A
ansiedade do presidente com o iminente fim do auxílio sem que, até aqui, se
tenha construído uma proposta sustentável para perenizar uma transferência
maior de renda aos mais necessitados e carimbá-la com uma marca bolsonarista
fica evidente em apelos como o desta terça-feira.
Como
sempre faz, graças ao caráter bastante raso de suas reflexões, Bolsonaro deixou
claro o que o aflige ao dizer que mercado, empresários, imprensa e Congresso
não deveriam criticar cada proposta que o governo tenta para solucionar o
problema da renda. Sabe que está num beco sem saída em que, se ficar, a queda
da renda pega; se correr, o bicho do teto de gastos come.
Com
pressa, Bolsonaro está visivelmente espremendo Paulo
Guedes. O ministro, que se notabilizou por fazer previsões de datas para
feitos grandiosos de sua pasta que nunca se realizam, sai esboçando ideias que
não se concatenam umas com as outras e não param de pé.
Faltam
apenas dois dias para um desses prazos furados: em 90 dias, disse Guedes em 5
de julho, o governo faria privatizações de quatro grandes empresas. Quais? Nada
chegou nem a tentar sair do papel. O responsável pela área, Salim Mattar, deu linha na pipa porque
não tinha o que fazer.
Agora,
Guedes, que tinha sido proibido por Bolsonaro de falar em Renda Brasil, foi instado a voltar a
falar no assunto. Deram um outro nome para não ficar tão feio: Renda Cidadã. A
cidadania, vejam só, é pedalar com o dinheiro da educação básica na esperança de
furar o teto sem ninguém ver e postergar o pagamento de dívidas judiciais (o
nome por trás da difícil palavra precatório) para deixar a bola de neve para as
futuras gestões.
Por
uma aula de spinning muito menos animada que esta Dilma Rousseff desceu a rampa do
Planalto quase dois anos antes da hora.
E
a reforma tributária, que poderia desonerar salários, racionalizar tributos e,
até, criar novas receitas para a tal Renda Cidadã caso o ministro conseguisse
explicar a volta de uma versão digital da CPMF? Até agora ainda está no mesmo
escaninho das privatizações em 90 dias: o das ideias em busca de um projeto.
E
o tique-taque está correndo, como Bolsonaro bem sabe.
O
presidente sentiu o gosto do aumento da popularidade em plena condução
tenebrosa da pandemia graças, em grande parte, ao auxílio emergencial.
Prorrogado até o fim do ano, em valores reduzidos, o benefício deixará órfãos
65 milhões de brasileiros, nas contas da propaganda que o próprio Bolsonaro fez
na ONU.
Não
adianta cobrar gratidão retroativa de quem vai ficar “sem ter o que comer”,
como o presidente disse no seu show de sinceridade nesta terça.
Mas
resta pouco tempo para se construir uma proposta séria de transferência de
renda sustentável. Para isso, o governo precisa assumir uma negociação realista
sobre o teto de gastos, que o Congresso está disposto a fazer, anunciar cortes
em outras áreas menos importantes (que tal o aumento dos investimentos na
Defesa, para começar?) e, se for o caso, dizer que vai criar um tributo e
trabalhar sério, sem esse jogo de vaivém, para viabilizá-lo.
Para tudo isso não adianta nada mimimi de um presidente acuado pelo tique-taque Também não se trata de fazer como no “meio militar”. E, sim, de agir como um presidente da República: liderando sua equipe e negociando com o Congresso igualmente eleito.
Nenhum comentário:
Postar um comentário