sexta-feira, 17 de abril de 2015

Uso político agrava rombo de fundos de pensão

A conta do aparelhamento

• Relatório indica que Petros terá prejuízos como os de Funcef e Postalis, todos controlados por políticos

Alexandre Rodrigues – O Globo

Escândalos em série

Funcionários e aposentados da Petrobras correm o risco de ter de fazer contribuições extras para cobrir prejuízos do fundo de pensão da estatal, a Fundação Petros, a partir de 2017. É o que indica um relatório elaborado por dois conselheiros independentes da Petros com base nos números de 2014, que ainda não foram divulgados pela entidade. Um dos alvos das investigações da Operação Lava-Jato, a Petros fechou 2014 com o seu principal plano de previdência no vermelho pelo segundo ano consecutivo, com um déficit técnico de R$ 6,2 bilhões, diz o relatório.

O documento aponta que o Plano Petros do Sistema Petrobras (Petros BD) - que tem mais de R$ 70 bilhões em investimentos e envolve 28 mil contribuintes e mais de 50 mil aposentados da estatal - deverá repetir um resultado negativo este ano. Se isso acontecer, a fundação será obrigada a cobrar dos participantes uma contribuição extra para cobrir o rombo.

Vaccari intermediava negócios da Petros
A Petros entrou na mira da Lava-Jato depois que o advogado Carlos Alberto Pereira Costa, um dos auxiliares do doleiro Alberto Youssef, disse em delação premiada que o ex-tesoureiro do PT João Vaccari Neto, preso anteontem, intermediava negócios na Petros e em outros fundos de pensão. O negócio envolvendo Vaccari teria rendido, segundo o advogado, R$ 500 mil em propinas a ex-gerentes da Petros.

Os números negativos de 2014, que a Petros será obrigada a divulgar até julho, acirraram ainda mais as queixas de má gestão e aparelhamento político da Petros feitas pelos participantes.

Na Petros, os principais cargos são divididos entre petistas da Federação Única dos Trabalhadores (FUP) e do Sindicato dos Bancários de São Paulo, ambos ligados à Central Única dos Trabalhadores (CUT), braço sindical do PT. Em março, uma disputa interna por cargos terminou com a substituição de toda a equipe, com o apoio do novo presidente da Petrobras, Aldemir Bendine, mas os sucessores também pertencem aos dois grupos políticos. Os diretores do fundo são acusados de fazer investimentos controversos.

O relatório dos conselheiros admite que as condições adversas da economia contribuíram para os maus resultados de todos os fundos de pensão. Mas dizem que a ingerência política é um fator que agrava as perdas da Petros.

A contribuição extra já deverá ocorrer em 2016 com os participantes de outro plano da Petros, o Ultrafértil, dos funcionários de uma subsidiária de fertilizantes da Petrobras, que, segundo os conselheiros independentes, já "apresenta neste momento déficit da ordem de 20%".

Pela legislação do setor de previdência privada, quando um plano tem déficit acima de 10% das provisões matemáticas (o recurso necessário para honrar as pensões) ou tem perdas por três anos consecutivos, a administradora tem um ano para formular um plano para que os funcionários e a patrocinadora cubram as perdas.

O déficit técnico mostra o equilíbrio do plano ao estimar a quantidade de dinheiro que faltaria hoje para pagar as aposentadorias de todos os participantes até o fim da vida. Isso significa que o plano da Petros não tem um risco imediato de quebrar, mas precisa ser reequilibrado para garantir a sua sustentabilidade no longo prazo.

No Postalis, poder dividido entre PMDB e PT
Recentemente, o fundo de pensão dos Correios, o Postalis, iniciou a cobrança de contribuições extras de participantes e o desconto de pensionistas equivalente para cobrir um rombo de R$ 5,6 bilhões. A Funcef, dos funcionários da Caixa Econômica Federal, também terá de elaborar um plano similar depois que o resultado de 2014, divulgado há poucos dias, mostrou déficit de R$ 367 milhões num dos planos.

