segunda-feira, 8 de setembro de 2025

Brasil precisa de compromisso institucional. Por Irapuã Santana

O Globo

Autonomia do BC não deveria ser defendida apenas quando convém politicamente, mas sim como pilar da estabilidade monetária

O oportunismo político tem consequências diretas e nefastas na estabilidade e no desenvolvimento do país. Um exemplo notório é a oscilação de posições em relação às políticas comerciais. Quando a taxação das blusinhas estava em pauta, foi defendida por muitos como medida protecionista vital para a indústria nacional. O argumento era que a barreira tarifária protegeria empresas brasileiras da concorrência desleal de produtos asiáticos, gerando empregos e fortalecendo a economia interna.

No entanto essas mesmas vozes se levantaram em uníssono contra as taxas impostas pelo governo Trump a produtos brasileiros, classificando-as como ato de protecionismo injustificado e, ironicamente, passando a defender a abertura de mercado e o livre-comércio. A contradição é gritante: o protecionismo é bom quando defende a indústria nacional, mas ruim quando afeta as exportações do Brasil.

A mesma lógica se repete no debate sobre a autonomia do Banco Central (BC). Por anos, ela foi alvo de críticas ferrenhas, acusada de operar em benefício de interesses financeiros, em detrimento do crescimento econômico e da criação de empregos. Defender a autonomia era visto como agenda neoliberal, que servia apenas para manter juros altos e o poder concentrado nas mãos de poucos. Houve até projetos de lei para flexibilizá-la, como o PLP 19/2023, de autoria da bancada do PSOL, que pretende definir os objetivos do BC e dispor sobre sua autonomia e a nomeação e a exoneração de presidente e diretores. Outra proposta, o PLP 39/2021, foi mais longe e estabelece ser possível exonerar o presidente e os diretores do BC “a requerimento aprovado pela maioria absoluta da Câmara dos Deputados, quando a condução das atividades do Banco Central for incompatível com os interesses nacionais”.

Na semana passada, acendeu o alerta, porque o Centrão pediu prioridade de tramitação. Ocorre que o projeto tem origem na base do governo, com deputados do PSB. Aí vemos os mesmos que defendiam a intervenção reclamarem de “ataques à instituição”, argumentando que ela é prejudicial à credibilidade e à estabilidade da economia.

O que mudou? O governo e o comando. A autonomia do BC não deveria ser defendida apenas quando convém politicamente, mas sim como pilar fundamental para a estabilidade monetária, a credibilidade do país e a previsibilidade para investidores.

A contradição sugere que o problema não é a intervenção ou a falta de autonomia em si, mas sim quem a exerce. Se a intervenção for exercida por um grupo político com que se concorda, é vista como virtuosa e necessária; se por um grupo de que se discorda, é considerada ataque à democracia e às instituições.

Enquanto não olharmos para as instituições de modo que elas funcionem independentemente de quem esteja no poder, o Brasil sempre patinará com a mudança na direção do vento de quem comanda, indo de um lado para o outro, em vez de ir para a frente.

 

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