quarta-feira, 9 de julho de 2025

Ruim com ele, pior sem ele - Dora Kramer

Folha de S. Paulo

Campanha de difamação do Congresso, mesmo defeituoso, resulta em estímulo à antipolítica

Congresso não anda fazendo um bom serviço aos olhos da população, sabemos disso. Recente pesquisa do Datafolha aponta que quase 60% dos brasileiros sentem vergonha da conduta de deputados federais e senadores.

O mesmo estudo mostra que a Presidência da República e o Supremo Tribunal Federal estão em situação parecida. O STF é visto com desdouro por 58% dos pesquisados e 56% não veem motivo para se orgulhar do desempenho do presidente.

Estão, portanto, todos navegando em barco que requer uma correção de rumos. Evidência da qual decorre que talvez não seja aconselhável e muito menos adequada a ideia do governo de tentar recuperar a popularidade de Lula (PT) jogando a culpa dos males da nação nas costas de um Parlamento inimigo dos pobres.

A descredibilização do Legislativo nada tem de muito diferente daquilo que Bolsonaro (PL) fez e ainda faz em relação ao Judiciário. Não é uma atitude que se harmonize com a defesa da democracia incorporada pelo atual governo em contraposição às intimidações autoritárias do antecessor.

Um Congresso imperfeito, até mesmo bastante defeituoso, é muito melhor que Congresso nenhum. Se a representação popular falha em seus deveres de defesa do interesse público, não será uma campanha de difamação o melhor caminho para elevar o nível dos representantes.

Pode até momentaneamente dar uma desequilibrada de ânimos em favor do Executivo, mas há o dano colateral de se incentivar hostilidade à atividade política, a única maneira de se dirimir conflitos em ambiente de normalidade institucional.

Já vimos no que resulta a atmosfera da antipolítica: em maus governantes embrulhados na falsa embalagem de salvadores da pátria, cuja concepção é a de que só são verdadeiros democratas os áulicos, os que lhe prestam reverência.

O presidente Lula certamente não gostará de chegar a essa altura dos acontecimentos sendo confundido com um desses. E para que não seja, conveniente seria não rezar pela cartilha prepotente dos autocratas.

 

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