Além disso, a acusação é injusta. O Congresso que hoje os lulistas apontam como “inimigo do povo” aprovou, em pouco mais de dois anos e oito meses, medidas centrais para o governo: o novo arcabouço fiscal, a reforma tributária, a taxação dos fundos exclusivos, a política de valorização do salário mínimo, a reoneração parcial dos combustíveis, o novo PAC, a retomada do Minha Casa, Minha Vida, a política de igualdade salarial entre homens e mulheres, o novo Carf e o programa Pé de Meia.
Como observou Maria Hermínia Tavares, intelectual de uma esquerda que não se deixa contaminar pelo sectarismo, todas essas iniciativas têm “um pedigree progressista”.
Em questões essenciais para o próprio governo Lula, portanto, o Congresso agiu de forma colaborativa. É verdade que derrotou o Planalto em alguns temas — mas isso faz parte do jogo democrático. Não ignoro as mazelas do Parlamento, como o uso abusivo de instrumentos que travam a renovação política, entre eles o fundo eleitoral, as emendas parlamentares e o fundo partidário. Sim, a Câmara aprovou o absurdo da chamada PEC da Blindagem, mas o Senado, sensível à pressão da sociedade, exerceu seu papel de casa revisora e enterrou a proposta.
O Congresso tem uma maioria conservadora? Tem. E até certo ponto isso reflete o perfil médio da sociedade brasileira, que, em termos de valores, também é conservadora.
A única forma legítima de mudar essa correlação de forças é pelas urnas — conquistando a maioria pelo voto — ou pela construção de alianças sólidas, com coabitação e protagonismo real dos parceiros políticos. Em outras palavras, é preciso construir um governo verdadeiramente de Frente Democrática, e não uma coalizão sustentada apenas pelo loteamento de cargos.
Fora disso, recorrer à palavra de ordem “Congresso inimigo do povo” por conveniência eleitoral significa atacar um dos pilares da democracia: o Poder Legislativo. Não é por acaso que, em qualquer golpe de Estado, o Parlamento é sempre uma das primeiras vítimas dos tiranos e autocratas que chegam ao poder.
Não contem comigo para achincalhar o Congresso e jogar o eleitor contra o Parlamento.
É preciso, antes de tudo, identificar com clareza quem são os verdadeiros inimigos do povo. Entre eles estão os liberticidas, os demagogos, os tiranos, os populistas e os messiânicos que se apresentam como salvadores da pátria. O Congresso, com todos os seus defeitos, não faz parte desse time.
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