Após mais de um mês de expectativas, a semana que passou serviu para enterrar as chances de aprovação, este ano, do projeto de lei que regula a exploração dos campos de petróleo do pré-sal referentes à área da cessão onerosa. Discutida durante anos na seara técnica, a questão empacou de vez quando os políticos assumiram o protagonismo dos debates sobre o tema.
O projeto de lei foi a solução encontrada para definir parâmetros em torno dos quais não houve consenso na longa negociação entre a Petrobras e o Tesouro Nacional. As duas partes assinaram um contrato em 2010, quando a estatal recebeu da União o direito de explorar exclusivamente 5 bilhões de barris na área que passou a ser conhecida como cessão onerosa.
Os valores pagos por esses direitos, cerca de R$ 75 bilhões, deveriam ser revisados no futuro, considerando, entre outras coisas, a cotação do barril. Depende dessa revisão a exploração da área da cessão onerosa e também dos volumes excedentes, ou seja, que ultrapassam os 5 bilhões de barris.
Equipes técnicas da Petrobras, da Agência Nacional do Petróleo (ANP) e do Tesouro vêm debatendo exaustivamente o tema, mas ainda não há um acordo. Alguns parâmetros sobre os quais havia divergência foram incluídos no projeto de lei, bem como uma autorização para a Petrobras abrir mão da exclusividade na área da cessão onerosa.
Apesar de alguns ruídos, a matéria caminhava bem no Congresso, tendo sido chancelada na Câmara e estava em vias de votação pelo Senado. A aprovação foi apresentada como condição para que o governo pudesse entrar em acordo com a Petrobras e, então, promover o leilão dos excedentes, com arrecadação estimada em R$ 100 bilhões.
O dinheiro é considerado vital para o cumprimento da meta fiscal de 2019, primeiro ano da gestão do presidente eleito Jair Bolsonaro. Tendo como um dos pilares de sua campanha a melhor distribuição dos recursos federais, Bolsonaro e sua equipe acabaram aceitando atrelar a aprovação da matéria ao repasse de 20% dos recursos do leilão para Estados e municípios.
A decisão contrariou o equipe econômica do atual governo, que vinha apoiando o projeto de lei, mas passou a se opor à matéria. Em reuniões com o Tribunal de Contas da União (TCU), membros do alto escalão do Ministério da Fazenda disseram não fazer nenhuma questão do PL para assinarem um acordo com a Petrobras.
A essa avaliação se juntaram técnicos do TCU, que também discordaram do uso do projeto de lei. O argumento é de que seria "exótico" usar uma lei para definir as bases de um contrato entre duas partes que deveriam, em tese, chegar a um termo pela via negocial.
Além disso, os técnicos acreditam que a ausência de algumas variáveis no projeto de lei podem resultar em perdas financeiras para a União. Eles também alertaram que, diferentemente do que os políticos estavam dizendo, a aprovação da matéria no Congresso não garante a celeridade na liberação do leilão pelo órgão de controle.
Essa análise chegou aos ouvidos de ministros do TCU e do futuro ministro da Economia, Paulo Guedes, que também acabou recuando no apoio ao texto.
Não bastasse isso, a disputa pela presidência do Senado também ajudou a complicar o ambiente para a votação. Alguns dos principais postulantes ao comando da Casa trabalham para esvaziar a votação neste ano, visando figurarem como protagonistas na tramitação da matéria durante a próxima legislatura, a partir de fevereiro.
O problema é o calendário. Diante da necessidade de realizar o leilão no ano que vem, integrantes da equipe econômica consideram o mês de março como o limite para a assinatura do acordo entre a Petrobras e o Tesouro, independentemente de aprovação ou não projeto de lei.
Entram nesse cálculo uma estimativa de que o Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) pode levar até oito meses para liberar a realização do leilão. O cronograma também tem que considerar a análise do TCU, que atualizou seus procedimentos e pode levar até seis meses.
Em síntese, a novela em torno da aprovação do projeto de lei da cessão onerosa é o pano de fundo para a já rotineira dependência de recursos extraordinários para o fechamento das contas públicas. Só quando o país estiver com as contas equilibradas é que receitas extraordinárias poderão propiciar à sociedade benefícios, de fato, extraordinários.
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