- O Estado de S. Paulo
Desde junho de 2013, quando se gritava contra tudo e contra todos, a novidade é que as ruas foram afunilando para um único foco: o “fora Dilma, fora PT”. Mas, para além do que é dito e escrito em faixas e cartazes, o recado das bandeiras verdes e amarelas é que, se não há governo, também não há oposição.
Esse buraco político, exposto a sol aberto pelas manifestações, cria uma situação esquizofrênica: o PMDB consegue ser as duas coisas ao mesmo tempo, governo e oposição, sofrendo de múltiplas personalidades. Tem a Vice-Presidência e uma penca de ministérios, mas é o partido que vai contra tudo o que o governo apresenta ao Congresso. Com uma das mãos, maneja a caneta do poder. Com a outra, apedreja o Planalto.
Tem-se assim que, enquanto o PT esfarela a olhos vistos e o PSDB não sabe bem o que fazer com essa batata quente do impeachment, o PMDB cresce, engorda, ocupa os espaços e pauta as manchetes, para o bem e para o mal.
Talvez mais para o mal: sua visão de sociedade é conservadora, retrógrada, e nunca fica exatamente claro se suas vitórias são por mera implicância com Dilma e por simples queda de braço com o PT, ou se há nelas uma busca real do que é melhor para o País. Você decide.
Até pela circunstância de que o PT está ladeira abaixo na avaliação popular e o PMDB está ladeira acima no poder, assistir ao “fora Dilma, fora PT”, de Norte a Sul, causa uma certa aflição. Se Dilma sai, quem é mesmo que assume? A maioria dos cidadãos e cidadãs não sabe, mas os líderes políticos têm a obrigação de saber. E eles estão perplexos e confusos.
Em vez de o PSDB liderar as manifestações, elas é que começam a comandar os passos do PSDB. É por causa delas e das pesquisas que os tucanos se uniram a PPS, DEM, PV e SD para passar a defender o impeachment, correndo atrás das ruas. Pelo Datafolha, 63% dos entrevistados são a favor do afastamento da presidente Dilma Rousseff. Mesmo sem querer, não há como a oposição fingir que não sabe, não viu, não ouviu.
Então, há ou não governo? O PT, partido da presidente, critica dia e noite o Planalto, enquanto o poder é dividido por três: Dilma tem 33%, se tanto; o vice Michel Temer tem 33%, no mínimo; e o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, tem 33%, com margem de erro oscilando para cima ou para baixo de acordo com os avanços do ajuste fiscal.
E há ou não oposição? A maioria da população fala sem pruridos em impeachment e renúncia, e milhões, ou milhares, vá lá, estão nas ruas gritando “fora Dilma”, mas o maior partido de oposição fica em casa e, assim, passa a ser um garantidor do mandato da presidente.
Ao que conste, governistas defendem o governo e oposicionistas fazem oposição a ele. Não tem sido assim, nem de um lado nem do outro, mas os movimentos unificados contra Dilma pressionam fortemente, e agora ao vivo, os líderes tucanos e seus aliados a se assumirem efetivamente como oposição. É daí que, apesar da cautela de Fernando Henrique Cardoso, o tom do PSDB mudou em relação a Dilma.
E, enquanto aguardam os pareceres encomendados a juristas sobre motivos legais para o impeachment, as oposições acabam de ganhar um reforço e tanto: o Tribunal de Contas da União diz que o uso de bancos públicos para dar jeitinho nas contas públicas caracteriza crime de responsabilidade. Por enquanto, o dedo acusatório é estendido para o ex-ministro da Fazenda Guido Mantega. Mas ele tinha chefe, ou seria “chefa”? Assim, essa posição do TCU só sacode ainda mais as coisas, numa hora de governo parado, PT de marcha-a-ré e oposição acelerando para se fundir ali adiante aos movimentos pró-impeachment.
Então, vamos deixar ainda mais claro: por vias transversas, a presença do PMDB ajuda Dilma a se equilibrar no poder. Trocar o PT pelo PMDB? Trocar Dilma pelo trio Temer, Eduardo Cunha e Renan Calheiros? Há muito o que refletir sobre isso.
Nenhum comentário:
Postar um comentário