Valor Econômico
Presidente agora aceita correr riscos
Há uma evidente mudança de
estratégia de comunicação do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. As recentes
entrevistas às rádios CBN e Itatiaia e ao portal UOL mostram isso.
O Lula de 2023 fez uma opção
preferencial em se comunicar com entrevistadores mais alinhados a seu
pensamento e a veículos de alcance regional, nas ocasiões em que cumpria agenda
de viagens aos Estados, com pauta específica. Tentou também fazer uma mídia
direta, com a entrevista ao vivo que concedia pelos canais da TV Brasil. Eram
ambientes controlados. A mudança de estratégia sinaliza que não funcionou.
O Lula de agora aceita correr riscos. Ele se vê obrigado a responder de improviso a questões desconfortáveis. Joga com as pedras brancas do xadrez, dá o lance inicial. Em três entrevistas o presidente descartou alternativas para cortes de gastos, como revisões de vinculações constitucionais, retomou os ataques ao presidente do Banco Central, disse que não gosta do grande favorito para vencer as eleições americanas e que não pretende ter diálogo com o presidente argentino, a não ser que ele se humilhe. No plano político, Lula condicionou a permanência de um ministro de seu governo, nominou os possíveis candidato da direita em 2026 e deixou claro que pensa na reeleição.
Não surpreende a oitava
candidatura presidencial de quem já se lançou sete vezes (1989, 1994, 1998,
2002, 2006, 2018 e 2022). O que vale ressaltar é com que discurso Lula se
apresenta em seus primeiros movimentos da sua nova campanha. Provocado a
responder como reagiria caso o ex-presidente Jair Bolsonaro recupere seus
direitos políticos e se apresente para uma nova disputa, afirmou nesta
quinta-feira: “Se eu derrotei ele quando eu era oposição e ele situação,
imagine agora. Eu vou mostrar para ele que quem está na Presidência só perde
uma eleição se for incompetente”, disse à Rádio Itatiaia nessa quinta-feira.
Depois de ressalvar que é
muito cedo, que há muita gente que pode ser candidato em seu campo, que não
precisa ser ele, mas que “se todos os indicadores mostrarem” que ele “é a única
pessoa para derrotar o fascismo e a extrema direita”, não terá problemas em
disputar. Isso é conversa de quem é candidato. Em outras palavras, se ele
estiver bem nas pesquisas, tentará ficar no Planalto até 2030.
Em uma ofensiva midiática como
a de agora, Lula tenta conseguir algo importante, que é o controle da pauta.
Que falem bem ou mal, mas que falem dele. É algo que Bolsonaro tem feito com
uma competência que não guarda relação com o seu desempenho como administrador.
Um dado que pode explicar a
guinada de Lula está justamente na oposição. Neste domingo, 30 de junho,
completa-se exatamente um ano que Bolsonaro foi declarado inelegível pelo
Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Nesse ano de inelegibilidade, o antipetismo se
movimentou. As pesquisas indicam que a direita independe de Bolsonaro para
continuar relevante e competitiva, ainda que ele permaneça como a referência
maior.
Na hipótese de a
inelegibilidade de Bolsonaro continuar e ele não puder ser candidato, hoje o
cenário mais provável, haverá nas urnas uma opção tão conservadora como o
ex-presidente ou até mesmo mais do que ele. Pode ser um bolsonarismo silencioso
e sereno, como é o governador de São Paulo Tarcísio de Freitas, ou um
bolsonarismo de corte tradicional-oligárquico, como o de Ronaldo Caiado, ou o
que mistura política e religião, de Michelle Bolsonaro. É tudo bolsonarismo.
Aquele na oposição que se
propuser a ser o pós-Bolsonaro divide o campo, e por isso seus herdeiros
presuntivos não o fazem. Ninguém quer repetir o erro de Ciro Gomes, que apostou
em 2018 que Lula deixaria de ser uma referência na oposição por estar inelegível
e preso.
A mais de dois anos da eleição
presidencial de 2026 ainda não existe massa crítica de pesquisas que apontem
cenários, mas há indicadores de que Tarcísio, Caiado e Michelle são, sim,
competitivos, desde que não disputem um contra o outro. E isso graças ao fato
de a extrema direita ter conseguido nas redes se reorganizar depois dos atos
golpistas de 8 de janeiro. Nem todos os percalços da popularidade de Lula se
devem às mazelas do atual governo, que são numerosas. Parte do aumento da
rejeição ao atual presidente se deve à competência comunicacional da oposição.
O ministro da Fazenda,
Fernando Haddad, é a opção óbvia dentro do governismo caso Lula não se
candidate. Ele só se torna uma opção real em caso de sucesso absoluto da gestão
Lula, algo que possa repetir em 2026 a onda de 2010 em que surfou a “mãe do
PAC”, Dilma Rousseff. Não há absolutamente nada que indique esse céu de
brigadeiro a médio prazo. Com o tempo fechado, a oitava candidatura de Lula se
impõe.
Pergunte aos Dados
Este colunista estará de férias até 15 de julho. A partir dessa data, este colunista continuará no Valor de outra forma e com outro foco, voltado para cenários políticos, econômicos, eleitorais e de tendências de comportamento, ancorado em diferentes bases de dados, disponíveis no blog “Pergunte aos Dados”, no site do jornal, com a agilidade que o meio digital exige, e também na edição impressa.
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