Editoriais
Bruno e Dom
Folha de S. Paulo
Tragédia expõe terra sem lei na Amazônia,
patrocinada pelo governo Bolsonaro
Surgiu a notícia mais temida, nem por isso
infelizmente menos provável, do paradeiro do indigenista brasileiro Bruno
Araújo Pereira, 41, e do jornalista britânico Dom Phillips, 57, desaparecidos
na Amazônia desde a manhã do último dia 5.
De acordo com
a Polícia Federal, um pescador envolvido com atividades ilegais
confessou ter participado do assassinato e da ocultação dos cadáveres da dupla,
que viajava de barco no extremo sudoeste do estado do Amazonas e visitava
comunidades na vizinhança da Terra Indígena Vale do Javari, que abriga o maior
número de povos isolados na floresta amazônica.
Restos humanos foram retirados do local
apontado pelo suspeito.
Pereira
trabalhou por uma década na Funai,
onde atuou como coordenador da Vale do Javari e de Povos Isolados. Tinha ampla
experiência na área, onde escolheu seguir trabalhando após exoneração do setor
de isolados e licenciar-se do órgão federal, passando a colaborar com a Univaja
(União dos Povos Indígenas do Vale do Javari).
Phillips acompanhava o indigenista para colher informações sobre o sistema de autodefesa dos povos locais contra invasões de garimpeiros, madeireiros, caçadores e pescadores ilegais. Elaborava um livro sobre como salvar a floresta pela qual se apaixonou ao se mudar para o Brasil em 2007.
Profissionais experientes, tinham
conhecimento dos riscos de circular num canto do Brasil frequentado também pelo
narcotráfico, tanto é que em boa parte dos trajetos contavam com escolta da
Univaja. Um advogado da associação informou que seus integrantes e Pereira já
haviam recebido ameaças dias antes.
Eram fortes, portanto, os sinais de que
eles teriam sido alvos de uma emboscada. Apesar disso, o Planalto tardou a
reagir, mobilizando esforços só depois de deflagrada intensa campanha nacional
e internacional para encontrá-los.
O mais lamentável na lerdeza desumana do
poder público é sabê-la em tudo condizente com o jaez de Jair Bolsonaro. Um
presidente bilioso e errático, que subscreve as mais delirantes doutrinas de
cobiça internacional pela Amazônia e hostiliza o quanto pode indigenistas,
ambientalistas e jornalistas.
Se criminosos agem livremente naquele
rincão amazônico é porque o Estado dali se ausentou. Bolsonaro mais uma vez
fugiu à responsabilidade, chegando ao cúmulo da ignomínia ao inculpar os
próprios desaparecidos e dizer que empreendiam uma "aventura" e
que Phillips era
"malvisto" na região.
Jornalismo não é aventura, a Amazônia não
será da democracia brasileira enquanto pistoleiros, facínoras e desmatadores
impuserem a lei do cão na região, e Bolsonaro não será presidente digno do
cargo enquanto se mantiver alinhado aos destruidores da floresta.
Maconha judicializada
Folha de S. Paulo
STJ dá decisão favorável ao acesso, mas
falta regulamentar o plantio medicinal
Acompanhando tendência evidente em países
desenvolvidos, o Superior Tribunal de Justiça autorizou na
terça-feira (14) o plantio de maconha para fins medicinais. A
decisão vale só para três pessoas, mas indica que o Brasil avança lentamente na
direção racional.
Tribunais têm dado decisões
conflitantes na matéria controvertida —são milhares de ações na
Justiça. Não há controvérsia científica, contudo, sobre efeitos terapêuticos de
canabinoides como o canabidiol (CBD) em casos graves de epilepsia, dores
crônicas, esclerose múltipla e quimioterapia, por exemplo.
Numa das ações ora julgadas, ainda em
primeira instância o juiz comunicou o cultivo à polícia, que tomou depoimentos.
Um tribunal federal reverteu a decisão desfavorável, mas o Ministério Público
Estadual recorreu; agora, no STJ, o Ministério Público Federal se manifestou a
favor da autorização.
