O Estado de S. Paulo
Tanto para Lula quanto para Bolsonaro,
centro é uma palavra despida de conceitos
Dois candidatos a presidente e uma ideia fixa:
a utopia do centro. Bolsonaro, que se acha predestinado a manter-se no poder,
por sua conta e risco; e Lula, que se imagina garfado pela História e quer
reaver o lugar.
O primeiro, só pensa em golpe. O segundo,
em compensação por um golpe que não houve. Impeachment não é golpe. É processo
político constitucional.
Lula acredita ter direitos adquiridos
depois de vencer quatro eleições presidenciais, duas para ele mesmo e duas para
um poste.
Ambos dedicam-se a reconquistar os votos do centro que, um dia, acidentalmente, foram seus. Imaginem, logo os eleitores do centro! Equidistantes dos extremos que os dois, de fato, representam. Há um impasse a romper. Sozinhos, não vencem. E os votos do centro mantêm-se ainda perplexos. Preferem a alternativa de esperar que surja o seu candidato confiável.
Bolsonaro e Lula, imperturbáveis, vão em
frente. Não conseguem despir, em público, a condição de radicais. Ao prometer
vestir o figurino da moderação, em particular, parecem andar em círculos, atrás
do próprio rabo. Articulam como se montassem uma equação aritmética. Tentam
engatar líderes e estruturas, esperando, assim, arrastar a maioria a seu favor.
Acham-se capazes de atrair os fiéis da balança para continuar girando a roda da
fortuna.
O convite de Bolsonaro ao ex-presidente
Temer (MDB) para ajudá-lo a superar sua frustrada tentativa de golpe do 7 de
Setembro deixou seus fanáticos à beira de um ataque de nervos. Entre
incredulidade e reclamações, os radicais não entenderam o alcance da manobra.
Assim como não compreendem que o eleitorado disponível nesta faixa seja
indispensável para superar seus limites de 30%.
Bolsonaro os contém, enquanto reforça sua
parceria com o Centrão, designação pejorativa de parte do centro eleitoral. Deu
a Casa Civil da Presidência a Ciro Nogueira e a presidência da Câmara a Arthur
Lira, com o cofre ao alcance da mão. E a ordem, implícita:
Façam o que quiserem, sobretudo no
Nordeste, mas tragam os seus currais.
Quanto a Lula, resolveu que já era tempo de
dar uma satisfação aos enciumados petistas históricos. Menos barulhentos, não
precisaram de consolos públicos. Convidados a participar, com ele, dos
conchavos e decisões, vieram imediatamente. Esta semana, Lula desembarcou em
Brasília, reuniu bancadas, chamou governadores. Até então, o ex-presidente
conduzia uma campanha tão fechada que seus amigos o imaginavam desdenhando a
disputa. Capaz até de dela desistir.
O ex-presidente estava apenas, e ainda
está, integralmente ocupado em buscar o centro. Negocia com o MDB, procura o
PSD, o Solidariedade, o PSDB e a quem mais possa corresponder aos seus acenos.
Lula age abertamente. Arranca declarações
amigáveis do ex-presidente Fernando Henrique (PSDB) enquanto espera os
dissidentes perdedores das prévias para escolha do candidato tucano. Recebe as
bênçãos do ex-presidente Sarney (MDB) em encontro reservado antes do jantar,
esta semana, que o reunirá com a velha guarda do partido.
Repete seu próprio roteiro de 2002. Quando,
declarando-se cansado de perder as disputas anteriores (para Collor e FHC),
atribuindo-as ao isolamento do PT, exigiu que se fizessem composições. Só seria
candidato com alianças amplas, gerais e irrestritas. Decisão que o levou à
vitória, à governabilidade, e à infeliz associação que o integrou ao elenco da
Lava Jato.
Tanto para Lula quanto para Bolsonaro, centro é uma palavra despida de conceitos. Sejam geográficos, geométricos, políticos, ideológicos, sociológicos. Para eles, centro não é um ponto de convergência de ideias e programas. É simplesmente um pacote de votos que lhes faltam para vencer.
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