- Folha de S. Paulo
Depósito de assessor dispara todos os alarmes de quem investiga corrupção
A verdade é que ninguém estava pronto para um escândalo desses já agora.
Acabamos de sair da pior campanha eleitoral de nossa história, e mesmo os derrotados da eleição estavam aproveitando a trégua para respirar e se reorganizar. A maioria dos eleitores brasileiros votou em Bolsonaro, e, como convém a maiorias eleitorais no mês entre a eleição e a posse, ainda se permite ter esperança com o novo governo. Em não se tratando de reeleição, alguma lua de mel sempre é concedida ao recém-eleito.
Até porque, qual a probabilidade de aparecer uma denúncia de corrupção quente, antes da posse, que não tenha aparecido na campanha?
Pois é.
O Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) detectou que Fabrício Queiroz, ex-assessor do senador recém-eleito Flávio Bolsonaro, movimentou em 2016 e 2017 muito mais dinheiro do que poderia, plausivelmente, ter ganho com suas fontes de renda conhecidas. Entre os vários depósitos suspeitos feitos por Fabrício, R$ 24 mil para Michelle Bolsonaro, nossa nova primeira-dama.
O presidente recém-eleito, aparentemente, achou que ainda não estava suficientemente envolvido no escândalo e resolveu dizer que ele, Jair Bolsonaro, emprestou dinheiro para Fabrício Queiroz e que o depósito para a primeira-dama seria pagamento do empréstimo.
Olha, sinceramente, se era para inventar um negócio desses, era melhor ter pedido ajuda ao Olavo. Ele teria contado que Queiroz era do Foro de São Paulo, que o dinheiro havia sido roubado por George Soros usando a Lei Rouanet, que Bolsonaro nasceu no Quênia, enfim, algo que tampouco nos convenceria, mas, ao menos, nos manteria entretidos.
Assessor de político depositando dinheiro para a família do chefe é o tipo de coisa que dispara todos os alarmes de quem investiga corrupção. Na mesma hora em que as denúncias foram publicadas, por exemplo, o cientista político Sérgio Praça lembrou do caso do esquema de distribuição de dinheiro de PC Farias no governo Fernando Collor.
E, falando em gente que investiga corrupção, o que Sergio Moro pretende fazer? O novo ministro da Justiça não poderá continuar evitando perguntas sobre o assunto, e é bem ruim que as tenha evitado até agora.
Se um acusado da Lava Jato, sentado no banco dos réus, contasse essa história do empréstimo, Moro acreditaria?
Os bolsonaristas sabem que sofreram um golpe duro. Excepcionalmente, a bolsosfera calou-se.
Afinal, o pessoal precisa manter sua credibilidade, e a tese do empréstimo de Bolsonaro para Fabrício não é tão plausível quanto, digamos, a história de que Haddad distribuiu mamadeiras com bico de pênis nas creches de São Paulo.
Por um lado, é terrível para o governo Bolsonaro que sua imagem de honestidade tenha trincado já na saída. É um governo eleito na onda da Lava Jato, um governo com Sergio Moro no Ministério da Justiça. É muito ruim que tenha sido pego fazendo uma operação com tanta cara de centrão.
Mas também é verdade que o clima de ressaca pós-campanha não favorece o tipo de onda de opinião pública que, com essa denúncia na mão, em outro momento, poderia ameaçar um mandato.
De qualquer forma, é melhor que Bolsonaro tenha como sustentar seu governo em mais do que sua reputação de incorruptibilidade.
Mês que vem começa o ajuste econômico.
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Celso Rocha de Barros é doutor em sociologia pela Universidade de Oxford (Inglaterra).
Um comentário:
Tratando-se de articulista da Folha o comentário é plausível.
Propina não se paga em cheque nominal e quem tem que explicar é o indiciado.
Continuem torcendo para o novo governo dar errado, esta é a esquerda brasileira.
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