A insegurança jurídica daí resultante, com
associações e pacientes obtendo apenas licenças precárias de cultivo, tem raiz
na ausência de regulamentação completa da cânabis medicinal pela União, como
previsto na Lei de Drogas de 2006. Anvisa, Congresso e Supremo Tribunal Federal
têm parte nisso.
A agência sanitária permite desde 2015 o
uso medicinal e, em 2019, baixou norma expondo requisitos para regularização de
canabinoides como fitoterápicos, com rigor similar ao de medicamentos
registrados. Só grandes laboratórios têm condições de segui-los, e meros 19
produtos estão autorizados.
A Câmara deu passo adiante ao aprovar em
2021 projeto para disciplinar o cultivo medicinal e industrial da planta.
Bancadas conservadoras barraram o envio imediato ao Senado, enquanto
parlamentares favoráveis criticavam restrições como o plantio apenas por
empresas e associações.
O STF procrastina há anos uma ação direta
de inconstitucionalidade e um recurso extraordinário para descriminalizar,
respectivamente, o uso medicinal e o porte para uso pessoal. No segundo caso,
sem definição de quantidades para posse, juízes não raro encarceram como
traficante quem deveria ser enquadrado como usuário.
Não está em causa a liberação geral, como
pregam adversários mais extremados de qualquer uso ou cultivo. Recorde-se que,
como todo medicamento, canabinoides têm efeitos adversos e só devem ser usados
com prescrição médica.
Entrada do Brasil na OCDE ainda desperta
ceticismo
O Globo
O presidente Jair Bolsonaro ainda estava
nos Estados Unidos na semana passada quando foi confirmado que a Organização
para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) — uma espécie de “clube
dos países ricos” — aprovou o roteiro de acesso do Brasil. A boa notícia o
levou a afirmar que o país vai assim “deixando para trás alianças com ditaduras
socialistas e consolidando parcerias benéficas para a nossa nação”. Havia,
porém, uma notícia, revelada pelo GLOBO, sobre a qual o governo não fez
comentário: as exigências para o Brasil receber a aprovação final da OCDE. A
não ser que faça mudanças radicais na política para o meio ambiente, será muito
difícil para o governo cumpri-las.
Não se trata apenas de proteger a Amazônia,
Pantanal e qualquer outro bioma, critério que se tornou comum entre os
requisitos exigidos de aspirantes a integrar organismos multilaterais como a
OCDE. É preciso, também, reforçar as agências de controle ambiental, combater a
impunidade e a violação de regras nessa área, além de fornecer garantias de que
a violência contra ambientalistas será investigada e punida com rigor.
O grande desafio para Bolsonaro é dar apoio
a agências ambientais, depois de passar três anos e meio de governo fazendo o
contrário. Foi metódica sua política de desmonte das estruturas de fiscalização
e punição do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais
Renováveis (Ibama) e do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade
(ICMBio). Para não falar no clamor mundial em torno do assassinato do
indigenista Bruno Pereira, com passagem pela Funai, e do jornalista britânico
Dom Phillips, cujos restos mortais foram enfim descobertos na região do Vale do
Javari, na Amazônia.
Em sua primeira viagem internacional como
chefe de Estado, em março de 2019, Bolsonaro visitou o então presidente
americano, Donald Trump, e parecia ter conquistado como trunfo o apoio dos
Estados Unidos à entrada do Brasil na OCDE. A posição americana consta dos
acordos firmados naquela viagem. Foi certamente frustrante para Bolsonaro saber
que os Estados Unidos decidiram dar prioridade à Argentina e à Romênia. Depois
que a informação veio a público numa carta do então secretário de Estado, Mike
Pompeo, a diplomacia americana teve de se desdobrar para reafirmar a posição
favorável ao ingresso do Brasil.
Os eleitores substituíram os republicanos
Trump e Pompeo pelos democratas Joe Biden e Antony Blinken, mais preocupados
com a Guerra na Ucrânia do que com a fila de espera à porta da OCDE. O
candidato Bolsonaro à reeleição precisa agora dizer o que pensa das reformas do
Estado que prometeu e não fez, da abertura da economia ao exterior e da
situação das contas públicas que se deteriora a cada medida demagógica e
eleitoreira que emana de sua aliança com o Centrão. Precisa explicar tudo isso
e também sua política desastrosa para o meio ambiente. Naturalmente a OCDE, por
precaução, deverá esperar as eleições de outubro antes de voltar a examinar a
candidatura brasileira.
