segunda-feira, 20 de outubro de 2025

O plano de paz, por Denis Lerrer Rosenfield

O Estado de S. Paulo

A criação de um Estado palestino é a consequência desse processo, o que implica que o seja por meio de uma convivência pacífica com o Estado judeu

É bastante curiosa a cobertura que tem sido dada ao plano de paz para o Oriente Médio, proposto pelo presidente Trump. Trata-se de uma proposta arrojada, delineando um caminho claro de execução. Não se contenta com propostas abstratas e inexequíveis, mas apresenta etapas a serem cumpridas. Nada será fácil, visto que muitos dos protagonistas tudo farão para torpedear. No entanto, mal essa proposta foi anunciada, os seus críticos contumazes se voltaram para condená-la, expondo simplesmente preconceitos e posicionamentos ideológicos.

Trata-se de um plano de paz que começa por um cessar-fogo, considerando a correlação militar estabelecida após dois anos de combate. Como acontece em todas as guerras, olhe-se para o século 19 ou 20, há vencedores e vencidos. Evidentemente, os primeiros ditam as condições essenciais, cabendo aos segundos aceitar a derrota. Isso pode significar a conquista de territórios, que podem ou não ser devolvidos, dependendo das negociações; desarmamento dos perdedores; previsões fronteiriças quanto ao futuro; e assim por diante. Ora, o inusitado consiste em que, para a esquerda mundial, as posições foram invertidas, como se coubesse ao Hamas, uma organização terrorista, ditar as condições e coubesse a Israel, um Estado democrático, somente o dever de aceitá-las. Logo, é coerente que o plano de Trump proponha uma rendição parcial.

Não convém tampouco esquecer que a causa da guerra foi o massacre do 7 de Outubro, com mais de 1.200 pessoas assassinadas e 250 sequestradas. A barbárie foi completa com mulheres violadas e mutiladas genitalmente e crianças queimadas vivas, com corpos de adultos fumegando nas ruas, amontoados uns sobre os outros. Em 2005, Israel devolveu toda a Faixa de Gaza para os palestinos sob o governo de Sharon, de direita, não ficando nem com um metro de território. Ganhou, todavia, como retribuição, um ninho de terroristas, após o Hamas ter derrotado o Fatah, com seus membros sendo assassinados, alguns jogados de edifícios. Nada muito diferente daquilo que essa organização terrorista está agora fazendo, disparando tiros na nuca de seus opositores palestinos nas ruas de Gaza.

Dedica-se, isto sim, ao culto à morte. Nunca almejou a criação de um Estado palestino, mas voltou-se concretamente à eliminação do Estado de Israel, cavando, assim, a sua própria sepultura. Portanto, não deveria estranhar que o plano Trump proponha como segunda etapa o desarmamento do Hamas e a desmilitarização de Gaza. Enquanto essa organização estiver no poder, exercendo o terror e armada, nenhuma paz será possível, tampouco a criação de um Estado palestino.

Uma vez a guerra decretada, a persistência do Hamas em não libertar os reféns, em tudo contribuiu para a sua duração. Foram utilizados como moeda de troca, aquilo que a esquerda mundial considera como “resistência”, palavra que só pode significar, nesse contexto, aquiescência à violência, ao ódio, numa renúncia a oferecer um bem-estar aos palestinos. E o plano americano contemplou bem essa situação ao colocar como sua primeira etapa a libertação dos reféns e a entrada maciça de ajuda humanitária. Israel, ato contínuo, retirou suas tropas para um novo perímetro, até que as fases de sua implementação sejam preenchidas, quando sim haveria a retirada completa. E o que está fazendo o Hamas? Criando desculpas para não entregar os corpos dos reféns, numa flagrante violação do acordado.

Note-se que o plano Trump contou com a participação e o apoio incondicional de países árabes e muçulmanos. Sem eles, a proposta de paz nem teria sido possível. Para isso, usaram como instrumentos negociações secretas e cooperação nas áreas militar e de inteligência com Israel. Para eles, o Hamas é uma organização fantoche do Irã xiita, procurando dominar essa região em prejuízo dos árabes sunitas. Essa outra rivalidade opera como pano de fundo, ressaltando o vínculo estreito entre esses países e a atual administração americana. O Egito, por exemplo, é inimigo jurado da Fraternidade Muçulmana, da qual o Hamas é um rebento. Chegou a fechar sua fronteira com esse território, fazendo o mesmo que Israel, sem que houvesse indignação dos islamo-esquerdistas. O bloqueio foi também egípcio e não houve nenhuma flotilha de “solidariedade”, de enganação.

A criação de um Estado palestino é a consequência desse processo, o que implica que o seja por meio de uma convivência pacífica com o Estado judeu. Trump considera essa demanda como a culminação dessa trajetória, pressupondo a eliminação do Hamas e uma Autoridade Palestina não corrupta, hoje incapaz de governar a Cisjordânia. Seja dito, porém, em sua defesa, que os assentamentos israelenses nessas áreas procuram torpedear qualquer acordo. Declarações genéricas de apoio ao Estado palestino até agora só favoreceram o Hamas, que se considerou legitimado internacionalmente, em nada contribuindo para a causa. Em outra orientação, Trump apresenta um mapa do caminho a ser trilhado.

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