segunda-feira, 20 de outubro de 2025

No FMI, Brasil tenso, estrangeiro tranquilo, por Alex Ribeiro

Valor Econômico

As reuniões do FMI são um momento especial para capturar o humor dos investidores

O climão nas reuniões do Fundo Monetário Internacional (FMI) e do Banco Mundial, na semana passada, pode ser resumido da seguinte forma: os investidores brasileiros estavam muito preocupados com a deterioração fiscal no Brasil, e os estrangeiros, pouco atentos.

Muita gente que esteve em Washington ficou incomodada com a complacência com que os investidores tratam não só o Brasil, mas também os vizinhos da região - a Colômbia, com sua deterioração fiscal, e o Chile, que terá eleições no mês que vem. Ambos não foram um tema relevante nos encontros.

As reuniões do FMI são um momento especial para capturar o humor dos investidores. Além das reuniões oficiais, há uma série de eventos em auditórios reunindo investidores, analistas econômicos, cientistas políticos e autoridades econômicas de todo o mundo, numa intensa troca de informações.

Os brasileiros pareciam mais abatidos, segundo a avaliação de um investidor baseado em Nova York, devido à combinação de preocupação com a política fiscal com a evolução do cenário eleitoral do ano que vem.

A essa altura, é notória a preferência de participantes do mercado por um candidato de oposição que, esperam, possa adotar uma agenda mais rápida para equacionar o déficit fiscal e reduzir gastos, além de implementar reformas liberais que, acreditam, possam gerar ganhos de produtividade e aumentar a taxa de crescimento da economia brasileira.

O candidato dos sonhos do mercado é o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, ou outro da safra de governadores de direita. Até algumas semanas atrás, muitos apostavam que Tarcísio poderia vencer a disputa. Esse cenário vem se mostrando um pouco menos provável, com a recuperação da popularidade do presidente Lula e alguns arranhões na imagem do governador, por sua associação ao bolsonarismo mais radical.

Mas a opinião dos brasileiros, atualmente, tem menos peso para definir aonde vão o dólar, a bolsa e os juros. Ultimamente, quem tem dado as cartas no mercado brasileiro são os investidores estrangeiros.

Na bolsa, por exemplo, os aportes de capital de fora do Brasil somam R$ 19,8 bilhões no ano, embora no começo deste mês tenha havido um forte momento de saída.

As operações de “carry trade”, em que investidores tomam dinheiro mais barato em outros mercados para aplicar nos altos juros do Brasil, de 15% ao ano, continuam fortes. Os fluxos de investimento estrangeiros para a compra de títulos de renda fixa no mercado doméstico somaram US$ 6,5 bilhões, de janeiro a agosto.

As posições no mercado de derivativos também são expressivas, não só aqui dentro. O relatório do Banco Internacional de Compensações (BIS, o banco central dos bancos centrais), divulgado a cada três anos, mostra que o grosso dos derivativos de dólar em relação ao real é negociado no exterior, em praças financeiras como Londres e Cingapura.

Já os investidores brasileiros têm uma posição menor e, portanto, menos capacidade de influenciar a precificação de mercado. A indústria de fundos multimercado perdeu um pouco de sua força recentemente, com retornos menores e as dificuldades de competir com os títulos com isenção de impostos.

Não é a primeira vez que os investidores brasileiros estão mais soturnos do que os estrangeiros - isso costuma ser comum. Na visão de uma fonte baseada em Nova York ouvida pelo Valor, isso ocorre porque os estrangeiros estão de olho no mundo todo, fazendo com que os riscos negativos do Brasil sejam apenas mais um ponto no radar global.

Um resumo disso está documentado no Monitor Fiscal do FMI. Até 2029, a dívida pública global deverá superar 100% do Produto Interno Bruto (PIB) somado de todas as economias, maior nível observado desde 1948, puxado por um ambiente de juros mais altos em várias das economias desenvolvidas.

Também há riscos à estabilidade financeira global. O FMI diz que a valorização de empresas impulsionada pela onda da inteligência artificial tem a cara da bolha da internet de 2000. Os títulos privados estão com spreads muito apertados. Nas últimas semanas, alguns dos elos mais fracos já começaram a se quebrar, como no caso da empresa de autopeças First Brands, que tomou crédito pelo setor não bancário, ponto cego para órgãos supervisores de muitos países.

O FMI também fez referência, em mais de um documento, à importância de garantir a independência dos bancos centrais e sua proteção contra interferências políticas - um recado que parece endereçado aos Estados Unidos, onde o Federal Reserve está sob pressão para baixar os juros pelo presidente Donald Trump.

Nada disso apaga os riscos do Brasil, cuja dívida pública é maior que a das demais economias emergentes, sem plano fiscal abrangente para conter seu crescimento. Mas, segundo outra fonte em Nova York, a Faria Lima pode estar antecipando demais os efeitos das eleições - algo que só ocorrerá no ano que vem.

O fato é que, em praticamente todas as eleições, houve algum grau de volatilidade - algumas mais, outras menos. Quando chegar a hora, provavelmente os investidores estrangeiros ajustarão as suas posições.

 

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