Brasileiros têm lições a aprender com a
investigação sobre ataques ao Capitólio
O Globo
Para os brasileiros, é pedagógico
acompanhar as sessões da comissão da Câmara dos Representantes dos Estados
Unidos que investiga a violenta invasão do Capitólio no dia 6 de janeiro do ano passado,
por uma turba ensandecida, inconformada com a derrota de Donald Trump nas
eleições. Trump é o modelo do presidente Jair Bolsonaro no plano de contestar o
resultado das urnas em caso de derrota. Os Estados Unidos fornecem um exemplo
de como as instituições devem reagir caso o pior aconteça.
O procurador-geral Merrick Garland afirmou
que acompanha as conclusões da comissão da Câmara e deixou aberta a
possibilidade de abrir processo criminal contra Trump, se ficar comprovado que
ele foi responsável pelo ataque ao Congresso. Nesse caso, se Trump quiser
concorrer de novo à Presidência em 2024, a Suprema Corte se verá no papel
inusitado de decidir se ele ainda poderá ser candidato respondendo a processo
criminal (há controvérsia a respeito).
A situação é tão insólita que até Ivanka,
filha de Trump, e seu genro Jared Kushner afirmaram saber que a vitória do
democrata Joe Biden não era resultado de fraude. Nos diversos testemunhos dados
em vídeo ou presencialmente à comissão, vários ex-aliados de Trump se voltaram
contra ele.
O quadro que emerge mostra um Trump
obcecado com a ilusão da fraude eleitoral e refratário a qualquer divergência.
“Nunca houve indicação de seu interesse em saber como os fatos eram”, depôs o
ex-procurador-geral William Barr, que não conseguiu demovê-lo da obsessão. O
chefe da campanha de Trump, Bill Stepien, relatou que o presidente também
ignorou seus alertas para não se declarar vitorioso. Trump preferiu seguir os
conselhos de seu advogado Rudolph Giuliani na noite da apuração e foi adiante.
Giuliani, segundo relatos publicados no New York Times, estava embriagado.
A invasão do Capitólio deixou cinco mortos,
entre manifestantes e policiais. Pôs em risco deputados e senadores, além do
então vice Mike Pence. Arruaceiros trumpistas gritavam que enforcariam Pence e
chegaram a levar para a praça em frente ao Congresso um arremedo de forca.
Embora Bolsonaro busque inspiração no 6 de
janeiro em Washington, é difícil haver algo da mesma natureza no Brasil. Uma
diferença relevante é que aqui não existem inúmeras modalidades de votação,
como nos Estados Unidos. Os votos são centralizados no Tribunal Superior
Eleitoral (TSE) e somados no próprio dia da eleição. As urnas eletrônicas são
as mesmas no país todo. Outra diferença é que todas as dúvidas levantadas
contra o sistema eleitoral eletrônico vêm sendo esclarecidas com competência
pelo TSE e seus técnicos.
A lição a extrair dos Estados Unidos está na capacidade das instituições democráticas de resistir a autocratas e de puni-los por agressões ao Estado de Direito. Trump corre o risco de, em vez de voltar à Presidência, ir para a cadeia. Fanáticos existem em todo lugar, por isso há Constituição e leis para zelar pela normalidade institucional.
Remédio amargo contra a inflação
O Estado de S. Paulo
Brasil e EUA elevam juros para deter a alta do custo de vida; se o tratamento funcionar, a retomada do crescimento se dará em condições muito mais seguras
Crédito apertado e caro, terapia contra um
forte surto inflacionário, vai dificultar os negócios e a criação de empregos
nas duas maiores economias das Américas, neste ano e talvez no próximo. Se o
tratamento funcionar, Brasil e Estados Unidos poderão retomar o crescimento, em
seguida, em condições muito mais seguras e com maior vigor. No mesmo dia,
quarta-feira, os bancos centrais dos dois países determinaram novo aumento dos
juros básicos, o tratamento mais comum contra a alta dos preços ao
consumidor. A taxa brasileira foi elevada de 12,75% para 13,25% ao ano e atingiu o
mais alto patamar em cinco anos e meio. A americana subiu 0,75
ponto e alcançou o intervalo de 1,5% a 1,75%. Foi a maior variação desde 1994.
