O Globo
Não há por que transformar opositores da
Reforma Tributária em revoltados
É natural que uma proposta de Reforma
Tributária tão complexa como a que agora tramita no Congresso venha gerando
tanta controvérsia. O que surpreende é que, não obstante o alto grau de
dissenso que ainda cerca a PEC da reforma, o presidente da Câmara, Arthur Lira,
esteja tão determinado a submetê-la à votação, a toque de caixa, em dois
turnos, antes mesmo do recesso parlamentar. É difícil encontrar justificativa
razoável para tamanho açodamento.
Vale esclarecer que, há décadas, venho sendo defensor ardoroso de um reordenamento da caótica tributação de bens e serviços no país nas linhas do que, afinal, está sendo tramitado no Congresso. E é muito bom constatar que, afinal, ideias vagas saíram do papel e deram lugar a uma proposta concreta de implementação de um esquema de tributação em bases amplas do valor adicionado, como há tempos se vê em economias mais avançadas, mundo afora.
Mas nunca subestimei as dificuldades de
implementação de uma reforma nessas linhas. De início, as preocupações que
afloravam no debate sobre a reforma pareciam quase integralmente centradas nos
entraves que poderiam advir da complexidade do arranjo de federalismo fiscal
brasileiro.
E, de fato, não parecia fácil eliminar
cinco tributos de competência da União, dos estados e dos municípios, e passar
a extrair a mesma receita de um novo esquema de tributação ampla e coerente do
valor adicionado.
Mas os entraves federativos eram apenas
parte dos obstáculos a superar. Já há muito tempo, quando pouca ou nenhuma
atenção se dava a esse ponto, venho alertando que, além das dificuldades
relacionadas ao federalismo, era preciso ter em mente que a reforma envolveria
uma redistribuição substancial de carga tributária entre setores.
Haveria, de um lado, redução da carga que
vinha sendo imposta a segmentos sobretaxados como telecomunicações, energia
elétrica, combustíveis e produtos industriais de uma forma geral e, de outro,
elevação da carga que recaía sobre segmentos menos expostos à tributação, como
serviços e produtos agropecuários.
Não vejo, portanto, razão para surpresa
quanto ao formato da economia política da reforma tributária que agora se
delineou, à medida que o texto da proposta tomou forma. Governadores de estados
e prefeitos de capitais inconformados. Enorme resistência de setores produtores
de serviços e do agronegócio. E, pior, aliança de todos que, por razões
diversas, se opõem à reforma.
Era preciso saber lidar com esse dissenso,
aparar arestas, esclarecer dúvidas, aceitar sugestões de aprimoramento,
desfazer temores e dar clareza a potenciais perdedores quanto à real extensão
da perda que poderão esperar.
Muitos dos reparos que vêm sendo feitos à
proposta de reforma merecem cuidadosa atenção. Basta ter em conta a ideia
impensada de criação de um mal-ajambrado Conselho Federativo, para lidar com as
sabidas dificuldades que advirão da preservação atávica da cobrança de parte do
IVA em nível subnacional. Teria sido muito melhor a solução de um IVA único,
administrado nacionalmente, em lugar da proposta tão mais complexa do IVA dual.
O certo é que não faz sentido passar o
trator sobre o dissenso remanescente, submetendo a PEC à votação, às pressas, a
ferro e fogo, com distribuição de benesses a torto e a direito, como garantia
de alíquota zero para produtos da cesta básica e promessas cada vez mais
generosas de fundos federais para amenização dos efeitos da reforma. Além,
claro, de frenéticas liberações de emendas de parlamentares.
Há uma longa sequência de batalhas pela
frente. Aprovada na Câmara, a PEC terá de passar pelo Senado. E ainda exigirá a
aprovação de legislação complementar que assegure lenta implementação das
mudanças contempladas, ao longo de muitos anos.
É bom lembrar que este é um país em que
emendas constitucionais que revertem PECs aprovadas no passado podem vir a ser
aprovadas num piscar de olhos. No esforço de aprovação da reforma tributária, a
ninguém interessa transformar os que têm razões para se opor às mudanças
propostas em revoltados.
Um comentário:
São todas pertinentes as ponderações feitas pelo economista Rogério Werneck neste artigo e eu espero que até a segunda votação do projeto de reforma tributária na Cãmara e durante o seu trânsito no Senado estas ponderações feitas por Rogério Werneck, e que também são feitas por Felipe Salto e por outros vários brasileiros sérios e bem preparados para refletir sobre o tema da tributação, sejam consideradas.
Mas as ponderações a serem consideradas precisam ter a qualidade e boa intenção que as apresentadas por estes opositores bem intencionados e servirem para aprimorar a reforma que está sendo discutida, e não servirem para interditar a tramitação ou descaracterizar o projeto.
Há os opositores legítimos e respeitáveis de alguns aspectos deste projeto de reforma que está sendo discutido, como Rogério Werneck e Felipe Salto, e há os que são "do contra", que só querem boicotar as mudanças para proveito próprio, para a defesa de interesses corporativos e mesquinhos de alguns segmentos econômicos e há até os que "são do contra" apenas para tumultuar o ambiente.
Temos que acolher os bem intencionados opositores em qualquer tema ou assunto, mas nenhuma complacência cabe ter com aqueles que só querem se opoe para ser do contra e tumultuar, sem nenhuma intenção de contribuir para melhorar o Brasil.
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