terça-feira, 9 de dezembro de 2025

O crime na política, por Merval Pereira

O Globo

Para surpresa de ninguém, e isso é o mais grave, a Assembleia Legislativa do Rio votou pela soltura de seu presidente, Rodrigo Bacellar, preso por determinação do Supremo Tribunal Federal (STF) sob a acusação de vazar informações de uma ação da Polícia Federal

Para surpresa de ninguém, e isso é o mais grave, a Assembleia Legislativa do Rio votou pela soltura de seu presidente, Rodrigo Bacellar, preso por determinação do Supremo Tribunal Federal (STF) sob a acusação de vazar informações de uma ação da Polícia Federal (PF) contra o ex-deputado TH Joias, ligado à facção criminosa Comando Vermelho. A infiltração do crime organizado nas instituições políticas brasileiras é um fato, e a votação de ontem confirma que, no Rio, ela já está impregnada no cotidiano. O presidente da Alerj era um potencial candidato à sucessão de Cláudio Castro ao governo do estado, apoiado pela máquina política bolsonarista que tenta se organizar para enfrentar o atual prefeito Eduardo Paes, apoiado por Lula. O berço do bolsonarismo está, portanto, dominado pelo crime organizado, e também por isso a disputa com o STF recende a retrocesso no combate à corrupção.

O paradoxo da situação é que o STF está do lado certo, assim como o governo petista, que apresentou um projeto nacional de segurança pública tendo como um dos pilares o combate à corrupção. Os bolsonaristas, quando estiveram no poder, retrocederam no combate à corrupção para proteger a família Bolsonaro. Agora acusam o governo petista de corrupto e o STF de cúmplice do petismo por ter soltado Lula da prisão para concorrer à Presidência em 2022 e por ter acabado com a Operação Lava-Jato, talvez a mais importante ação da Justiça contra a corrupção no Brasil.

Quando um ministro do STF protege com sigilo total as investigações sobre corrupção no Banco Master, dias depois de ter viajado para ver a final da Libertadores em companhia do advogado de um executivo do banco no jatinho privado de um empresário, ou quando outro colega seu tenta impedir que o Senado possa atuar no impeachment de ministros do Supremo porque políticos de direita prometem fazê-lo na próxima legislatura, o que se tem é puro suco de brasilidade negativa — ações desencontradas que não são de direita ou esquerda, mas personalistas e fisiológicas.

Numa disputa eleitoral polarizada como promete ser a do próximo ano, o governo atual, apesar dos pesares, tinha vantagem quando o ex-presidente Bolsonaro anunciou que seu filho Flávio seria candidato. Evidentemente o mercado sentiu que a chance de Flávio vencer Lula é mínima, quase não existe; por isso a Bolsa caiu e o dólar subiu quando ele anunciou a candidatura, e aconteceu o contrário quando admitiu que poderia desistir, mas cobraria um preço. Se o anúncio da candidatura foi surpreendente, a admissão de que pode não ser a decisão final foi muito apressada para ter algum efeito.

O problema é que Flávio não tem voto para ganhar eleição, e não é crível a informação de Valdemar Costa Neto, presidente do PL, de que Bolsonaro é uma máquina de transferir votos. Fernando Haddad já provou que nem Lula transfere tantos votos. Tudo indica que, mais uma vez, os “estrategistas” do clã Bolsonaro erraram na mão, possivelmente pensam em negociar a candidatura em troca da anistia ao ex-presidente. Mas não acontecerá. A receptividade do Centrão foi péssima. O grupo ficou quieto, aguardando os próximos passos. O candidato deles é o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, que tem mais potencial de votos se apoiado por Bolsonaro e só se candidatará se tiver esse apoio.

Caso contrário, fica aberta uma avenida para outros candidatos de direita que não sejam tão ligados a Bolsonaro, como Ratinho Jr., do Paraná; Ronaldo Caiado, de Goiás; ou Eduardo Leite, do Rio Grande do Sul — todos já se movimentando. Flávio ficará com o nicho de bolsonaristas radicais e não fará nem cócegas na eleição. O candidato de direita que se viabilizar para o segundo turno terá todas as condições de ser competitivo contra Lula.

 

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