No Brasil, os preços no dia a dia do
consumo aumentaram 0,47% em maio e 11,73% em 12 meses. Nos Estados Unidos, a
alta mensal foi de 1% e a variação acumulada em 12 meses bateu em 8,6%, a maior
taxa em quatro décadas. As duas economias foram afetadas pelo aumento de custos
de matérias-primas, especialmente do petróleo, e por desarranjos nas cadeias
internacionais de suprimentos. Desajustes iniciados na fase da pandemia foram
agravados por efeitos da invasão da Ucrânia pela Rússia. Os danos causados pela
onda inflacionária são muito diferentes, no entanto, nos dois países.
No Brasil, a forte alta de preços é
socialmente mais desastrosa, porque a pobreza é maior, e mais pessoas são
duramente afetadas pelos custos de bens e serviços essenciais como alimentos,
gás de cozinha e energia elétrica. Além disso, as condições do mercado de trabalho
são muito piores no Brasil. O desemprego tem ficado abaixo de 4% nos Estados
Unidos e acima de 10% no Brasil. As condições dos desempregados são muito mais
graves neste país, onde pesquisa recente apontou a existência de 33 milhões de
pessoas com fome e de 125 milhões em insegurança alimentar.
Novos aumentos de juros deverão ocorrer. Os
dirigentes do Federal Reserve, o banco central americano, reiteraram a
disposição de avançar em sua política até levar a inflação à meta, isto é, ao
ritmo anual de 2% sustentável no longo prazo. No Brasil, o Comitê de Política
Monetária (Copom), órgão formulador da estratégia do Banco Central (BC),
reafirmou o propósito de conduzir a inflação até um patamar próximo da meta,
fixada em 3,25% para 2023, com limite de tolerância de 4,75%.
No ano passado o aumento dos preços ao
consumidor chegou a 10,06%, superando de longe o centro da meta (3,75%) e o
teto (5,25%). No cenário de referência do BC, os preços devem subir 8,8% neste
ano, ultrapassando amplamente, de novo, o centro do alvo (3,5%) e o limite de
tolerância (5%). No mesmo cenário, a inflação em 2023 poderá chegar a 4%. Mas o
compromisso é alcançar um resultado bem próximo do objetivo, de 3,25%.
Novo aumento de juros está previsto para a
próxima reunião do Copom, nos dias 2 e 3 de agosto. Segundo a nota emitida na
quarta-feira à noite, o ajuste poderá ser inferior ou igual ao decidido na
última reunião. A taxa básica poderá, portanto, chegar a 13,5% ou 13,75%. Em
qualquer caso, o arrocho continuará e os juros permanecerão muito altos até o
fim do ano, mesmo na hipótese de alguma redução nos últimos meses de 2022.
Qualquer trégua na política só fará sentido
se houver claros sinais de recuo da inflação. É cedo para apostar nessa
mudança. Por enquanto, as pressões inflacionárias são muito fortes e os
consumidores continuam pressionados pelos significativos aumentos acumulados em
12 meses. Além disso, a instabilidade cambial permanece, principalmente por
causa das incertezas quanto às contas públicas e à condução da política
econômica. Novas altas do dólar podem pressionar os preços internos e
realimentar a inflação. Também a elevação de juros nos Estados Unidos mexe com
os fluxos financeiros e torna desaconselhável uma redução da taxa básica no
Brasil. Sem um afrouxamento sensível da política monetária no País, qualquer
melhora das condições de negócios até o fim do ano será provavelmente modesta,
embora muito bem-vinda.
