Durante solenidade em Vitória, presidente diz que está sujeito a bombardeios a todo momento
Leticia Fernandes | O Globo
-BRASÍLIA- A prisão de amigos de Michel Temer, investigados no inquérito que apura irregularidades no decreto presidencial sobre o setor portuário, instalou no gabinete presidencial o temor de que a Procuradoria-Geral da República apresente a terceira denúncia contra o chefe do Executivo. Neste caso, o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), colocaria o tema em pauta e deixaria que os parlamentares decidissem se iriam ou não poupá-lo novamente.
As consequências de mais uma denúncia são as piores possíveis. Caso seja aceita pela Câmara, o presidente é afastado imediatamente do cargo. Mas, mesmo sendo arquivada, o potencial de estrago é enorme sobre uma possível campanha eleitoral de Temer à reeleição. Parlamentares que já salvaram a pele do presidente duas vezes enfrentariam mais dificuldades para voltar a fazê-lo em ano de eleição, avaliam aliados do governo. E, se o fizessem, cobrariam mais caro.
Interlocutores do presidente no Palácio do Planalto opinam que só essa operação em torno dos amigos de Temer e a possibilidade de mais uma denúncia já podem gerar a fragilização junto ao Congresso na reta final da reforma ministerial. A tendência é que agora os partidos da base aliada cobrem ainda mais caro pelo apoio ao governo — que se traduzirá em maior apetite por cargos e pedidos de liberação de emendas em ano eleitoral.
Se o governo já ficaria em segundo plano em 2018 por conta do cenário eleitoral, os novos fatos deixam a administração Temer “completamente paralisada”.
— O jogo eleitoral já começa com um perdedor, que é o governo. O Temer, obviamente, fica fragilizado para concorrer, e o governo entra em paralisia completa. Além disso, enfrentar uma terceira denúncia em ano eleitoral vai ser perigosíssimo — avaliou um dos aliados próximos ao presidente.
Outra análise do Planalto é que o cenário sem Temer no páreo eleitoral fortalece o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, que vai se filiar ao PMDB no início da semana que vem e quer ser o cabeça de chapa para presidente. Apesar de sair na frente, assessores palacianos afirmam que Meirelles também ficará em situação complicada, já que terá de defender o legado do governo e, caso de fato seja o candidato apoiado pelo Planalto, não conseguirá se descolar de Temer.
— Meirelles se fortalece para ser o candidato, mas ele terá que enfrentar o ônus e o bônus dessa escolha: vai defender o legado do governo, mas são os feitos do governo Temer, um presidente de quem o ministro não vai conseguir se livrar — disse um auxiliar presidencial.
Um ponto tido como determinante no governo, e que será acompanhado com lupa pelos ministros, é como vai se comportar Rodrigo Maia diante de uma terceira denúncia. É ele o responsável por pautar a votação, por isso o Planalto acredita, sem esconder a preocupação, que o contexto atual “dá muito poder” ao presidente da Câmara, que já lançou sua pré-candidatura à Presidência.
SEM COMENTAR PRISÕES
No final da manhã, durante a inauguração de um terminal do Aeroporto de Vitória, no Espírito Santo, Temer afirmou que a Presidência é um “trabalho dificílimo” e que “fica sujeito a bombardeios a todo momento”. O presidente não fez referência às prisões no discurso.
O governador do Espírito Santo, Paulo Hartung (PMDB), não compareceu à inauguração. Em nota, disse que “o país amanheceu sobressaltado com fatos políticos preocupantes”. Hartung não citou a Operação Skala, que prendeu amigos do presidente, mas defendeu “o amplo direito de defesa de todos os citados”.
PARA MARUN, CONSPIRAÇÃO
Depois de se reunir à tarde com Temer no Planalto, o ministro Carlos Marun, da Secretaria de Governo, chamou de “conspiração” e “complô” as prisões de amigos do presidente. Marun atribuiu indiretamente o suposto complô ao ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal (STF), relator do caso na Corte, e disse que foi o anúncio de Temer sobre a possibilidade de ser candidato que fez com que se virassem contra ele “canhões da conspiração”. Ao contrário do clima de velório que tomou conta de aliados do presidente durante o dia de ontem, o ministro disse que encontrou o presidente “absolutamente tranquilo”.
— Entendemos que a decisão do presidente de colocar a possibilidade de que venha a disputar a reeleição, colocar como concreta essa possibilidade faz com que novamente se dirijam contra nós os canhões da conspiração.
Marun negou que os novos fatos inviabilizem a candidatura de Temer e afastou a possibilidade de que surja uma terceira denúncia contra ele, fantasma que ronda o Planalto. Ele disse que não está no radar qualquer ofensiva jurídica da parte do presidente.
De manhã, logo que vieram as primeiras notícias das prisões, ministros mais próximos a Temer se reuniram com ele no Palácio do Jaburu. Eliseu Padilha (Casa Civil), Moreira Franco (Secretaria Geral), Torquato Jardim (Justiça) e Sérgio Etchegoyen (Gabinete de Segurança Institucional) tentavam entender as mudanças no cenário e o quanto isso atingia o presidente. O que se viu, naquele momento, foi um Temer “silencioso” e ministros “abatidos”, contou um dos presentes.
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