A redução dos juros anunciada ontem pelo Copom é histórica. Primeiro, por jogar a taxa básica vigente no país para o mais baixo patamar que se tem notícia. Segundo, por diminuir o rendimento pago aos pequenos poupadores que deixam seu dinheirinho nas cadernetas, algo nunca antes acontecido em mais de 150 anos de tradição.
O comitê do Banco Central tomou uma decisão acertada. Afinal, anormais eram os juros que vigoravam no país até agora. Ainda assim, o Brasil continua sendo onde se praticam algumas das mais altas taxas do planeta - atrás, agora, apenas de Rússia e China: 2,8% reais. É bom não perder de vista que, na média, o juro real no mundo é hoje negativo, mostra ranking da Cruzeiro do Sul Corretora.
Pode-se firmar com tranquilidade que a queda da Selic ora empreendida chega com anos de atraso: pelo menos desde 2008 já haviam surgido condições para uma redução significativa da taxa. Foi o governo petista, primeiro o de Lula, depois o de Dilma em sua fase inicial, que não quis. Com isso, alguns bilhões de reais extras foram torrados - R$ 236,7 bilhões apenas em 2011, recorde absoluto.
Em agosto passado, o BC iniciou a série de cortes prosseguida ontem. Foram sete quedas consecutivas, suficientes para levar a Selic a 8,5% ao ano. Para a economia como um todo, é muito bom. Mas não será tão agradável para o pequeno poupador: com a nova redução da taxa, passam a valer as novas regras de remuneração das cadernetas, agora cadente.
Como presente, a partir de agora pequenos poupadores que tenham feito depósitos após 4 de maio receberão menos pelo investimento: doravante, a centenária aplicação pagará 70% da taxa básica de juros mais a TR. Numa simulação feita por O Globo, quem tem R$ 10 mil guardados, perderá R$ 22 em um ano.
O governo diz que teve de mexer na poupança para poder reduzir os juros. É apenas parte da história. Não é por bom mocismo que a autoridade monetária vem diminuindo a Selic de maneira mais contundente; é por estrita necessidade. Trata-se de reação ao esfriamento geral da economia brasileira.
Nos últimos meses, ficou evidente que, possivelmente, neste ano o país não conseguirá sequer repetir o pibinho de 2011 - algo que os resultados do primeiro trimestre, a serem divulgados amanhã pelo IBGE, devem confirmar. O governo lança mão, assim, de todo um leque de medidas para reanimar a economia. Mas ela não reage. Por que será?
Primeiro, porque as ações governamentais são desconjuntadas, aleatórias, capengas. Segundo, porque o básico continua não sendo feito: alavancar os investimentos. Os números oficiais continuam a mostrar que os gastos do poder público com obras, novos maquinários e equipamentos mantêm-se cadentes.
Entre janeiro e abril, os investimentos caíram 3,5% na comparação com mesmo período de 2011. A maior parte despendida neste ano continua a ser de orçamentos passados, os chamados restos a pagar: do Orçamento Geral da União de 2012, somente R$ 1,51 bilhão foram aplicados, informa O Estado de S.Paulo.
Diante disso, não surpreende que o Brasil continue ladeira abaixo no quesito competitividade, como mostra nova rodada da pesquisa "Índice de Competitividade Mundial", feita pelo International Institute for Management Development. Entre 59 países analisados, estamos em 46° lugar - há dois anos, estávamos em 38°.
A redução dos juros é muito bem-vinda, ainda que esteja chegando atrasada. Tal demora é um dos fatores que levaram a economia brasileira à espiral descendente em que hoje se encontra. Os pequenos investidores em caderneta de poupança foram os primeiros a pagar a conta. Com a anemia do PIB, a fatura também vai chegar para o resto da sociedade.
Fonte: Instituto Teotônio Vilela. Carta de Formulação e Mobilização PolíticaQuinta-feira, 31 de maio de 2012Nº 478.
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