- O Globo
Os que queriam acabar com a Lava-Jato conseguiram quebrar sua última trincheira, a própria Casa do Ministério Público. O Procurador-Geral da República, Augusto Aras, está sendo visto internamente como uma espécie de Cavalo de Tróia, colocado pelo presidente Bolsonaro para controlar as investigações.
Com a aproximação do governo com os políticos do Centrão, e a iminente abertura da vaga no Supremo Tribunal Federal (STF) com a aposentadoria compulsória do ministro Celso de Mello em novembro, a atuação de Aras, candidatíssimo à vaga, tem se intensificado.
Por isso a Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR), em uma das muitas notas que tem soltado nos últimos dias, afirma que Aras “coloca em indevida suspeição os esforços desenvolvidos por todos os membros que compõem as forças-tarefas, não contribuindo em nada para o aperfeiçoamento do debate travado sobre a evolução do modelo instituído”.
Diversas forças se encontraram nos últimos dias para atacar a Operação Lava-Jato, estimuladas pelas críticas recentes de Augusto Aras ao próprio Ministerio Público que deveria representar. Em uma live para advogados que na maioria defendem condenados ou investigados pela Operação Lava-Jato retransmitida pela TVPT, o Procurador-Geral da República deu um tiro no próprio pé.
Uma Comissão Parlamentar de Inquérito foi ressuscitada na Câmara para investigar as trocas de mensagens divulgadas pelo site Intercept Brasil entre os procuradores de Curitiba e o ex-juiz Sérgio Moro. Além de não terem provado nenhuma ilegalidade na condução dos trabalhos da força-tarefa de Curitiba, as mensagens não poderiam ser utilizadas como base para uma investigação pois são ilegais, fruto de invasão de hackers em celulares de autoridades públicas.
O presidente do Supremo, ministro Dias Toffoli, tem tido papel decisivo nesse trabalho de conter a Lava-Jato, suspendendo investigações e proibindo buscas e apreensões no Congresso, contra decisão do próprio STF que definiu que o foro privilegiado só vale para casos ocorridos no próprio mandato, e por causa dele. Os demais ministros que enfrentaram essa questão basearam-se na decisão do plenário.
O chefe dos procuradores de Curitiba, Deltan Dallagnol, também voltou a ser alvo de várias ações no Conselho Nacional do Ministério Público com o objetivo de puni-lo por declarações e atitudes no transcurso da Operação. Há uma tentativa de removê-lo “por interesse público”, uma decisão rara e grave, pois supera o direito a inamovibilidade dos procuradores.
As acusações vão desde as palestras pagas que fez, já consideradas legais, até a criação de um fundo bilionário para financiar o combate à corrupção ou a relação com investigadores dos Estados Unidos. Cada acusação destas já foi rebatida com decisões de órgãos competentes que garantiram a legalidade.
Coroando o cerco à Lava-Jato, o presidente do STF Dias Toffoli levantou a ideia de exigir uma quarentena de nada menos que 8 anos para membros do Judiciário que queiram entrar na política. Hoje em dia, a quarentena é de seis meses, o que de fato é muito pouco.
O sujeito oculto dessas manobras é o ex-juiz Sérgio Moro, potencial candidato à presidência da República em 2022. Interessa ao presidente Bolsonaro e a parte da classe política desmoralizar o combate à corrupção, e colocar obstáculos a uma eventual campanha presidencial de Moro.
É verdade que o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, já disse que a decisão, se for tomada, não pode retroagir. Mas uma eventual candidatura de Moro seria nesse caso certamente judicializada, um debate político-jurídico enorme, interpretações jurídicas diferentes, um juiz vai dar uma liminar, outro a derrubará.
Para Sérgio Moro esse ataque sincronizado pode até ser bom em termos políticos, pois voltou ao centro do debate como um candidato viável e temido pelos seus concorrentes. Mas é um retrocesso para a democracia brasileira.
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