terça-feira, 30 de setembro de 2025

Concessão de espaços públicos à iniciativa privada domina o Rio. Por Alvaro Costa e Silva

Folha de S. Paulo

Estimadas em R$ 120 milhões, obras no Jardim de Alah dividem a população

Prefeitura construções no Passeio Público, mais antigo parque da América Latina

De olho no voto evangélico, a ponto de dizer que "mexeu com Malafaia, mexeu comigo", Eduardo Paes toca o projeto que vai substituir a Cidade das Crianças pela Terra Prometida. O visitante do parque, com 198 mil metros quadrados, em Santa Cruz, na zona oeste, poderá se perder na Torre de Babel e atravessar o Mar Vermelho.

O custo do milagre não foi divulgado. Mas terá o dedo da iniciativa privada, no modelo de concessão, com empresas explorando o espaço público. Foi assim no parque Monarco, em Madureira, e em outras praças da zona norte. Nada contra. A questão é estabelecer urgência, benefícios e limites do negócio.

Dois exemplos de como a prefeitura age —ou deixa de agir— estão na ordem do dia: o Jardim de Alah, que divide Ipanema e Leblon, dois dos bairros mais valorizados da cidade, e o Passeio Público, ao lado da Lapa, no coração do problemático centro histórico.

Estimadas em R$ 120 milhões, as obras no Jardim são alvo de críticas e elogios. A proposta da concessionária é construir restaurantes, mercados, área para música, estacionamento para mais de cem carros —e outro jardim, mas suspenso. Moradores reclamam do dano ambiental, com a derrubada de, no mínimo, 90 árvores. Outros, a favor da reforma, dizem que o grupo contrário não quer a integração do rico Leblon com a Cruzada São Sebastião, conjunto habitacional que abrigou os expulsos da Favela do Pinto, em 1955.

"Velho jardim macio e solidário, cheio de evocações do passado (...) parece relembrar a dolente lamúria dos antigos amores da cidade", escreveu Mário Pederneiras sobre o Passeio, primeiro parque público da América Latina, de 1783, hoje vítima de um abandono total. Da Fonte dos Amores, de Mestre Valentim, não jorra nem água suja.

Ali tudo é tombado pelo Iphan desde 1938. A prefeitura vê brecha para novas construções, pois o Passeio tem dois quiosques que no passado foram pontos de comércio. Enquanto isso, o jeito foi fazer uma roda de samba aos domingos. O samba salva, mas contar só com ele não dá.

 

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