- O Estado de S.Paulo
Empresários e mercados esperam confirmação da agenda liberal na economia
Terminou neste domingo um dos períodos mais conturbados da história recente do País, que uniu a explosão das jornadas de 2013, o trauma do impeachment de Dilma Rousseff, a crise renitente do governo Temer e a cruenta campanha eleitoral de 2018. E, se esse fecho é motivo de alívio, não se pode dizer que seja também garantia de tranquilidade. Começa agora outra etapa, até o momento cercada de dúvidas e temores, mesmo para quem embarcou na novidade Jair Bolsonaro (PSL), eleito Presidente da República com uma plataforma que alia liberalismo e conservadorismo, mas apoiada principalmente na força do antipetismo.
Os próximos dois meses até a posse do presidente, em 1º de janeiro, serão cruciais, portanto, para clarear esse cenário e demonstrar se o novo presidente está disposto a honrar compromissos permanentes, conviver com os diferentes e governar para todos. E se será “novo” de fato, inclusive nas relações com o Congresso. Quanto às oposições, depois da tentativa frustrada de reagrupamento de forças no segundo turno, terão de provar se estão empenhadas em atuar com responsabilidade e contribuir para solucionar os problemas reais do País – não apenas em torpedear as iniciativas do Planalto.
Na economia, há uma expectativa adicional sobre essa fase de transição. Empresários e mercados estão ansiosos para que, já nos próximos dias, o novo governo finalmente “feche” um programa consistente, sem as idas e vindas das últimas semanas. Em relação a vários pontos importantes, como unificação de ministérios, privatizações, política de meio ambiente e especialmente reformas da Previdência e tributária.
Houve até especulações, na reta final da campanha, de que a equipe de Temer e os parlamentares, já de saída, assumiriam a tramitação da proposta da Previdência, o que aliviaria o início dos trabalhos do próximo governo. A ajuda faria sentido inclusive dentro da estratégia do Centrão – depois do encolhimento produzido pelas eleições – de se aproximar do futuro presidente e obter a confirmação de Rodrigo Maia (DEM-RJ) no comando da Câmara.
Há muito a ser feito para pacificar o País e renovar as esperanças da população. E isso depende não só dos projetos que os novos detentores do poder porão à mesa, mas também de sua atitude em relação aos contrários. Quase 13 milhões de desempregados esperam por uma melhora no mercado de trabalho, que lhes devolvam o alento pelo menos para buscar uma vaga – até mesmo aquelas de menor qualidade, que têm permitido a lentíssima queda da taxa de desemprego.
As empresas aguardam sinais mais visíveis da direção em que a política econômica vai caminhar, para que não se repitam apenas soluços de crescimento. E os mercados, que têm se fartado de apostar com a “compra” de Bolsonaro, escorados no currículo do guru e futuro ministro da Economia, Paulo Guedes, buscam garantias de que o presidente eleito vai esquecer o que disse lá atrás, na sua polêmica e pouco produtiva passagem pelo Congresso, e mesmo em alguns momentos da campanha. E vai confirmar com ações concretas sua “opção preferencial” pelo liberalismo.
É bastante provável que, respeitando a tradição, o novo governo viva uma espécie de lua de mel no começo do mandato com as parcelas da população que conduziram o capitão reformado à Presidência. E também com o Congresso, onde a formação de uma base ampla tende a ser vitaminada pelos acordos para ocupação de cargos na administração pública, apesar de todas as juras de que “dessa vez será diferente”. Mas, diante das múltiplas carências e da urgência de medidas para enfrentá-las, não se descarta a hipótese de que o período de graça seja abreviado.
O ponto para onde convergem interesses e preocupações dos vários segmentos sociais tem nome duplo: ajuste fiscal. Com tantas expectativas, muitas delas conflitantes, explicitar o que será feito para domar as contas públicas quer dizer, em resumo, explicitar quem serão, pelo menos a curto prazo, os principais perdedores nesse processo.
Nenhum comentário:
Postar um comentário