- Valor Econômico
Proposta é mandato fixo e alternado para a diretoria
Alvo de uma campanha tresloucada na véspera das eleições de 2014, a proposta de autonomia do Banco Central voltou a constar dos programas de governo de dois dos candidatos à Presidência da República mais competitivos: Jair Bolsonaro (PSL) e Geraldo Alckmin (PSDB). Ambos, inclusive, externaram a intenção de manter no cargo o atual presidente do BC, Ilan Goldfajn, sejam eleitos.
A equipe de Bolsonaro adiantou, em comunicado, que ele é favorável à independência do BC. Com mandatos atrelados a metas e métricas definidas pelo Legislativo, a diretoria do BC teria "autonomia para garantir à sociedade que nunca mais presidentes populistas ou demagogos colocarão a estabilidade do país em risco para perseguir um resultado político de curto prazo", diz o texto publicado no fim de 2017 no blog do candidato.
Alckmin disse que o assunto não consta das quatro grandes reformas constitucionais - política, tributária, previdenciária e do Estado - que ele encaminhará ao Congresso nos primeiros dias de governo, se for eleito. Aparentemente, portanto, a autonomia do BC não estaria entre as prioridades do candidato do PSDB, que concentraria o capital político acumulado na eventual vitória na aprovação das reformas, que exigem quorum qualificado.
O economista Persio Arida, coordenador do programa de governo de Alckmin, esclareceu, porém, que a intenção do candidato é enviar um projeto de lei complementar com a proposta de mandato fixo e alternado para a diretoria do BC.
Arida considera que a autonomia, garantida pelo mandato fixo e alternado da diretoria, é um importante passo não só para manter as expectativas de inflação na meta, com juros menores, mas pelo impacto fiscal da medida. Com juros mais baixos, reduz-se o custo de financiamento da dívida mobiliária.
Ele definiu o desenho que o candidato do PSDB pretende dar ao BC, caso seja eleito. De início duas mudanças estão descartadas. Não seguirá, por exemplo, as experiências do Chile e da Suiça - que transferiram para uma agência toda a função regulatória do BC, deixando a instituição encarregada somente da política monetária. Arida prefere manter o Banco Central tal como é hoje, cuidando da estabilidade da moeda e da saúde do sistema financeiro.
Ele é contra, também, a atribuição de objetivo "dual" para a autoridade monetária, que significaria ter a meta de inflação e de emprego. Para o economista o BC deve perseguir uma só meta - a de inflação - até porque o nível de atividade e do emprego constam do modelo que orientará as deliberações do Comitê de Política Monetária (Copom) sobre a Selic.
Dar dois objetivos para o Banco Central perseguir, nos moldes do Fed, traria o risco de grandes confusões no país, como a judicialização da política monetária caso o BC cumprisse a meta de inflação em prejuízo da meta de emprego.
Mandato fixo e alternado, com cláusulas bem definidas para eventual remoção, protege a diretoria do BC de demissões arbitrárias e termina, segundo Arida, com a ideia de que cada novo presidente da República poderá trocar todo o comando da autoridade monetária durante o seu mandato.
Ao desistir da aprovação da reforma da Previdência no Congresso, no início do ano, o governo de Michel Temer apresentou uma agenda com 15 medidas que perseguiria neste fim de mandato, dentre elas a autonomia do Banco Central - medida que resguardaria o BC de eventuais interferências políticas que, em geral, optam por ganhos de curto prazo em detrimento do controle da inflação.
Há trabalhos acadêmicos que dividem o grau de autonomia de um banco central em duas dimensões: a autonomia política, na determinação dos objetivos, e a autonomia econômica, que diz respeito aos instrumentos usados para alcançar os objetivos. Poucos bancos centrais têm liberdade para definir a meta de inflação e para manejar os instrumentos que dispõem como melhor entender. Um deles é o Federal Reserve, o BC americano.
Já o caso brasileiro está entre os mais complexos, pois não possui autonomia formal, garantida em lei, apesar de operar com autonomia concedida pelo presidente da República. A Lei 4.594, de 1964, que criou o BC, atribui a ele múltiplas competências e nenhum objetivo claramente definidos em documento legal. A lei diz que "compete ao Banco Central da República do Brasil cumprir e fazer cumprir as disposições que lhe são atribuídas pela legislação em vigor e as normas expedidas pelo Conselho Monetário Nacional". Não faz menção, porém, ao que deveria ser o objetivo primordial da autoridade monetária, que é o de preservar o poder de compra da moeda.
Parecem distantes os dias em que, durante a campanha eleitoral de 2014, as televisões do país foram invadidas por propaganda da então candidata à reeleição, Dilma Rousseff, que demonizava o papel do Banco Central para destroçar a candidatura de Marina Silva, defensora da autonomia. Dizia-se, alí, que o BC era uma instituição a serviço dos banqueiros ávidos por tirar o prato de comida da mesa dos pobres. Prestou-se um desserviço à política desinflacionária, cujo custo de reversão foi pago por toda a sociedade brasileira.
É possível, e os que advogam a autonomia do BC acreditam, que esse assunto tenha amadurecido e que, hoje, não mais se repetiria aquela peça de insensatez.
Mas campanha é campanha e, em meio à disputa, pode-se cair em um "vale tudo" para derrotar o adversário.
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Os ministros do Supremo Tribunal Federal, que hoje ganham salário de R$ 33,7 mil, estão entre o 1% mais rico da população brasileira, segundo dados da Pnad. Eles pretendem receber um reajuste de 16,38% no ano que vem, conforme decisão do STF na quarta-feira, elevando o salário para R$ 39,3 mil. Acentua-se a distância com os demais brasileiros, que têm renda média de R$ 2,1 mil, valor que sobe para R$ 4.663, considerando os de nível universitário.
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