- Correio Braziliense
O mecanismo que vincula os aumentos de servidores ao dos ministros do STF serviu para alavancar os salários da alta burocracia de todos os poderes, mas virou uma tremenda armadilha fiscal
O impacto do aumento dos salários dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) nas contas públicas, segundo cálculos dos especialistas em orçamento das assessorias técnicas do Congresso, será de R$ 4 bilhões. A decisão de passar seus vencimentos dos atuais R$ 33.763,00 para R$ 39.293,32, um reajuste de 16,38%, muito acima da inflação, não seria um descalabro face a relevância dos cargos que ocupam, não fosse o fato de que tem um efeito cascata no Executivo, no Legislativo, no Ministério Público e, também, nos estados e Distrito Federal.
A vinculação dos aumentos do Judiciário, do Legislativo e do Executivo ao salário dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), que estabelece o teto de remuneração dos servidores, é uma armadilha fiscal criada pelos lobbies das corporações do setor público e pela esperteza dos políticos. Ministros do Supremo vivem numa redoma, na qual não dependem de mais ninguém, a não ser deles próprios e da Constituição. Não têm as mesmas limitações dos políticos com mandato eletivo no Executivo e no Legislativo na hora de estabelecer seus vencimentos, pois não precisam disputar eleições.
Dessa forma, o mecanismo que vincula os demais aumentos ao dos ministros do STF serviu para alavancar os salários da alta burocracia de todos os poderes, mas virou uma tremenda armadilha fiscal, com grande impacto nas contas públicas. O efeito do aumento na esfera federal é o seguinte: Judiciário, R$ 717 milhões; Ministério Público, R$ 258 milhões; Executivo e Legislativo federais e Defensoria Pública da União, R$ 400 milhões. Nos estados, o impacto nas folhas de pagamento dos servidores será de R$ 2,6 bilhões. Ou seja, de uma hora para outra, o Supremo aprovou mais um novo rombo nas contas públicas, cujo deficit fiscal previsto para o próximo ano é de R$ 139 bilhões.
O ministro Ricardo Lewandowski, do Supremo Tribunal Federal (STF), liderou a discussão sobre o aumento, na qual a presidente do Supremo, ministra Cármem Lúcia, que era contra, foi derrotada por 7 a 4. Lewandowski argumenta que a atuação do Judiciário tem proporcionado o resgate de dinheiro aos cofres públicos: “Vocês repararam que ontem os juízes de Curitiba devolveram R$ 1 bilhão de dinheiro desviado da Petrobras?”, disse. Entretanto, é um dos ministros que mais atuam no sentido de circunscrever as investigações.
Num país com 13 milhões de desempregados e uma massa enorme de pessoas subempregadas, muitas vezes ganhando abaixo do salário-mínimo, a decisão teve repercussão muito negativa, a começar pelas reações da própria presidente do Supremo: “Ontem perdi. Provavelmente hoje perco de novo. Mas eu não queria estar do lado dos vencedores. O que venceram e como venceram não era o que eu queria mesmo e continuo não convencida de que era o melhor para o Brasil”, disse Cármen Lúcia.
Colateral
A Secretaria Geral do STF calcula em R$ 2,87 milhões o impacto da despesa na folha de pagamento do tribunal. Parte dos recursos, cerca de R$ 50 milhões, deve sair do orçamento da TV Justiça. O aumento ainda precisa ser aprovado pelo Congresso Nacional, que já barrou um aumento anterior do Judiciário. Dessa vez, o que se discute no Senado é a desvinculação dos aumentos entre os Poderes, o que pode ser uma boa medida em tempos de novo governo e ajuste fiscal, mas isso dependerá do resultado das eleições.
A decisão tem efeitos políticos colaterais. O Supremo está dividido e se desgasta em razão de divergências entre ministros e decisões contraditórias, principalmente em relação à Operação Lava-Jato. A prisão do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, condenado em segunda instância, contrasta fortemente com a libertação de outros personagens envolvidos em escândalos, mas que estavam em prisão preventiva, porque ainda não foram condenados em segunda instância. O cidadão comum simplesmente não entende a diferença de tratamento, porque não conhece a jurisprudência. Enquanto os ministros Gilmar Mendes e Dias Toffoli, por exemplo, arquivam processos e soltam presos envolvidos em escândalos, Lula promove uma guerrilha jurídica contra a Operação Lava-Jato.
Lula está preso desde abril, em Curitiba, depois de ter sido condenado pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) a 12 anos e 1 mês de prisão por corrupção passiva e lavagem de dinheiro no caso do tríplex de Guarujá. Ontem, por exemplo, a Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) negou recurso da defesa do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) para suspender os efeitos da condenação dele nesse caso. Em Porto Alegre, o Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) negou o pedido do Partido dos Trabalhadores para que Luiz Inácio Lula da Silva participasse do debate de ontem da TV Bandeirantes com candidatos à Presidência da República. Advogados do PT entraram com mandado de segurança após um pedido anterior não ter sido analisado. O ex-presidente foi anunciado candidato do PT no domingo.
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