Valor Econômico
Tirou-se do horizonte a sofreguidão que
ficava a cada mês de junho, quando, de forma casuística, o governo, mediante o
CMN, decidia qual seria a meta de inflação a ser perseguida
A decisão, tal como ficou, não foi só que a
meta para a inflação será contínua, aferida a cada mês com base na inflação
acumulada nos 12 meses anteriores. Mais do que isso: a decisão foi de que a
meta, agora, é permanente, de 3% com uma banda de variação de 1,5 ponto para
cima ou para baixo. Tornou permanente uma meta que era decidida a cada ano.
Isso sim foi um grande avanço, embora nada tenha a ver com prazos. Tirou-se do
horizonte a sofreguidão que ficava a cada mês de junho, quando, de forma
casuística, o governo, mediante o Conselho Monetário Nacional (CMN), decidia
qual seria a meta de inflação a ser perseguida pelo Comitê de Política
Monetária (Copom). E, como consequência, qual seria a taxa de juros necessária
para levar a inflação para a meta.
O Copom já não trabalhava com ano
calendário quando, por algum choque de preços, a inflação se descolava da meta.
Vamos aos prazos: 1) O prazo que o Banco Central terá para trazer a inflação, medida pelo IPCA, para a meta, deverá ser definido pelo próprio BC. Isso dependerá de um cardápio de circunstâncias, do tipo de choque que produziu o desvio, se ele é persistente ou não, da situação da economia no momento que o choque aconteceu.
A lástima é que toda vez que se reclama da
atuação do BC ou dos rigores pretensamente excessivos do regime de metas, é
sobre isso que se está pensando: que o Banco Central, por conta da
especificação das metas para anos gregorianos, estaria comprometido com trazer
a inflação para a meta no ano calendário. Razão pela qual a instituição
operaria com taxas de juros muito elevadas.
Isso é uma tolice, uma ficção sobre como o
Banco Central funciona.
Entende-se que o BC não está perseguindo a
inflação no ano, mas estará perseguindo-a para o ano seguinte. O BC não precisa
estar fixado em um ano gregoriano.
O prazo que o BC se concede para levar a
inflação para a meta pode ser de 18 meses.
Outra questão relativa ao tempo se refere
ao prazo que se calcula a inflação para saber se ela está ou não na meta.
Questão esta que se divide em duas: a frequência com que se calcula e a janela
que cobre com o seu cálculo.
Hoje calcula-se uma vez por ano para um
período de 12 meses acumulados. Uma vez por ano coincidindo com o ano
calendário. A proposta, agora, é de fazer uma periodicidade mensal e a janela
de 12 meses. Esse é o modelo convencional da meta contínua. A janela de 12
meses é a mais natural.
Assim, tira-se a ênfase indevida no ano
calendário e torna o regime mais homogêneo independente de quando ocorre o
choque.
Essas são, portanto, duas questões que
deverão estar explicitadas no decreto presidencial. Há, porém, um terceiro
aspecto que exigirá definição: diz respeito à satisfação que o Banco Central
terá que dar ao público em caso de fracasso no cumprimento da meta de inflação
que lhe foi atribuída.
Hoje também temos isso no ano gregoriano. A
cada ano, se estiver dentro da meta, o BC encerra a discussão com os ritos
formais: o relatório trimestral de inflação, as atas do Copom, idas do
presidente do BC ao Senado, as entrevistas da diretoria do BC.
Há, porém, um rito adicional, que é a carta
aberta que o presidente do BC tem que enviar ao ministro da Fazenda para
explicar porque não cumpriu a meta que, com o intervalo de tolerância, será de
1,5% a 4,5% a partir do próximo ano. Na carta, o BC tem que detalhar, também, o
que pretende fazer para enquadrar a inflação no intervalo citado.
Há quem defenda que o regime não precisa
disso, dado que já tem os ritos naturais. Mas é importante e útil como
mecanismo disciplinador do BC. Qual deve ser a periodicidade da satisfação que
a autoridade monetária deve dar ao público? Isso, que também deverá constar do decreto,
não está definido. Mas pode continuar sendo anual, para não banalizar o rito e
manter o seu impacto, apesar da aferição da inflação ser mensal.
No fim de cada ano, o BC explicitaria
quanto tempo a inflação de 12 meses ficou fora da banda e, se ela ainda não
voltou, o que será feito para que a taxa de inflação convirja para a meta.
O que é mais importante, no entanto, é
ficar a critério do Banco Central o horizonte de convergência da inflação para
a meta. Não se trata apenas de prerrogativa, já que essa é a principal decisão
da política monetária.
Aliás, esse era o grande temor do mercado:
o governo tentar fixar prazos de retorno da inflação a meta.
Muitos dos críticos do regime de metas para
a inflação se insurgiram contra o inimigo imaginário - que era a suposta
fixação do BC no ano gregoriano - e acharam que uma solução para essa suposta
fixação era tornar a aferição mensal, contínua, e não mais anual como é hoje.
Está se propondo para um problema que não
existia um remédio que talvez não fosse o mais indicado.
Acabou sendo mais um exercício de
simbolismo do que uma mudança no regime de metas. Tal com anunciado, ficou bom.
Representou um avanço institucional.
Agora, é esperar o decreto para ver se ele
traz tudo o que foi anunciado.
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