Valor Econômico
Sinais em discursos e reuniões de Lula
demandam atenção
No Planalto Central, a primavera chega para
aliviar o irrespirável ar que caracteriza o fim do período de seca. A estiagem
é brutal. Mas, acostuma-se a conviver com os baixíssimos índices de umidade. Há
até quem agradeça a previsibilidade que a seca proporciona e dela se aproveite
para programar os fins de semana, feriados, viagens e eventos ao ar livre, algo
que fica mais difícil de se fazer com o início da estação chuvosa.
É neste momento, também, que crescem as ocorrências de trombas d’água nos rios e cachoeiras da região, arrebatador fenômeno natural que passou a ser usado por petistas para descrever o retorno do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva à arena eleitoral.
Trombas d’água, como também são conhecidas as chamadas “cabeças d’água” em algumas regiões, exigem atenção. Elas costumam pegar de surpresa os mais incautos que, seguros de si, menosprezam os alertas do ambiente que os cerca.
Normalmente, esses sinais são tênues mesmo.
Quase imperceptíveis: mais espuma ou sujeira na água; um ou outro galho
flutuando como se não tivesse sido arrancado há instantes, rio acima, por uma
força abissal - e inesperada - da natureza.
Pode-se estar numa cachoeira com tempo bom
e céu claro. Nenhum indício de que neste exato instante esteja ocorrendo, na
cabeceira do rio, uma forte chuva. De repente, um aumento avassalador no volume
das águas ocorre e surpreende os mais desatentos. Pessoas, animais e vegetação
são arrastados. Mortes não são raras. Ficam os relatos dos que sobreviveram e
as lições para aqueles que insistirão em frequentar cachoeiras e rios durante a
época de chuvas.
Entre petistas, a comparação é feita com o
objetivo de dimensionar o que Lula representa para o jogo eleitoral de 2022.
Inesperada, a candidatura presidencial não
era programada nem pelos militantes mais esperançosos. E só foi viabilizada
depois da reviravolta judicial que declarou o então juiz Sergio Moro parcial ao
condenar o ex-presidente.
O partido ainda precisará, porém, brigar
para consolidar a versão segundo a qual Lula é inocente e foi vítima de
perseguição política. “Vão falar que não é verdade que o Lula está inocentado.
Mas, também não é verdade que tem processo (concluído). Tem que começar tudo de
novo para ele ser condenado. Então, ele é um cidadão inocente”, argumenta um
dirigente da sigla.
De quebra, o PT comemora o fato de a Câmara
ter aprovado uma quarentena eleitoral para juízes, policiais, promotores e
militares a partir de 2026. Como o projeto não precisará ser votado
imediatamente, dá-se como certo que o Senado não irá se opor à medida mais à
frente. E, de qualquer forma, mais importa o fato político.
Nas projeções de cenários feitas pela
legenda, também não estava contemplada a possibilidade de o presidente Jair
Bolsonaro estar tão fragilizado no período pré-eleitoral. Isso porque na
história recente Fernando Henrique Cardoso, Lula e Dilma Rousseff souberam
aproveitar o cargo de presidente da República para permanecer no poder por mais
quatro anos.
No caso de Bolsonaro, contudo, seu
desempenho nas pesquisas de intenção de voto mostraria (na ótica petista) a
mobilização da direita para fazer a disputa ideológica em torno de temas que
têm grande incidência nesta parcela do eleitorado, mas não necessariamente
proporcionar uma nova arrancada capaz de assegurar a reeleição do chefe do
Executivo. A conjuntura econômica tende a criar-lhe ainda mais dificuldades.
A imagem da tromba d’água é utilizada no PT
para também dar uma dimensão da força que esperam de Lula em outubro do ano que
vem. Não se vislumbra a possibilidade de ele ficar de fora do segundo turno, e
se trabalha com o cenário de que o ex-presidente naturalmente aglutinará as
forças políticas, principalmente de esquerda, que querem tirar Bolsonaro do
comando do país. Ou, em outras palavras, deve sair arrastando o que e quem
estiver pela frente.
Até lá, caberá a empresários, investidores
e autoridades estrangeiras observarem os sinais presentes no ambiente. E as
viagens de Lula pelo país, seus discursos e as reuniões reservadas das quais
participa estarão repletos deles.
Esta semana, por exemplo, Lula passa alguns
dias em Brasília, mas em outros momentos já foi possível captar que um eventual
governo Lula fará de tudo para alterar o arcabouço fiscal, algo que coloque um
fim no teto de gastos e viabilize uma elevação dos investimentos públicos. O PT
conta com a ampliação dos investimentos no Orçamento da União como forma de
induzir a retomada do crescimento econômico.
Em outros casos, como quando Lula advoga a
necessidade de o Estado incentivar a indústria ou se compromete a atacar a
miséria e o desemprego, ainda não se tem clareza sobre o que faria de fato.
Ainda assim, todas as oportunidades serão usadas para que se afaste o receio,
existente na iniciativa privada e entre dirigentes do Centrão, de que o Lula de
2022 estará distante do “Lulinha paz e amor” da campanha de 2002. Teme-se que o
ex-presidente mantenha um discurso mais raivoso, cheio de mágoas e
demonstrações de que buscará vingar-se de seus algozes.
“O Lula é uma das pessoas mais pragmáticas
deste país”, pondera um interlocutor do ex-presidente, assegurando que o
petista não irá para o embate com o mercado nem levará adiante a ideia de
regular a imprensa. A temporada de trombas d’água está apenas começando.
Presente para Ciro
Veio antecipado o presente das alas mais
radicais da esquerda para Ciro Gomes, que aniversaria no início do mês que vem.
O pré-candidato a presidente do PDT foi hostilizado durante manifestação no fim
de semana e, com a bandeira do Brasil em mãos, revidou chamando seus críticos
de “fascistas de vermelho”. Matéria-prima preciosa para quem pretende se
apresentar a uma parcela mais ampla do eleitorado como aquele que caminhará na
coluna do meio, entre Lula e Bolsonaro, opondo-se aos dois.
Fernando Exman
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