Depois de uma baixa acumulada de seis pontos percentuais nos juros básicos da economia desde fins de 2016, o Banco Central avisou na semana passada que, daqui por diante, tenderá a ir mais devagar - e já começa a preparar o mercado financeiro para um provável fim do ciclo de distensão monetária num futuro não muito distante.
Pode-se questionar se, em meio à recessão mais profunda da história e uma inflação tão baixa que ameaça furar o piso da meta, o Comitê de Política Monetária (Copom) não deveria ter sido mais agressivo em trazer a meta da taxa Selic para os atuais 8,25% ao ano. No entanto, parece razoável que, ao conduzir os juros aos menores patamares da história, o BC redobre a cautela para evitar os erros do passado que obrigaram a reapertar a política monetária logo em seguida.
O comunicado divulgado pelo Copom logo após a reunião da semana passada, que baixou os juros em um ponto percentual, telegrafou que o corte da Selic do encontro de outubro será de 0,75 ponto percentual. Também indicou que, nessa reta final do ciclo de distensão monetária, a queda da taxa básica será em ritmo gradualmente menor. A mensagem mais importante do documento, porém, é o aviso de que a política monetária já entra em terreno estimulativo.
Isso significa que o Banco Central está fixando a taxa de juros em percentual baixo o suficiente para mover a economia em direção ao seu potencial de crescimento sustentado e para fazer a inflação, hoje muito baixa, caminhar para o centro da meta.
O risco nessa travessia é justamente o de baixar os juros demais, levando a economia a crescer muito acima da sua capacidade e pressionando a inflação. Foi o que ocorreu em 2012, no governo Dilma Rousseff, quando o BC exagerou na dose, levando a Selic à mínima histórica, para meses depois ser obrigado a subir em reação à aceleração da inflação.
O presidente do Banco Central, Ilan Goldfajn, tem repetido que, se os juros caírem para cerca de 7,25% ao ano nos próximos meses, como espera o mercado, a taxa real de juros chegará a algo entre 3% e 3,5% ao ano. É um percentual baixo para o histórico brasileiro, como ele próprio tem ressaltado. Na década de 1990, os juros reais chegaram a 20% ao ano; na última década, caiu para 10% ao ano; e, em anos mais recentes, para 5% ao ano. Mas nesse último período está incluído o governo Dilma, com uma taxa insustentável de 2%.
É bem provável que, ao contrário de 2012, hoje as condições econômicas de fato recomendem juros tão baixos. Depois de uma queda de 7% no Produto Interno Bruto (PIB), a economia tem fatores de produção ociosos - capacidade não utilizada na indústria e alto desemprego - para atender à demanda que será gerada pelos estímulos monetários. A inflação acumulada em 12 meses até agosto, de 2,46%, é a menor em 18 anos e está abaixo do piso admitido pelo regime de metas, de 3%, que deve ser cumprido no ano-calendário.
Mas, por outro lado, a economia já dá sinais mais firmes de recuperação. A leitura do próprio Banco Central sobre a atividade econômica apresenta uma evolução no comunicado do Copom. Até então, o diagnóstico era que estava havendo uma estabilização, o que significava basicamente que a economia deixou de cair; agora, a autoridade monetária já menciona "sinais compatíveis com a recuperação gradual da economia brasileira", o que significa que o país provavelmente voltou a crescer.
A reação ainda é bem tímida, mas ela ocorre antes de que os cortes de juros - que se tornaram mais alentados no início do ano - se transmitissem para a economia. Os especialistas calculam que esse processo leve de seis a nove meses. À medida que os juros chegam à mínima histórica, é natural o BC ir com mais cautela enquanto observa a reação da atividade econômica e inflação. Sempre será possível cortar mais os juros, caso se mostre necessário. Corrigir um eventual excesso de estímulo, porém, poderá abortar a recuperação.
Sem diminuir a importância do ajuste fino da política monetária, agora que os juros chegam à mínima histórica o tema essencial deve ser como assegurar que esse nível se torne permanente. O Banco Central tem chamado a atenção para a necessidade de o Congresso aprovar reformas para derrubar a taxa de juro estrutural. A mais importante delas é a fiscal. Uma falta de consenso em torno de uma reforma abrangente da Previdência, por exemplo, certamente fará com que os juros voltem a subir a percentuais mais altos.
Nenhum comentário:
Postar um comentário