Folha de S. Paulo
Ministro protege patrimônio no exterior
enquanto pede sacrifícios no Brasil
Ainda no primeiro ano de governo, Paulo
Guedes avisou que o país deveria se acostumar com um real desvalorizado. “O
dólar está alto? Problema nenhum, zero”, declarou. Na ocasião, ele
descrevia os efeitos de uma nova política econômica, com juros mais baixos.
Agora, os brasileiros descobriram que o patrimônio do ministro cresce a cada
vez que a cotação da moeda americana sobe.
Agentes públicos devem afastar situações que afetem interesses particulares porque precisam evitar que suas decisões no poder fiquem sob suspeita. Guedes pode acreditar que o dólar nas alturas favorece a dinâmica atual da economia brasileira, mas a titularidade de depósitos no exterior faz com que o ministro protagonize um conflito duplo.
O primeiro diz respeito à valorização e à
blindagem da conta da offshore que ele abriu cinco anos antes de chegar o
governo Bolsonaro. Desde 2019, a
alta do dólar fez com que o patrimônio da empresa subisse R$ 14
milhões em moeda nacional.
Nesse tempo, o ministro defendeu
abertamente o câmbio mais alto e trabalhou
contra medidas que poderiam taxar depósitos de brasileiros no exterior.
Mesmo que a equipe econômica tenha dezenas de argumentos para defender essas
posições, Guedes mergulhou num conflito de interesses milionário.
O segundo problema tem relação com as
escolhas políticas feitas pelo ministro. Guedes sempre advogou por uma redução
de gastos do governo, elaborou propostas
que limitam direitos e resistiu a adotar algumas
medidas de proteção social, enquanto sua saúde financeira estava preservada
de algumas das intempéries que afetam o restante da população brasileira.
Um cidadão não deve ser obrigado a fazer um
voto de pobreza ao assumir uma função pública. Mas há um conflito moral quando
esse ministro diz não enxergar "problema nenhum" no dólar alto que
forma seu patrimônio, enquanto a escalada do câmbio afeta os preços dos
combustíveis, da comida e de outros custos de quem já é muito pobre.
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