Um exemplo brilhante
O Estado de S. Paulo
Butantan, USP e Hemocentro de Ribeirão Preto se unem em projeto que traz esperança contra o câncer e deve servir de modelo para políticas públicas no País
Um tratamento inovador contra o câncer, com
resultados experimentais promissores no Estado de São Paulo, acaba de ganhar
dois laboratórios de ponta, um na capital e outro em Ribeirão Preto. Como
noticiou o Estadão, a iniciativa faz parte de um programa estadual
conduzido pelo Instituto Butantan, em parceria com a Universidade de São Paulo
(USP) e o Hemocentro de Ribeirão Preto. As duas unidades permitirão ampliar os
testes dessa nova terapia, capaz de “reprogramar” células de defesa do
organismo dos próprios pacientes para combater alguns tipos de câncer de
sangue, como linfoma e leucemia linfoide aguda.
A notícia merece ser celebrada. Primeiro,
porque indica que há um caminho para mais avanços no tratamento de doenças que
desafiam a medicina no mundo inteiro. Segundo, porque ajudará a reduzir custos
dessa terapia celular personalizada, que atua sobre o sistema imunológico e tem
no alto preço um de seus maiores obstáculos. O tratamento de um único paciente
custa até US$ 500 mil − ou R$ 2,5 milhões.
Com os dois novos laboratórios, mais
pessoas terão acesso à chamada terapia celular CAR-T, o que viabilizará a
realização de testes clínicos, previstos para começar em outubro, nos Hospitais
das Clínicas de Campinas, Ribeirão Preto e São Paulo. A fase de testes é
indispensável para que a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa)
futuramente dê aval à nova terapia. No Brasil, hoje, o tratamento só pode ser
aplicado a quem tem câncer em estágio avançado, nos casos em que não existem
mais procedimentos disponíveis. Nos últimos dois anos, sete pacientes se
submeteram à terapia e em todos eles houve remissão. A iniciativa é pioneira na
América Latina.
O êxito do programa até aqui já seria
motivo suficiente para aplausos. Vale destacar, porém, o arranjo institucional
por trás de uma iniciativa que envolve a cooperação entre pesquisadores,
profissionais da saúde e gestores públicos de diversas áreas vinculadas ao
governo estadual de São Paulo. Eis o modelo de política pública de que o Brasil
tanto necessita: quando se articulam esforços para que gente qualificada
trabalhe em parceria, resultados positivos costumam aparecer.
O investimento nos dois novos laboratórios,
conforme informou o Estadão, gira em torno de R$ 250 milhões. O Núcleo de
Terapia Celular e Molecular (Nucel) foi inaugurado na capital paulista, no
último dia 14 de junho. Está localizado na Cidade Universitária da USP,
instituição de reconhecida excelência acadêmica que acaba de subir seis
posições na mais recente edição do ranking internacional QS World University
Rankings − a USP voltou a ocupar o 115.º lugar entre mais de 1.400
universidades, sendo a mais bem colocada entre as instituições
brasileiras.
O segundo laboratório, em Ribeirão Preto, é
o Núcleo de Terapia Avançada (Nutera), com lançamento em 20 de junho. A nova
terapia, de acordo com o Jornal da USP, foi desenvolvida justamente na
Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da universidade.
Com as duas novas unidades, será possível
tratar até 300 pacientes por ano, o que corresponde a cerca de 15% do total de
casos estimados com potencial para se beneficiar da terapia. A ideia é
disponibilizar a nova opção de tratamento no Sistema Único de Saúde (SUS), como
destacou o reitor da USP, Carlos Gilberto Carlotti Junior.
Coordenador do estudo, o presidente do
Instituto Butantan, Dimas Covas, falou sobre a fase experimental do tratamento:
“Curar uma pessoa que estava em situação quase terminal é uma emoção
indescritível”, disse ele. E acrescentou: “Estes dois centros são fruto de anos
de dedicação de uma grande equipe. Somos mais de 50 pesquisadores trabalhando
há décadas em um único objetivo”.
O desenvolvimento de uma nova terapia
contra o câncer traz esperança de vida para muitos pacientes Brasil afora, algo
que, por si só, enseja otimismo. Da parte do governo paulista e dos demais
órgãos envolvidos, espera-se empenho redobrado para levar o programa adiante.
