- Folha de S. Paulo
Ele é o que de mais próximo temos de uma teoria ética completa e universalizável
Sempre sagaz, Reinaldo Azevedo escreveu na sexta (10/7) um texto em que me defende da alucinação jurídica do ministro da Justiça —pelo que lhe fico grato—, mas em que lança acusações que não me pareceram justas contra o consequencialismo, que simploriamente equiparou à ideia de que os fins justificam os meios.
Passo, então, à defesa dessa família de teorias éticas que, em sua essência, dizem que as ações podem ser julgadas positiva ou negativamente apenas pelos resultados que produzem.
Reinaldo obviamente não disse isso, mas muitas pessoas me escreveram afirmando que o consequencialismo está no cerne da barbárie nazista e que eu, como judeu, jamais poderia tê-lo invocado.
Não dá para falar em ética nazista sem incorrer em antinomia, mas, se há um teórico que tenta dar base racional e jurídica ao Estado hitlerista, é Carl Schmitt, autor complexo que bebe principalmente de fontes da teologia católica.
O pedigree do consequencialismo não poderia ser mais diferente. Modernamente, ele surge com o utilitarismo de Jeremy Bentham e John Stuart Mill, duas figuras de proa do liberalismo. E o lema básico do utilitarismo é que devemos tentar assegurar a maior felicidade possível para o maior número de indivíduos.
Não nego que o consequencialismo padeça de problemas graves. Eu mesmo já levantei vários deles ao longo de duas décadas de colunas. Para rememorar apenas o mais célebre, numa lógica puramente consequencialista, o médico estaria autorizado a matar um sujeito saudável para, com seus órgãos, salvar as vidas de cinco pacientes que aguardam transplantes.
Ainda assim, o consequencialismo, penso, é o que de mais próximo temos de uma teoria ética completa e universalizável. Não é coincidência que tenha se multiplicado em inúmeras correntes, que propõem soluções imaginativas para vários desses problemas. Acho até que o Reinaldo assinaria embaixo de algumas delas.
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