Folha de S. Paulo
Apesar de projeto tirânico seguir em frente,
mais consumidores e eleitores se acalmam
A confiança do consumidor americano deu um
salto grande, depois de cinco tombos. De abril para maio, passou de 85,7 para
98 pontos, segundo a pesquisa do Conference Board. Está entre os níveis mais
baixos desde 2022. As expectativas ainda estão em um nível que, se estima,
indicaria recessão adiante. Ainda assim, a alta é um espanto.
A redução do fragor da guerra
comercial e a recuperação do preço médio das ações deve tem ajudado.
Uns 60% das famílias têm investimento em ações.
E daí?
Uma esperança de que Donald Trump cause menos mal ao mundo e, talvez, à democracia se baseia no possível efeito político do dano que o Huno Laranja causar à economia. É a esperança da sabedoria convencional, que não tem se mostrado muito sábia nesta era de extremos bárbaros e redes insociáveis. A ideia, óbvia, é que o desprestígio de Trump o obrigasse a recuos políticos e, quem sabe, o derrotasse na eleição parlamentar de 2026.
O assunto nos interessa, se ainda é preciso
explicar. Trump é uma ameaça para o Brasil, por ser um exemplo e pelo risco de
intervenção direta. Entre meados de 2021 e meados de 2022, o governo Joe Biden mandou
recados para o governo de Jair
Bolsonaro e para representantes de elites políticas e econômicas: não
aceitaremos golpe. Sob Trump, já ameaçam Xandão
Moraes e cia.
O que se quer dizer com "recuo" de
Trump? As medidas econômicas podem vir a ser menos lunáticas —a finança e a
grande empresa contiveram o pior, no início de abril. Mas podem restar ataques
ao Judiciário, politização da máquina policial e investigativa, destruição do
serviço público profissional, controle de universidades e de instituições
estatais de pesquisa científica, desproteção maior de direitos de minorias etc.
Trump está em guerra com universidades, Harvard
em particular. Seu governo vai escarafunchar as opiniões de estrangeiros
que querem vistos para estudar ou pesquisar nos EUA. Manda imigrantes
para campos de concentração em Guantánamo ou El Salvador.
A ligeira recuperação dos índices de
confiança econômica e de popularidade de Trump deveria inquietar os
esperançosos: 46% do eleitorado o aprova. Quão grande precisa ser o problema
econômico para que menos de 46% aprovem o programa tirânico? O Partido
Democrata é um zumbi e não há movimento social organizado de protesto.
Sim, o governo tem apenas quatro meses. Não
há ainda medida do efeito real do aumento de tarifas em preços, emprego ou
investimento. Mesmo que o imposto
de importação geral extra ficasse nos 10% deste período de trégua, não
há ideia precisa ou consensual do seu efeito econômico, depreende-se da leitura
de pilhas de relatórios de bancões ou "think tanks" e de declarações
do Fed. De resto, se vier aumento de preço ou desabastecimento, o problema
apareceria apenas a partir de junho.
Não há medida ainda da redução da oferta de
trabalho de imigrantes nem gritaria relevante de empresas. O orçamento do
governo vai resultar em aumento do déficit já enorme, embora os efeitos
práticos disso na vida do cidadão possam não aparecer por muito tempo
(década?). De resto, o déficit aumentará também por causa de corte de imposto
que beneficiará muita gente. Haverá menos dinheiro para saúde, comida e
assistência social, mas os pobres são minoritários nos EUA.
Há aceitação da barbárie. Principalmente
falta oposição organizada e eficaz à barbárie –lá e aqui.
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