Que os novos laboratórios atinjam suas metas e, melhor ainda, que sirvam de
exemplo para gestores públicos no Brasil inteiro.
Vocação para causar problemas
O Estado de S. Paulo
Depois de provocar greves e confusão, Bolsonaro abandona sua promessa de dar aumento ao funcionalismo
Pode parecer inacreditável, mas faz sete
meses que o País está preso em idas e vindas da discussão do reajuste salarial
para os servidores públicos por obra e graça de Jair Bolsonaro. O tema, que
segue indefinido, foi inicialmente mencionado, sem que ninguém tenha
questionado, em 16 de novembro, quando o presidente estava no Bahrein. À época,
ele disse que a compensação salarial era necessária em razão da alta da
inflação e poderia ser viabilizada com o espaço aberto no teto pela Proposta de
Emenda à Constituição (PEC) dos Precatórios.
Os reajustes haviam sido proibidos no
início da pandemia de covid-19, quando o Congresso aprovou diversas propostas
para garantir recursos para o enfrentamento da doença pela União e por Estados
e municípios. Essa suspensão vigorou até dezembro de 2021. Até onde se sabe, os
servidores não planejavam fazer campanha salarial depois desse prazo. O anúncio
de Bolsonaro de que daria aumento salarial para policiais despertou o
funcionalismo – outras categorias federais se sentiram preteridas e
protestaram, inclusive com greves.
Todos no governo, inclusive o presidente,
sabiam que não havia clima político ou espaço orçamentário para reajustar os
salários dos servidores. Ademais, o prazo para uma solução era curto, já que a
Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) limita a concessão de benefícios em anos
eleitorais a partir de julho. Essa realidade inexorável, no entanto, não
impediu o ministro da Economia, Paulo Guedes, de compactuar com a
irresponsabilidade do chefe.
Mesmo sabendo que o valor já seria
insuficiente para contemplar as carreiras policiais, até então alvo exclusivo
da medida, Guedes pediu formalmente ao Congresso que reservasse R$ 1,7 bilhão
para este fim. Mais recentemente, depois de cogitar cortar R$ 7 bilhões em
recursos de áreas essenciais, Bolsonaro desistiu da proposta de aumento linear
de 5% a todos, mas continua a pressionar os técnicos por um parecer jurídico
que lhe dê amparo para dobrar o auxílio-alimentação do funcionalismo sem que
seja acusado de cometer crime de responsabilidade.
Com essa estratégia absolutamente
destrambelhada e orientada unicamente pela conquista de votos, Bolsonaro teve o
mérito de desagradar a todos os servidores. Agora, ele acena com aumentos em
2023, algo que provavelmente será concedido por qualquer que seja o governo
eleito, tendo em vista que o congelamento salarial vigora desde 2017.
A promessa voluntarista do presidente para
agradar a policiais e outros servidores federais produziu efeitos caros e muito
reais, impulsionando greves que atrasaram a divulgação de indicadores oficiais
da administração pública federal, inclusive os do Banco Central, geraram filas
imensas de caminhões em portos e represaram o atendimento de mais de 1 milhão
de beneficiários do INSS por meses. Ou seja: ao tomar decisões destrambelhadas
e eleitoreiras como essa, Bolsonaro só calcula o montante de votos que pode
amealhar, jamais os prejuízos que pode causar ao País.
Três bancos centrais em busca do juro
adequado
Valor Econômico
Os ajustes nos ativos entraram em modo
turbulento, como mostraram as grandes quedas nas bolsas na segunda-feira
O Federal Reserve americano, o Banco
Central Europeu e o Banco Central do Brasil agiram ontem para adequar a
política monetária a uma inflação até agora indomável. Em momentos diferentes
deste combate, os três movimentos não deixaram de causar alguma surpresa. O
Federal Reserve, que parecia tranquilo em buscar um horizonte neutro para os
juros, acelerou muito o ritmo de ajuste e aumentou a taxa dos fed funds em 0,75
ponto percentual, magnitude vista pela última vez em 1994. O BCE fez reunião de
emergência para afastar o temor de reedição da crise que assolou a zona do euro
em 2012 - a elevação rápida dos títulos das dívidas de países frágeis
fiscalmente, como Itália e Espanha. O BCB, que já havia esboçado interromper a
alta de juros, fará pelo menos mais uma, sem a menor garantia de que será a
última.
