Valor Econômico
Visão camicase vai implodir economia em
2023 e 2024
É real o risco de recessão no segundo
semestre deste ano. No segundo trimestre, a atividade econômica ainda estará no
terreno positivo por causa da agropecuária mas espera-se contração de 0,5% em
relação ao primeiro trimestre. Para o terceiro e quarto trimestres haveria
contração em torno de 0,6% por trimestre. Ou seja, sem o setor da agropecuária,
haveria uma retração no ano. Com o agronegócio é possível crescer 0,2% neste
ano, diz Silvia Matos, economista e coordenadora do Boletim Macro do FGV Ibre.
O maior problema hoje é salvar 2024. “Poderíamos vislumbrar uma queda da inflação e os juros cairiam no fim de 2023, e teríamos um ano de 2024 melhor. Agora, não estamos conseguindo ver os cenários para a frente, perde-se a oportunidade de ter o ano de 2023 mais difícil, mas com uma melhora em 2024. E qual o benefício que o governo pretende colher com essa postura? Não vejo nenhum”, diz Silvia Matos.
A ela preocupa muito o discurso do
presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que chegou a cogitar a acabar com a
autonomia do Banco Central e trocar a sua diretoria para que os juros caiam
rapidamente. Há discussões públicas em torno da relevância da responsabilidade
fiscal, do atual nível dos juros reais, das metas de inflação e do próprio
comportamento da autoridade monetária. O problema é que com esse discurso a
expectativa de inflação subiu para este e para os próximos dois anos.
Segundo o relatório Focus, divulgado na
quarta feira pelo BC, a mediana das projeções para o IPCA aumentou de 5,79%
para 5,89% em 2023, de 4% para 4,02% em 2024 e de 3,60% para 3,78% em 2025.
O PIB, por sua vez, aumentou de 0,76% para
0,80% para este ano, manteve em 1,50% para 2024 e caiu de 1,85% para 1,80% em
2025. Diante de tais prognósticos para o nível de atividade, o PIB de 0,2% do
Boletim Macro do FGV Ibre parece muito pessimista.
Silvia Matos diz que até pensou em rever
esse percentual para cima. O setor de serviços tem surpreendido por sua
resiliência e seria natural uma revisão dos prognósticos, mas esbarrou nessa
“visão camicase na economia”.
Ela garante, porém, que ainda há espaço
para reverter a situação. Caberia ao governo criar um “contexto favorável” para
salvar 2024. Infelizmente, 2023 “está praticamente perdido” e a continuar essa
visão da economia “vai-se implodir 2024 também”, teme Silvia.
“Não vejo qual o benefício de não querer
entender que existem restrições orçamentária”, diz ela. O que o governo colheu
até agora foi uma piora da curva de juros e deterioração rápida das
expectativas de inflação.
Por isso só com uma reversão deste ambiente
negativo, com uma regra crível de controle de gastos - que o ministro da
Fazenda, Fernando Haddad, comprometeu-se a anunciar em março - e sem mudança de
direção da política econômica, “pode-se salvar um pouco o PIB de 2023 e com
certeza o PIB de 2024”, avalia.
A política monetária encontra-se em
território contracionista há praticamente seis trimestres - período tido como
horizonte de tempo relevante para que se apareçam os frutos das ações do Banco
Central.
Porém a atuação conjunta do Executivo e do
Legislativo, no ano passado, resultou em elevado grau de artificialismo de
alguns preços, com reflexos sobre a trajetória da inflação de 12 meses em 2023.
Com isso subtraiu-se algo entre 2,5% e 3% da inflação do ano passado que terá
que ser contabilizado no índice de preços deste ano.
Por essa razão, a inflação medida em 2023
pouco cairá comparativamente à do ano passado, e talvez até a supere. O Banco
Central, por sua vez, terá dificuldade para mostrar que a inflação está em queda.
Melhor teria sido que a inflação de 2022 tivesse ficado mais próxima de 9%, e
não nos 5,8% oficiais.
A taxa de juros real ex-ante (com base no
swap 360) atingiu 8,42% ao ano no último trimestre de 2022 e, no início deste
ano, cedeu um pouco, caindo para 8,06% ao ano.
“Hoje os modelos apontam que a manutenção
da piora das condições financeiras levaria o PIB em termos interanuais para
terreno bem negativo no segundo semestre “, diz o Boletim Macro.
“Outro ponto é que o canal do crédito, no
momento, tem um refluxo bem mais intenso. Famílias estão muito endividadas e
muitas empresas estão com dificuldade de rolar suas dívidas. Já estamos vendo
isso”, diz Silvia Matos. Os bancos estão se retraindo, até por causa do rombo
das Lojas Americanas, mas, também, por não enxergarem um cenário claro do
futuro.
Os índices de confiança tanto dos
empresários quanto dos consumidores estão despencando.
A Turquia é um país que não quis aumentar
os juros e está com uma taxa de inflação oficial de 65%, embora órgãos
independentes da academia sustentem que a taxa é praticamente o dobro do que o
governo reconhece.
Como ficou claro que o governo de Lula
pensou em trocar o presidente do Banco Central por André Lara Rezende, que tem
sustentado que reduzir os juros não seria inflacionário, Silvia Matos pergunta
porque o atalho tentado por Alexandre Tombini, no governo de Dilma Rousseff,
não deu certo, assim como agora na Turquia também não tenha dado certo. Tombini
deu um “cavalo de pau” na taxa de juros, em agosto de 2011, quando depois de
aumentá-la para 12,5% ao ano, na reunião seguinte cortou os juros em 0,5 ponto
percentual e deu início a um processo de redução que encerrou com a taxa Selic
em 7,25%. Pressões inflacionárias o levaram a ter que aumentar os juros até
14,25% ao ano.
“São atalhos que já experimentamos e o
resultado foi ruim.”
Para ela, as propostas de André Lara
Rezende são “ideias sem modelos, números, mostrar o modelo de que reduzir juros
não gera inflação. Parece mais com a cloroquina”.
Quando fez o teto de gastos e parou com os
gastos parafiscais, os juros caíram e ficaram baixos um bom tempo, até vir a
pandemia. Ou seja, a meta de inflação de 3% era factível porque estávamos vindo
de um fiscal sustentável.
Achar que está tudo errado é um equívoco.
Um comentário:
Como assim: "Sílvia Mattos" pensou em rever a previsão para cima?! Qual é o grau de objetividade duma afirmação como essa?
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