Por Amanda Scatolini / O Globo
Ministro das Relações Exteriores se
manifestou após sua contraparte israelense, Israel Katz, ter chamado fala de
Lula sobre Holocausto de 'vergonha para o Brasil'
Em meio à crise diplomática entre Israel e
Brasil, o chanceler brasileiro, Mauro
Vieira, classificou as manifestações recentes do governo do premier Benjamin
Netanyahu como "inaceitáveis" e "mentirosas".
Nesta terça-feira, o chanceler israelense, Israel Katz, cobrou
um pedido de desculpas de Lula após a declaração sobre a ofensiva de
Israel em Gaza —
na qual o brasileiro comparou
a ação com o extermínio de judeus durante a Segunda Guerra Mundial —,
rotulando-a como "promíscua", "delirante" e uma
"vergonha para o Brasil".
— Uma Chancelaria dirigir-se dessa forma a um
Chefe de Estado, de um país amigo, o presidente Lula,
é algo insólito e revoltante — disse Vieira a repórteres nesta terça-feira na
saída da Marina da Glória, no Rio de Janeiro, local de reuniões do G20. — Uma
Chancelaria recorrer sistematicamente à distorção de declarações e a mentiras é
ofensivo e grave. É uma vergonhosa página da História da diplomacia de Israel,
com recurso a linguagem chula e irresponsável.
O ministro ainda expressou indignação com a forma como sua contraparte israelense dirigiu-se ao presidente, afirmando que a atitude do governo Netanyahu "e sua antidiplomacia não refletem o sentimento da sua população".
— O povo israelense não merece essa desonestidade, que não está à altura da História de luta e de coragem do povo judeu — disse Vieira. — Em mais de 50 anos de carreira, nunca vi algo assim.
Vieira também criticou fortemente Katz por
distorcer as posições do Brasil para "tirar proveito em política
doméstica" e destacou que o real problema reside no massacre em Gaza —
onde cerca de 30 mil já foram mortos, em sua maioria crianças e mulheres —,
destacando o crescente isolamento internacional do governo Netanyahu frente às
"deliberações em andamento na Corte Internacional de Justiça".
— É este isolamento que o titular da
Chancelaria israelense tenta esconder. Não entraremos nesse jogo. E não
deixaremos de lutar pela proteção das vidas inocentes em risco — completou
Vieira.
O ministro afirmou, ainda, que o Brasil
responderá diplomaticamente, mas firmemente, a qualquer ataque recebido.
Nesta terça-feira, Katz criticou
veementemente a declaração de Lula, chamando-a de "promíscua" e
"delirante" em uma postagem no X, antigo Twitter. Ele também afirmou
que a comparação era uma "vergonha para o Brasil" e uma afronta aos
judeus brasileiros. Katz reiterou, ainda, que Lula continuará sendo persona non
grata em Israel até que ele se desculpe por seus comentários, uma ação que a
diplomacia brasileira até
agora descartou.
A crise diplomática foi desencadeada pela
declaração de Lula, que também classificou como "genocídio" a guerra
em Gaza, sobre o Holocausto no último domingo. A fala do presidente brasileiro
ocorreu durante uma crítica aos países ricos que suspenderam o financiamento à
agência da Agência da ONU de Assistência aos Refugiados da Palestina no Oriente
Próximo (UNRWA, na sigla em inglês). Como resposta, o governo israelense declarou
Lula persona non grata.
Quando o integrante de um governo estrangeiro
é considerado persona non grata, ele deixa de ser aceito pelo governo do Estado
que o declarou, mas não equivale à expulsão. A definição, entre outros pontos,
também serve para mostrar descontentamento.
Em uma acentuação da crise diplomática, o
embaixador do Brasil em Israel, Frederico Meyer, embarcou nesta terça-feira de
volta ao seu país. Um dia antes, Meyer fora convocado
para uma reunião no Museu do Holocausto, em Jerusalém, para dar explicações
sobre a fala de Lula. Ao lado de Meyer, o chanceler israelense fez uma
declaração à imprensa em hebraico, após o encontro, sem direito a intérprete.
Foi nesta ocasião que o
chanceler foi visto usando um microfone de lapela, um detalhe que mostra
como o governo de Israel se preparou para expor o conteúdo da conversa com o
embaixador do Brasil em Tel Aviv. A quebra de protocolo, com a mudança de
última hora de local da reunião, foi avaliada por diplomatas brasileiros como forma
de constranger o representante do presidente Lula e criar um fato político a
favor do governo de Israel, levando
o governo a pedir a volta de Meyer ao Brasil.
Israel declarou guerra contra o grupo terrorista Hamas e passou a bombardear a Faixa de Gaza após os ataques 7 de outubro, com o objetivo de "aniquilar" o grupo fundamentalista. Em quatro meses de conflito, mais de 29 mil pessoas, a maioria civis, foram mortas no território palestino, segundo o Ministério da Saúde local.
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