Para zelar pela imagem da Justiça, Congresso deveria rever também os critérios de indicação ao STF
É razoável a ideia lançada pelo presidente do Supremo, ministro Dias Toffoli, e apoiada pelo da Câmara, Rodrigo Maia, de estabelecer regras mais rígidas para que juízes e procuradores possam disputar eleições. Toffoli exagerou no prazo sugerido entre a saída do cargo e a candidatura — oito anos é um período demasiado longo. Mas seis meses, a regra em vigor, é um intervalo muito curto, que tem permitido aos magistrados usar sua atividade não para a missão nobre de promover a justiça, mas, em vez disso, para lançar-se de modo oportunista à carreira política.
Basta lembrar que diversos eleitos em 2018 tiveram como mote de campanha sua atuação no Judiciário no combate à corrupção, discurso que, em muitos casos, não passava de demagogia. Exemplos disso são o governador Wilson Witzel, hoje alvo de um processo de impeachment, sob acusações de desvios nas verbas de combate à pandemia, ou a ex-senadora Selma Arruda — apelidada “o Moro de saias” —, cujo mandato foi cassado por irregularidades em sua campanha.
A proposta que já tramita na Câmara, de autoria do deputado Beto Pereira (PSDB-MS), fala em cinco anos para desincompatibilização de juízes e procuradores. A Associação dos Juízes Federais (Ajufe) sugere um prazo mais curto, de três. O pano de fundo do debate é o ex-juiz Sergio Moro, visto como candidato viável para as eleições de 2022. Moro saiu da magistratura em 2018 para ocupar o Ministério da Justiça no governo Bolsonaro. Não há motivo sensato para impedir que, quatro anos depois, possa ser candidato. Além disso, qualquer nova regra adotada pelo Congresso deverá valer apenas para casos futuros, não para quem já tiver abandonado o Judiciário ou o Ministério Público.
O objetivo declarado por Toffoli para defender a mudança é evitar a politização do Judiciário e os danos causados à imagem de imparcialidade, necessária ao bom funcionamento da Justiça. Maia afirma que “a estrutura do Estado não pode ser usada como trampolim pessoal”. Se a preocupação é mesmo genuína, seria bom defender também outras regras quando o trampolim funciona na direção inversa: da política rumo a cargos no Judiciário, em particular às cadeiras do Supremo.
A Constituição é genérica ao estabelecer as regras de indicação ao STF. Exige apenas mais de 35 anos, “notório saber jurídico e reputação ilibada”. Em virtude disso, nosso Supremo tem uma composição sui generis no mundo, em que apenas 4 dos 11 ministros exerceram a magistratura antes de assumir seus cargos (dois na Justiça do Trabalho), 7 tiveram passagens pelo Ministério Público e pelo menos três ocuparam cargos de confiança dos presidentes da República que os nomearam. Para zelar pela credibilidade e pela imagem de imparcialidade do Judiciário, o Congresso deveria pensar nisso também.
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