Paulo Celso Pereira / O Globo
Partidos negociam federação, junto com o
Solidariedade, após sofrerem derrotas expressivas nas eleições municipais deste
ano
Rio de Janeiro - Após sofrerem uma derrota
expressiva nas eleições deste ano, dirigentes do PSDB, PDT e
Solidariedade (SD) devem se reunir nas próximas semanas para negociar uma nova
federação partidária. A medida é considerada inevitável diante da chamada
cláusula de barreira, que estabelece um número mínimo de votos que os partidos
precisam nas eleições à Câmara de Deputados para ter direito a fundo partidário
e tempo de TV.
A cláusula, criada em 2017, já havia afetado
partidos pequenos — fisiológicos ou não — nas eleições de 2018 e 2022. Com o
resultado do último domingo, a tendência é que ela mude também o destino de
algumas das mais tradicionais legendas do país na Nova República.
Atravessando uma profunda crise há quase uma década, o PSDB viu sua bancada federal ser reduzida a 13 parlamentares em 2022 e agora perdeu quase metade de seus prefeitos: saiu de 520 eleitos em 2020 para 269. O desafio agora é sobreviver à cláusula, que exigirá em 2026 um número ainda maior de votos.
Entusiasta da federação, o presidente do SD,
Paulinho da Força, também acompanhou o derretimento da legenda este ano mesmo
após a incorporação do PROS: em 2020, os dois partidos haviam conseguido eleger
135 prefeituras, mas agora a sigla ficou com apenas 62.
— Estamos discutindo detalhes com PSDB e PDT.
A ideia é tentar fazer a federação mais ampla possível, com até cinco partidos,
para não ter um dono. O objetivo é anunciar já em novembro — explica Paulinho
da Força.
O impacto da cláusula de barreira no quadro
partidário pôde ser medido numericamente no primeiro turno deste ano. Em 2020,
primeira eleição municipal com a regra já em vigor, 29 partidos elegeram
prefeitos. No último dia 6, o número de legendas ou federações a vencer em
alguma cidade caiu para 21.
Antes das eleições de 2022, o PSDB já havia
montado uma federação com o Cidadania para ajudar o parceiro histórico. O PT
fez o mesmo com PCdoB e PV para salvá-los do cadafalso. Em uma parceria mais
equilibrada, PSOL e Rede também se juntaram em uma federação.
Critérios rígidos
A cláusula de barreira daquele ano
estabelecia que para seguir tendo acesso a tempo de TV e fundo partidário seria
necessário atender a dois critérios: eleger ao menos 11 deputados federais ou
ter 2% dos votos válidos para Câmara, sendo 1% dos votos em pelo menos nove
estados.
As três federações sobreviveram à prova de
fogo das eleições de 2022. Só que nada indica que o cenário para 2026 será
melhor para as legendas, já que todas elas, exceto o PT, elegeram menos
prefeitos este ano do que quatro anos atrás.
Para piorar, daqui a dois anos, o “sarrafo”
estabelecido pela cláusula de barreira vai subir mais. Os partidos precisarão
eleger 13 deputados federais ou ter 2,5% dos votos válidos para Câmara e 1,5%
em pelo menos nove estados.
Se as federações tiveram resultados
decepcionantes na disputa municipal, as fusões não foram uma estratégia muito
melhor. Entre as duas eleições municipais, oito partidos se transformaram em
quatro: DEM e PSL se fundiram criando o União Brasil, PTB e Patriotas fizeram o
mesmo criando o PRD, enquanto Solidariade (SD) absorveu o PROS, e o Podemos
(PODE) incorporou o PSC.
No primeiro turno deste ano, o União foi o
único deles a conseguir crescer em relação a 2020, ainda assim timidamente:
elegeu no primeiro turno 578 prefeituras, 3% a mais que as 553 que DEM e PSL
somados haviam conseguido quatro anos atrás. Todas as outras legendas perderam
mais de 40% do número de prefeituras que seus partidos originários haviam
eleito em 2020.
Apesar do amplo quadro de derrotas das
federações e alianças, a solução para sobreviverem será dobrar a aposta no
modelo. As conversas entre PSDB, SD e PDT começaram meses atrás, após os
trabalhistas desistirem de uma negociação que vinham fazendo com o PSB, mas foi
travada para as eleições.
Se o eventual acordo entre herdeiros de
Fernando Henrique Cardoso e Leonel Brizola é ideologicamente difícil de
compreender, o sentido prático é claro. Os trabalhistas passaram a cláusula em
2022 fazendo 17 deputados. Mas este ano também tiveram péssimo resultado,
elegendo 148 prefeitos, menos da metade dos 314 que haviam conseguido quatro
anos atrás, e ainda ficou de fora do segundo turno em Fortaleza, principal
capital que comandava.
Principal receio
A principal preocupação de dirigentes
partidários é em relação ao eventual domínio que uma sigla possa ter sobre a
outra dentro da federação. Foi o que ocorreu entre PT, PCdoB e PV. Apesar de a
aliança ter ajudado as legendas menores a ultrapassarem a cláusula de barreira
com facilidade em 2022, o resultado na disputa municipal deste ano foi
desastroso para elas.
Os comunistas saíram de 46 para 19
prefeituras, enquanto os verdes foram de 47 para 14. O PT, por sua vez, ganhou:
saiu de 183 para 248, o que deve levar os aliados a ficarem ainda mais reféns
das decisões do comando da legenda.
O Cidadania enfrentou o mesmo processo na
federação com o PSDB — saindo de 140 prefeitos eleitos em 2020 para 33 neste
ano — e rediscute internamente a manutenção da aliança após ficar escanteado
das decisões em cidades estratégicas:
— O estatuto das federações dá muito
desconforto para os partidos menores. No Rio tem uma questão prática: sempre
fomos aliados do (prefeito) Eduardo Paes (PSD), fui vice na chapa dele, e o
PSDB nos derrotou internamente e apoiou o Marcelo Queiroz — critica o
presidente do Cidadania, Comte Bittencourt, que defende uma rediscussão do
acordo.
Representantes do reduzido grupo de siglas
pequenas e ideológicas, PSOL e a Rede terão enorme desafio na tarefa de
sobreviver à cláusula de barreira de 2026. Os socialistas, que haviam eleito
cinco prefeitos em 2020, não conseguiram nenhuma prefeitura neste ano — embora
ainda lutem pelo comando da principal cidade do país, São Paulo, com Guilherme
Boulos.
Para piorar, a legenda teve uma queda de 7
para 4 vereadores no Rio, cidade que foi decisiva para o partido ultrapassar a
cláusula de barreira em 2022, quando elegeu 5 deputados federais no estado. A
Rede também saiu menor da eleição municipal, caindo de 5 para 4 prefeitos.
Presidente do PDT, o deputado André
Figueiredo admite que o possível acordo com o PSDB está mais baseado em
pragmatismo eleitoral do que em afinidade programática, mas diz que ainda é
cedo para sacramentá-lo. Ele defende que a conversa sobre as federações envolva
a disputa à presidência da Câmara, para tentar obter a anuência de um candidato
para a volta de coligações nas eleições proporcionais — instrumento que sempre
foi usado por partidos pequenos para sobreviver.
— Estamos discutindo as possibilidades.
Federações não estão descartadas, mas não é uma certeza. Passado o segundo
turno, vamos ter a maturação para as eleições da Câmara. Como as federações não
tiveram o êxito que se esperava delas, uma hipótese é discutir a volta de
coligações.
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