Folha de S. Paulo
Teoria liga vício na estrutura produtiva
baseada em extrativismo de recursos naturais a uma prisão no subdesenvolvimento
Liderado pelo professor Luiz Carlos Bresser
Pereira, o Novo Desenvolvimentismo (ND) oferece uma teoria econômica que
explica a doença holandesa. É uma espécie de vício da estrutura produtiva
em extrativismo
de recursos naturais ou de rendas financeiras que aprisiona os
países no subdesenvolvimento de seu potencial produtivo.
Esta condição afeta, por exemplo, países ricos em petróleo —como Venezuela, Noruega, Holanda e Brasil— e se manifesta como uma tendência à sobreapreciação cíclica e crônica da taxa de câmbio, que asfixia a lucratividade das empresas industriais na fronteira tecnológica de seus setores. O resultado é a desindustrialização prematura e acelerada.
Para o ND, a taxa de câmbio tem papel central
na decisão de investimento de empresas exportadoras competentes por afetar a
taxa de lucro das mesmas. Uma pauta de exportações dependente de commodities
—no Brasil, elas somam 70% do valor exportado— produz uma taxa de câmbio que
equilibra as contas externas, mas inibe a inovação tecnológica de ponta.
Como um interruptor, a taxa de câmbio liga e
desliga o acesso da indústria a uma fonte importante de demanda: o mercado
externo. Por isso, um câmbio apreciado inibe investimentos industriais. A
obsolescência tecnológica que se segue mantém as empresas fora do mercado
internacional. Com efeito, a produção industrial e os bons empregos dão lugar a
importações financiadas com abundantes capitais externos que perseguem nossa
elevada taxa de juros.
Nesta semana, o Centro de Estudos do Novo
Desenvolvimentismo da FGV (FGVcnd) divulgou a atualização da Taxa de Câmbio de Equilíbrio
Industrial. O gráfico mostra que a nossa taxa de câmbio observada está abaixo
do equilíbrio industrial. Se for mantida, a tendência de apreciação será nociva
à produtividade da nossa economia.
Dois estudos recentes, publicados em revistas
acadêmicas internacionais, utilizam dados no nível das empresas para ilustrar
os efeitos persistentes da sobrevalorização cambial sobre a produtividade, como
defende o ND.
O caso chileno é explorado por Rodrigo Heresi (BID), em que a doença holandesa tirou
dinamismo do país com a governança macroeconômica da América Latina mais
alinhada à ortodoxia, com política fiscal anticíclica e fundo soberano. O boom
de commodities nos anos 2000 levou a uma apreciação cambial que elevou a taxa
de retorno exigida ao capital.
O sistema de preços da economia deslocou
recursos das empresas exportadoras chilenas com uso intensivo de capital para
empresas menos sofisticadas e que exportavam menos. O resultado foi que o maior
produtor mundial de cobre perdeu entre 13% e 32% da produtividade observada
entre 2004 e 2012.
Branstetter e Laverde-Cubillos (2024) analisam o caso colombiano em "The dark side of the
boom: Dutch disease, competition with China, and technological upgrading in
Colombian manufacturing". Entre 2003-2010, o câmbio real efetivo
colombiano se valorizou, deslocando recursos para setores intensivos em
recursos naturais e de serviços.
Contudo, a subsequente depreciação cambial,
ao final do boom, não reverteu os efeitos sobre a composição do PIB,
persistindo os efeitos deletérios sobre os manufaturados comercializáveis. O
efeito de uma década de falta de competitividade industrial levou à redução de
gastos em pesquisa e desenvolvimento, deixando cicatrizes no sistema produtivo.
Educação, burocracia e tributação são
restrições relevantes aos ganhos de produtividade, mas é a inovação ligada à
indústria e aos serviços sofisticados que os gera e sustenta. A sobreapreciação
cambial inibe este mecanismo e, por isso, deve ser evitada antes que altere
permanentemente a estrutura produtiva.
Parabéns ao Prof. Bresser Pereira, que
completa 90 anos de vida neste domingo!
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