O ajuste dos preços dos ativos começa a
entrar em modo turbulento, como mostraram a forte queda das bolsas na
segunda-feira e a reunião emergencial do BCE na quarta. Os bancos centrais
enfrentam choques sobre os quais a política monetária tem limitado poder de
influência, em especial os distúrbios nas cadeias de produção e o aumento das
commodities, sem direção previsível no curto prazo.
O Fed e o BCE, principais BCs do mundo,
estão em estágios diferentes de busca da solução para uma inflação elevada
demais. Os EUA têm crescimento forte, consumo aquecido, mercado de trabalho
apertado e inflação inédita em 40 anos. O Fed via esta situação como
temporária, mudou de opinião em maio e tenta recuperar o tempo perdido com o
forte aumento do juro em junho, que poderá se repetir na próxima reunião.
A zona do euro tem crescimento mais fraco,
baixa pressão dos salários e consumo em recuo após altas violentas no preço da
energia, mas igualmente a maior inflação em 40 anos (8,1% em maio). Na semana
passada, o BCE anunciou que elevará os juros em agosto, isto é, vai retirá-los
da zona negativa em que ainda estão (-0,5%) e encerrar enormes programas de
afrouxamento monetário que levaram seus ativos a € 4,9 trilhões. Sinalizou
ainda que poderá acelerar o ritmo de ajuste para 0,5 ponto em setembro.
O conjunto da obra foi suficiente para que
os títulos da dívida soberana de Itália, Portugal, Espanha e outros disparassem
- roteiro parecido ao da crise anterior que quase cindiu a zona do euro. O BCE
fala em “fragmentação”: o aperto das condições financeiras tem efeitos muito
diferentes nos países da mesma união monetária. O mais grave da história é que
um princípio de crise tenha aparecido antes mesmo de o BCE mover os juros.
O Fed acelerou bastante o ritmo de ajuste.
Em seu nível atual, a taxa dos fed funds já está próxima daquela que ainda em
maio o banco esperava atingir ao fim do ano. O risco que motivou o banco a agir
assim foi o de desancoragem das expectativas inflacionárias. Ele abandonou a
ideia de um ajuste possível com a taxa de juro perto da neutra (2,5%) para
assumir uma perspectiva “moderadamente restritiva”. A mediana das projeções dos
membros do Fomc indicam juro de 3,4% ao fim do ano e perto de 4% (3,8%) em
2023.
O BC americano não vê possibilidade de
recessão. Com base nas estimativas do Fomc, o Fed deve andar mais rápido agora
e moderar o passo adiante. A previsão de crescimento sofre o maior impacto
ainda em 2022, quando se estima avanço de 1,7%, ante 2,8% da reunião anterior.
Mesmo com mais novas altas de juros em 2023, o PIB deve crescer 1,7% naquele
ano.
O novo horizonte do Fed é chegar logo a uma
taxa de juro moderadamente restritiva a partir da qual possa obter “quedas
consistentes, mensais” da inflação e ver “evidências convincentes” de que ela
irá em direção à meta de 2%. Powell afirmou que não é intenção do Fed que os
“inusualmente altos ajustes dos juros”, como os recentes, se tornem “comuns”.
Ao contrário de Fed e BCE, o BCB está em
final do ciclo de aperto monetário. Decretou novo aumento de 0,25 a 0,5 ponto
na próxima reunião e espera com isso que a inflação convirja “ao redor da
meta”, um sinal, inicial pelo menos, de que não tem a intenção de obter 3,25%
em 2023 a qualquer custo.
Em comum na ação dos BCs está a
incorporação de surpresas inevitáveis em um ambiente de enormes incertezas,
após choques inéditos seguidos. Se nada mudar, testarão níveis maiores de
juros, tornando mais próxima a perspectiva de recessão global. As chances de
crises no meio do caminho, decorrentes do próprio ajuste, como sugerem os
temores na zona do euro, indicam que o caminho será tortuoso e as chances de
sucesso, incertas.
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