sexta-feira, 10 de outubro de 2025

Sucessão no STF será política. Por Vera Magalhães

O Globo

Favoritos para o lugar de Barroso são todos homens, e nomeação de mulher só ocorrerá com mobilização social semelhante à que barrou a PEC da Blindagem

A política dita as conversas, que já correm adiantadas, para a escolha do sucessor de Luís Roberto Barroso no Supremo Tribunal Federal, agora que o ministro confirmou sua aposentadoria antecipada. Para que a indicação de uma mulher à Corte passe a ser cogitada por Lula, precisará haver pressão social de tal monta que ele entenda que isso será fator crucial na campanha eleitoral de 2026 — algo que, até aqui, não é considerado.

Por ora, a avaliação que faz a todos que o abordam sobre a questão de gênero na escolha é que “nunca antes neste país” um presidente indicou tantas mulheres para Cortes superiores quanto ele. No atual mandato, foram cinco as designadas a tribunais superiores: Maria Marluce Caldas Bezerra e Daniela Teixeira para o Superior Tribunal de Justiça, Verônica Sterman para o Superior Tribunal Militar e Edilene Lôbo e Estela Aranha para o Tribunal Superior Eleitoral.

Ao fazer um “pacotão” dessas vagas, Lula finge não saber que o STF tem outro peso no jogo institucional e político e no plano simbólico da luta pela igualdade de gênero. Se não for cobrado pelos movimentos feminista e negro — já que uma das mais justas reivindicações é pela designação da primeira mulher negra da História da mais alta Corte de Justiça do Brasil — com a mesma veemência que seria um presidente de centro ou de direita, ele seguirá com um dos dois roteiros que vêm se desenhando nos bastidores, com três homens, todos eles brancos, muito jovens e com forte lastro político, como favoritos.

Lula foi, de longe, o presidente que mais escolheu integrantes para o Supremo: dez até agora. A vacância da cadeira de Barroso é mais um dos muitos golpes de sorte com que ele vem sendo agraciado neste semestre. O ministro tem só 67 anos, e só cairia na “expulsória” em março de 2033 — depois, portanto, até do próximo mandato, quando três ministros já terão de ser substituídos.

Como muitos desses indicados votaram contra seu governo em casos como o mensalão e a Lava-Jato, Lula tem priorizado a expectativa de fidelidade dos novos ungidos. Daí por que a questão de gênero precisará de mobilização semelhante à que levou ao sepultamento da PEC da Blindagem para enfrentar essa convicção de que a proximidade com o chefe do Executivo é o principal critério para a escolha.

Nessa modalidade de currículo, a vantagem é do advogado-geral da União, Jorge Messias, que não desfruta, no entanto, o mesmo rol de apoios políticos que os outros dois cotados para a vaga: o ministro do Tribunal de Contas da União Bruno Dantas e o senador Rodrigo Pacheco. Existe ainda a costura de uma triangulação em que Dantas iria para o STF e Pacheco para sua vaga no TCU. Os dois têm apoio amplo no Senado, Casa que tem sido importante para a governabilidade limitada de Lula no Congresso.

Enquanto a bolsa de apostas corre, vale um olhar detido sobre o anúncio de Barroso. Não deixa de ser uma demonstração rara de desprendimento diante do poder quase incomparável que desfrutam os 11 integrantes da Corte a decisão de se retirar antes da hora. Como legado, o ministro, recém-saído da presidência, deve brandir a firmeza na defesa da democracia no período especialmente turbulento em que comandou o tribunal.

Na saideira, a principal dúvida é se Barroso deixará um voto a respeito da questão mais controversa sobre sua mesa: a ADPF 442, proposta pelo PSOL, que pretende descriminalizar o aborto até as 12 semanas. Mesmo em entrevistas recentes, ele tem dito que o país não está pronto para ampliar as hipóteses de aborto legal. Considera que insistir nisso via STF pode levar a uma reação do Congresso que vá no sentido contrário.

São duas, portanto, as frentes em que as expectativas dos movimentos feministas podem sair frustradas na troca de cadeiras do STF. A política, como sempre, está no centro das decisões.

 

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