O Globo
A agropecuária foi atingida pela seca,
encolheu no segundo trimestre e isso puxou o número do PIB para um ligeiro
negativo, de -0,1%. A crise hídrica está batendo também na inflação que, com o
novo aumento das bandeiras tarifárias anunciado na terça-feira, pode chegar a
10% em agosto e superar 8% no ano. Isso encolhe o consumo das famílias que
neste segundo trimestre ficou estagnado. Os investimentos tiveram uma queda de
3,6%, o pior resultado pelo lado da demanda. As medidas de restrição de consumo
vão afetar o PIB do quarto trimestre, que pode até ser negativo. A incerteza em
relação à pandemia cresce em setembro, mas a vacinação pode ajudar a reduzir a
crise sanitária no fim do ano. O pior fator de incerteza na economia são os
conflitos criados pelo presidente Bolsonaro.
A economia está sofrendo o impacto dos eventos de todas as áreas, as incertezas hídricas, sanitárias, políticas. A demora de ação na gestão da crise hídrica, da mesma forma que houve na pandemia, acabou aumentando o problema. O preço está subindo mais exatamente porque o governo dizia que estava tudo sob controle. O negacionismo é sempre um terrível elemento na administração de qualquer crise. Na sanitária, provocou o aumento de mortes e atraso na vacinação. Tudo isso afeta a economia. O PIB este ano terá um número forte porque está sendo comparado com o tombo enorme do ano passado, mas os dados divulgados ontem pelo IBGE foram piores do que o calculado pelo mercado.
O PIB do segundo trimestre foi
decepcionante. Esperava-se estabilidade, mas no terreno positivo, a mediana era
0,2%, mas havia instituições como a Genial apostando em 0,8%. A Tendências
previu exatamente -0,1%. A avaliação é que os serviços teriam um crescimento
mais forte e aumentaram em 0,7%. A retomada do setor é a grande aposta para
resultados melhores nos próximos trimestres, porque o avanço da vacinação vai
permitindo a normalização desse tipo de atividade. Mas a restrição provocada
pela crise hídrica pode levar o último trimestre até a um resultado negativo,
diz Sergio Vale, da Mendonça de Barros Associados.
A MB reviu a inflação do ano para 8,3%, com
o pico chegando a 10% em setembro, e isso por causa da nova bandeira tarifária
que eleva em mais 7% o preço da energia este ano. A energia residencial já
subiu 10% até julho e não há qualquer garantia de que vai parar por aí, o custo
das térmicas continua acumulando um déficit para ser pago por todos os
consumidores, que aliás vão financiar também o bônus dos que conseguirem
reduzir o consumo. O Itaú informou que o resultado do PIB do segundo trimestre
colocou um viés negativo para o crescimento deste ano. Previa 5,7%, um dos
números mais altos do mercado. Para o ano que vem, o banco há algum tempo reduziu
a previsão para 1,5%. O Bradesco iniciou seu relatório dizendo que “as
incertezas fiscais voltaram a reduzir a visibilidade do cenário” e revisou a
inflação do ano para 7,8% e o crescimento do ano que vem para 1,8%. Alertou que
as volatilidades vão continuar.
Os relatórios dos bancos e consultorias
divulgados ontem indicaram que o grande carregamento estatístico deste ano —
efeito da comparação com a queda forte do ano passado — continuará produzindo
números positivos no segundo semestre. Mas isso nem de longe é crescimento
sustentado. O ano que vem murcha, a inflação está elevando as projeções de
taxas de juros, o desemprego teve um número melhor em junho, mas principalmente
por aumento das vagas informais. A crise hídrica abre uma gigantesca avenida de
incerteza sobre a economia.
Crise hídrica afetando produção e preço,
pandemia ainda não debelada, juros altos, desemprego forte, risco fiscal
elevado já seriam sombras suficientes sobre a economia. Mas o governo é um
gerador de crises políticas e institucionais pelo comportamento desorganizador
do presidente da República. Isso bate no dólar, aumenta a inflação, que eleva
os juros, que reduz a perspectiva de crescimento. Quanto mais a inflação subir
neste fim de ano, menor será o espaço fiscal com o qual o governo conta para os
planos eleitorais do ano que vem. Para se ter ideia, o parâmetro usado no
Orçamento era de uma inflação de 6,2% este ano — e as projeções estão perto de
8% ou até mais — e um crescimento de 2,5% em 2022 que hoje ninguém mais aposta.
A economia já não vai bem e piora muito com o ingrediente conflito
institucional criado por Bolsonaro.
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