Financial Times / Valor Econômico
Políticos de todos os espectros fariam bem em começar a ouvir o que os diferentes eleitores de minorias étnicas realmente querem, em vez de se basearem em estereótipos cada vez mais errôneos
Em ambos os lados do Atlântico, um dos
padrões mais antigos em demografia eleitoral começou a se desintegrar. O
principal indicador de uma queda de apoio ao Partido Trabalhista nas eleições
gerais do Reino Unido deste ano veio do eleitorado de origem muçulmana,
enquanto os melhores resultados dos Conservadores ocorreram em áreas com
grandes populações hindus. No geral, o Partido Trabalhista conquistou menos da
metade dos votos de não brancos pela primeira vez na história.
Nos Estados Unidos, o vale do Rio Grande, de maioria hispânica, mudou drasticamente a favor de Donald Trump em 2020, americanos vietnamitas na Califórnia abandonaram os democratas, e bairros de maioria negra na Filadélfia ficaram significativamente menos “azuis” (menos inclinados a apoiar os democratas). Os republicanos tiveram o melhor desempenho entre eleitores não brancos em quatro décadas, desde 1960.
Sempre há o perigo de interpretar
excessivamente esses acontecimentos, e vale destacar que os britânicos e
americanos não brancos como um todo ainda tendem a ser de esquerda. Mas
resultados contrários estão deixando, cada vez menos, de ser exceções. Mais
importante ainda, esses exemplos destacam algo que sempre foi verdade, mas foi
frequentemente ignorado: eleitores de minorias étnicas não formam um bloco
homogêneo.
Medir a opinião pública entre grupos pequenos
e de difícil acesso é desafiador. Mas esta semana um novo estudo inovador do
think-tank “UK in a Changing Europe” e da empresa de pesquisas Focaldata fez
exatamente isso, lançando luz sobre a ampla gama de atitudes e prioridades
entre diferentes grupos minoritários na Grã-Bretanha. Ele revelou que, muitas
vezes, estas estão mais próximas do espectro conservador do que do
progressista.
Para dar um exemplo, 22% dos britânicos de
minorias étnicas dizem que é importante para eles que o governo mantenha
impostos baixos. Esse número é quase o mesmo entre eleitores conservadores
brancos, e muito superior aos 14% dos eleitores trabalhistas brancos que
compartilham dessa opinião.
Da mesma forma, enquanto 37% dos eleitores
trabalhistas brancos com educação universitária dizem que o governo deveria
adotar uma postura firme sobre questões de justiça social, apenas 25% dos
eleitores de minorias concordam, caindo para 21% entre os indianos britânicos -
mais próximo dos 14% dos conservadores brancos que têm a mesma opinião.
Esses padrões são consistentes com a ideia de
que a política pós-materialista se tornou cada vez mais comum entre aqueles que
já alcançaram uma posição confortável na sociedade, enquanto aqueles que ainda
estão ascendendo - incluindo minorias étnicas - muitas vezes ainda se
concentram em preocupações materiais.
A situação é semelhante nos Estados Unidos,
onde a guinada à esquerda entre liberais brancos educados fez com que os
democratas brancos ultrapassassem a posição das minorias em um número crescente
de questões, incluindo imigração, racismo, patriotismo e meritocracia.
Os progressistas brancos americanos agora têm
opiniões sobre essas questões culturais completamente desalinhadas em relação
ao eleitor médio negro ou hispânico, de acordo com uma análise da empresa de
pesquisas Echelon Insights.
Conservadores radicais nos EUA estão tão
distantes da opinião das minorias quanto o outro extremo. A esquerda era o lar
natural dos não brancos, o que agora é menos evidente. Os americanos de cor
agora estão equidistantes de progressistas brancos e conservadores
Para ser claro, os conservadores radicais nos
EUA estão tão distantes da opinião das minorias quanto o outro extremo. Mas,
historicamente, a esquerda era o lar natural dos americanos não brancos, o que
agora está se tornando menos evidente. Em termos de ideologia política
autodeclarada, os americanos de cor agora estão aproximadamente equidistantes
entre progressistas brancos e conservadores.
Essas mudanças são particularmente notáveis
nas campanhas eleitorais em ambos os países. Nos EUA, a postura firme de Kamala
Harris sobre imigração na fronteira sul não é uma traição à base diversificada
dos democratas; aproxima-se mais das preferências políticas do americano
não-branco típico.
No Reino Unido, a disputa pela liderança do
Partido Conservador entre Kemi Badenoch e Robert Jenrick assume um novo
significado quando analisada no contexto dessas descobertas. Um partido
conservador focado na aspiração econômica e liderado por uma britânica
nigeriana poderia muito bem ganhar terreno junto à grande população de
britânicos de minorias conservadoras cujos valores e escolhas de voto de
direita ainda não estão totalmente alinhados.
A eleição nos EUA no próximo mês será
decidida por margens muito estreitas, enquanto antigas alianças partidárias no
eleitorado britânico estão se rompendo. Nunca foi tão importante entender onde
realmente está a opinião pública.
Políticos de todos os espectros fariam bem em
começar a ouvir o que os diferentes eleitores de minorias étnicas realmente
querem, em vez de se basearem em estereótipos cada vez mais errôneos ou de
tratarem grupos altamente heterogêneos como um bloco uniforme.
Nenhum comentário:
Postar um comentário