha Loures ter sido pilhado pela PF, nas ruas de São Paulo, apressado, puxando uma maleta com R$ 500 mil, que seriam de propina obtida supostamente de Joesley em troca de alguma facilidade garimpada em Brasília. Na análise de Segovia, “talvez uma única mala não serviria para apontar se houve ou não crime”. Pairou uma certa perplexidade sobre a percepção do diretor-geral da PF.
Segovia assumiu sob desconfianças, reforçadas por declarações desastrosas. Uma, esta sobre quantas malas de dinheiro configurariam um ato de corrupção. Outras vieram na entrevista que concedeu à agência de notícias Reuters, descredenciando o inquérito da própria PF que investiga a participação de Temer no favorecimento em negócios no Porto de Santos, e o delegado responsável por ele, Cleyber Malta Lopes. O resultado é que o diretor-geral da PF pulverizou sua credibilidade.
Fez todo sentido, diante da gravidade do caso, que o ministro do Supremo Luís Roberto Barroso, responsável pelo inquérito que investiga a ligação de Temer, e seu já conhecido ex-braço-direito Rodrigo Loures, com a Rodrimar, que explora terminais em Santos, convocasse Segovia, no sábado de carnaval, para prestar esclarecimentos. No entender de Barroso, Segovia, que irá ao ministro na segunda-feira, pode ter cometido infração administrativa e penal.
Por inevitável, é grande a repercussão na Associação Nacional de Delegados de Polícia Federal (ADPF), cujo presidente, Edvandir Félix de Paiva, disse que o diretor-geral pode ser enquadrado no código de ética da categoria. Enquanto no Congresso, o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) anuncia que, entre outras iniciativas, acionará a Procuradoria-Geral da República, responsável pelo controle externo da PF.
É possível que os esclarecimentos a serem prestados na segunda decidam o destino de Segovia. Sua permanência à frente da PF, porém, se tornou bastante difícil, caso a preocupação do governo seja tratar a instituição como um organismo de Estado e não subordinado ao grupo que está no poder.
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