- O Estado de S. Paulo
Uma coisa é a greve, outra, a adesão a ela. A greve ocorreu e foi um sucesso; parou várias cidades. Em São Paulo, decretou feriado. Porém, a adesão a ela não saberemos qual foi. Sua base foi o transporte: como separar os que eram contra as reformas e, portanto, aderiram, daqueles que não ficaram em casa apenas porque não tinham transporte? As manifestações na Av. Paulista permitem aferir a adesão pelo número de quarteirões ocupados; são mais eficientes para medir reações. Então, nos resta, analisar a greve pela greve.
Pelo resultado, podemos dizer que as corporações, seja de metroviários, motoristas de ônibus ou professores, deram um sinal de força. Professores pararam não só escolas públicas, mas também escolas particulares. As cidades ficaram vazias e explicitaram o mal-estar: nada anda muito bem no País. Isso tem impacto sobre o Congresso.
Deputados que já criavam problemas para o governo, com medo de votar, percebem que as corporações estão organizadas. Na base, elas podem pressioná-lo ainda mais: colocar a foto, o nome e o voto dele em cartazes. Há, agora, um argumento a mais: “O povo é contra as reformas”, vai dizer. No mínimo, a negociação ficará mais cara.
Os defensores das reformas talvez não vejam assim; acreditam que oferecendo cargos quebra-se qualquer resistência. Mas não adiantam cargos sem orçamento, hoje escasso. Também já não há tantos cargos assim; matéria-prima que escasseia. O que interessa para o parlamentar é se manter no poder. A variável chave chama-se “longevidade”; “reeleição”. Muita gente considera que Temer tem poder para fazer as reformas porque não é candidato, mas esquece que 513 deputados na Câmara e dois terços do Senado são candidatos. Com um detalhe: a elite do Congresso é ameaçada pela Lava Jato. Sem o foro privilegiado do mandato, o risco da “cana” aumenta. Para esse sujeito, imperativo é o mandato. Esse parlamentar não arriscará ter o seu rosto num cartaz acusado de ter acabado com a perspectiva de aposentadoria do País.
O que temos visto até agora em relação às reformas tem uma analogia com o futebol. Torcedor sempre acha que vai dar, mesmo que esteja perdendo, acredita que o time vai virar. Mas é preciso olhar com frieza. A reforma trabalhista até é palatável. Não afeta todos os setores: a burocracia estatal fica ilesa. Passa mais fácil. Já a reforma da Previdência afeta a todos. Sofre mais resistência. Necessária, vital, inevitável... Não interessa; as pessoas não sabem. O governo olhou apenas para o Congresso, sem enxergar a sociedade: perdeu a guerra da comunicação. Pode, agora, perder a mão no Congresso. Errou também ao criar expectativas irrealistas. para o mercado. Vendeu-se otimismo; mudar de opinião já não é tão simples, pode significar milhões.
O jogo, por certo, ainda não acabou. O governo pode desidratar ainda um pouco mais o seu projeto e a reforma possível passará: o mínimo insuficiente.
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Cientista político e professor do Insper
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