Não foi um bom mês em mercados financeiros relevantes do mundo, mas aqui foi pior
A Bolsa de São Paulo subia pouco antes de o governo anunciar seu projeto ciclístico, na segunda-feira. Desde que se soube da pedalada Bolsonaro-Guedes, a virada do Ibovespa foi de mais 5%. Desde o pico recente de 29 de julho, o principal índice de ações da bolsa perdeu mais de 11%.
E
daí? O preço das ações depende também das taxas de juros, em alta desde inícios
de setembro e que deram um salto desde o anúncio da pedalada do Renda Cidadã (a
moratória dos precatórios e a mão grande no dinheiro do Fundeb). Deram um salto
e continuam penduradas no galho. Até as taxas de prazos mais curtos, de um ano,
ficaram salgadas.
Em
geral, o preço das ações em baixa é um desestímulo para empresas que pensam em
vender mais ações ou abrir capital (grosso modo, ninguém quer
partilhar sua expectativa de lucros a preço de banana). É a manifestação de um
sintoma mais extenso de cautela ou de retranca mesmo. Capital mais caro, é
óbvio, desestimula investimentos, expansão dos negócios.
Claro
que esses indicadores podem mudar em minutos, para baixo ou para cima. Um dia
ou uma semana de remelexos ou mesmo de paniquitos do mercado financeiro não
dizem grande coisa. No entanto, uns dois ou três meses de aperto das condições
financeiras bastam para começar a engrossar o caldo da economia. “Condições
financeiras”: juros, Bolsa, dólar, risco país etc.
Faz
um mês que a situação anda malparada. Não foi um bom mês em mercados
financeiros relevantes do mundo, mas aqui foi pior. Quanto mais durar o passeio
ciclístico da dívida proposto pelo governismo, mais o caldo engrossa. Como se
não bastasse a pedalada, o governo também criou encrenca na reforma tributária.
Talvez se desperdice o resto escasso de tempo parlamentar deste ano, que será
encurtado em um mês pela eleição, em novembro.
Até
a noite desta terça-feira, o governismo (Bolsonaro, Guedes e centrão) estava
decidido a tocar a ideia de financiar o Renda Cidadã com a moratória de
precatórios, embora já tentassem inventar algum outro malabarismo, o que põe
mais lenha no fogão. Dada a rejeição da CPMF de Paulo Guedes, Bolsonaro
resolveu melar o jogo da reforma tributária até praticamente dezembro (embora,
decidido e organizado como seja, possa mudar de ideia amanhã).
A
pedalada e a cera na reforma tributária criaram e criarão mais conflitos na
Câmara, que é a única entidade que toca de fato as “reformas”.
É
evidente, portanto, o risco de que tenhamos mais dois meses de tensão ou
paralisia decisória, se não coisa pior. No que diz respeito às “condições
financeiras” tanto faz se a gente é adepta ou adversária das “reformas”. Esse
rebuliço ignaro do governo sempre lasca algum crescimento econômico.
As
reviravoltas políticas e inépcias do governo em geral balançam excessivamente o
barco. O preço do dólar depende um bom tanto de jogatina ou de especulações,
mas a tensão das peripécias birutas contribui para a volatilidade. O dólar foi
a quase R$ 5,90 em maio, baixou a R$ 4,82 no início de junho e está de volta à
casa dos R$ 5,60, variações próximas da ordem de 20% em semanas. Isso não
presta.
Taxas de juros de longo prazo mais altas prejudicam o financiamento da dívida do governo, que tem de pagar mais o encurtar o prazo, o que está acontecendo de modo preocupante. Pode até parecer que não esteja acontecendo algo de especialmente grave, para as pessoas normais, que não se ocupam disso no dia a dia. Mas esses problemas são veneno em dose pequena e constante: em um certo momento, iremos para o hospital.
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