Os três fundos de pensão de estatais são administrados por indicados políticos, que, inclusive, têm passagem por mais de um deles, e são alvo de uma série de denúncias de participantes por má gestão e investimentos suspeitos feitas à Previc, o órgão regulador do setor.

No Postalis, o poder é dividido entre afilhados do PMDB e o mesmo grupo de petistas que domina a Petros. O atual presidente dos Correios, Wagner Pinheiro, foi presidente da Petros durante os oito anos do governo Lula. Ele indicou o atual presidente do Postalis, Antonio Carlos Conquista, que foi diretor do fundo de pensão dos funcionários da Petrobras na gestão de Pinheiro.

Desde o início do governo Lula, os principais fundos de pensão de estatais são dominados por esse grupo, ligado ao sindicato dos Bancários de São Paulo. O grupo, que era liderado pelo ex-ministro Luiz Gushiken (morto em 2013), tem entre seus integrantes Vaccari, Wagner Pinheiro, o ex-presidente da Previ Sérgio Rosa e o atual ministro das Comunicações, Ricardo Berzoini.

Os dados usados no relatório dos conselheiros da Petros Ronaldo Tedesco e Silvio Sinedino, eleitos pelos funcionários e aposentados, ainda não foram divulgados porque a fundação ainda precisa ainda submetê-los a uma auditoria independente e ao Conselho Deliberativo da entidade.

No entanto, os conselheiros decidiram divulgar os dados preliminares para tentar acalmar os funcionários da Petrobras, que estão preocupados com suas aposentadorias diante do envolvimento da Petros nas investigações da Operação Lava-Jato. A troca recente da diretoria da Petros e a comparação com o Postalis, cuja situação é muito mais grave por ter patrimônio bem menor que o da Petros, fez o alarmismo tomar os corredores da estatal.

Venda de títulos resultou em prejuízo
Carlos Alberto Costa, o advogado ligado a Youssef disse à Justiça que João Vaccari Neto frequentou, entre 2005 e 2006, a empresa CSA Project Finance, de um sócio do doleiro. Ali, ele teria intermediado a venda de títulos de R$ 13 milhões de uma indústria de Barra Mansa (RJ) para a Petros, que mais tarde resultou em prejuízos para a fundação.

Um deles, segundo Costa, seria Humberto Grault Pires de Lima, que foi gerente de investimentos da Petros e atualmente é gerente de participações da Funcef. Vaccari e Lima negam as acusações. Em janeiro, a PF abriu inquérito no âmbito da Lava-Jato para apurar a denúncia.

É justamente nesse tipo de operação com títulos de crédito privado que a Petros tem acumulado investimentos controversos. O relatório dos conselheiros aponta que, de um total de R$ 801,9 milhões da Petros em investimentos dessa carteira de crédito privado, R$ 730,6 milhões estavam provisionados com alto risco de perdas nos números da fundação de dezembro de 2014, que ainda não foram divulgados.

Uma auditoria independente ainda em curso contratada pelos conselheiros apontou vários problemas nesses investimentos, como a ausência de documentos e garantias insuficientes, além da falta de mecanismos de controle internos. Um dos casos mais controversos é o da Galileo Educacional, a mantenedora das universidades Gama Filho e UniverCidade, que vendeu R$ 700 milhões em debêntures para Petros e Postalis. Afogada em dívidas e má gestão, a empresa perdeu o credenciamento do MEC e fechou as portas mergulhada em dívidas.

A Petros ainda amarga resultados ruins com investimentos em empresas de interesse do governo, como a Sete Brasil, construtora de sondas para a Petrobras envolvida na Lava-Jato, e a Lupatech, do setor de equipamentos para a indústria de petróleo, que entrou em recuperação extrajudicial por causa de dificuldades de financiamento.

Os conselheiros dizem ainda que a Petrobras tem dívida com a Petros que não é cobrada por seus executivos. Também cobram a mudança do estatuto da Petros para permitir eleições entre os funcionários para cargos da diretoria executiva.

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