Valor Econômico
A cada divulgação desemprego vem se aproximando cada vez mais das estimativas da chamada taxa natural, aquela que não acelera ou desacelera os indicadores de preços
Os analistas econômicos estão discutindo
até onde poderá cair a taxa de desemprego sem que provoque pressões de salários
e outros preços na economia, num momento em que o Banco Central aperta os juros
para recolocar a inflação na meta.
Nesta quarta-feira, o IBGE divulgou
estatísticas que mostram que a taxa de desemprego recuou para 9,1% no trimestre
terminado em julho, ante 9,3% no trimestre encerrado em junho.
A questão é que, a cada divulgação, a taxa
de desemprego vem se aproximando cada vez mais das estimativas da chamada taxa
natural de desemprego, aquela que não acelera ou desacelera a inflação, também
conhecida pela sigla em inglês Nairu.
Um bom indicador da visão do mercado sobre a taxa natural de desemprego são as projeções de longo prazo para a taxa de desocupação, coletadas pelo boletim Focus. Na última semana, o mercado estimava 8,8% para 2025.
O pressuposto é que, em 2025, o horizonte é
distante o suficiente para os analistas estimarem a taxa de desemprego livre de
fatores cíclicos de curto prazo - refletindo uma espécie de opinião do mercado
sobre a Nairu.
O problema, porém, é que a visão do mercado
vem mudando no último ano, em paralelo à queda do desemprego, como notou o
presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, em uma série de pronunciamentos
recentes.
Em setembro do ano passado, quando o BC
começou a pedir estimativas do mercado sobre a taxa de desocupação, o consenso
era de que a taxa natural de desemprego estava em 11,05%. De lá para cá, porém,
a desocupação caiu bem abaixo disso, mas os reajustes de salários continuaram a
ser feitos abaixo da inflação.
Campos Neto notou um fato curioso: há um
ano, o menor percentual citado por um analista econômico para a taxa natural de
desemprego era 9,5%. Hoje, portanto, o desemprego está abaixo da visão mais
otimista. No entanto, o rendimento médio real do trimestre encerrado em julho
ainda é 2,9% inferior ao de período equivalente de 2021 e o mais baixo desde
2012.
Hoje, a visão mais otimista do mercado para
a Nairu está em 7%. Uma semana antes, havia analistas afirmando que poderia ser
ainda menor, em 6%. Isso levou o presidente do BC a dizer, talvez com uma dose
de exagero retórico, que a Nairu pode estar em qualquer percentual entre 6% e
9%.
Os economistas do BC e do mercado
financeiro estão debatendo se, de fato, essa queda na Nairu é real - e, se for
mesmo, qual é a sua causa. Campos Neto e alguns economistas do setor privado se
arriscam a dizer que a reforma trabalhista do governo Michel Temer permite que
a economia trabalhe com uma desocupação mais baixa sem que isso cause pressões
inflacionárias.
Há alguns economistas, por outro lado, que
pregam cuidado para não superestimar o impacto da reforma trabalhista, devido
ao alto grau de informalidade no mercado de trabalho. Também dizem que há
setores do mercado que estão com pressão de mão de obra e salários, como
construção civil, e que é uma questão de tempo para que ela se espalhe para o
mercado de trabalho como um todo.
A discussão sobre a Nairu é central nas
decisões de política monetária, por isso Campos Neto vem mencionando o assunto.
Há alguns meses, o diretor de política econômica do BC, Diogo Guillen, destacou
o tema em sua entrevista sobre o relatório trimestral de inflação.
O Comitê de Política Monetária (Copom) do
Banco Central, na reunião de agosto, também notou que o desemprego vem
surpreendendo para baixo, mas sua conclusão é que o mercado de trabalho ainda
opera com capacidade ociosa - o que significa que a taxa de desocupação está
acima da Nairu.
Com uma Nairu mais baixa, o BC em tese
conseguiria controlar a inflação mesmo que o desemprego continue caindo. Seria
necessário, tudo mais constante, um aperto monetário menor, que desacelere
menos a economia e tenha um impacto mais suave no mercado de trabalho.
O Banco Central lançou, há dois anos, uma
linha de pesquisa para investigar como a reforma trabalhista e a pandemia da
covid-19 poderiam ter afetado o mercado de trabalho e suas consequências para a
inflação. Os resultados dessas pesquisas, porém, ainda não foram publicados.
Nenhum comentário:
Postar um comentário