O Estado de S. Paulo
Semana
passada o Comitê de Política Monetária (Copom) brindou a todos os brasileiros
com uma decisão que só não surpreende aqueles que vivem do juro pago pelo
Tesouro Nacional, aquele mesmo que todo brasileiro financia com seus impostos.
Diversos indicadores recentes compõem um ambiente econômico que aponta a
manutenção do juro em 15% ao ano como um equívoco de política econômica. E, por
favor, não venham com a ladainha de que o Banco Central é um organismo
meramente técnico. É da natureza da política monetária que ela seja uma
política do Estado.
A famosa ata do Copom, que já parece estar sendo submetida a um maior número de exegeses do que a própria Bíblia Sagrada, declara a primazia do instrumento único da política monetária no Brasil. O ato declaratório, com soberbo ar científico, reza ao Brasil: “O Comitê avalia que a estratégia de manutenção do nível corrente da taxa de juros por período bastante prolongado é suficiente para assegurar a convergência da inflação à meta”.
Infelizmente, falta ao Banco Central (BC) honrar o mandato de
independência que lhe é tão caro. O BC poderia começar dizendo as razões que
levam o Brasil a ser submetido a uma taxa real de juros que é a segunda mais
alta do mundo, apenas perdendo para a Turquia. Tomando-se uma taxa média de
inflação condizente com a expectativa do mercado para o Índice Nacional de
Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) ao final de 2026 (agora em 4,2%), a taxa
nominal da Selic de 15% significa um juro real superior a 10% ao ano.
Nossa Autoridade Monetária é uma instituição com poder muito
superior a seus congêneres de outros países, dado que o seu leque de
atribuições é de amplitude singular. Ela domina todo o arcabouço de
instrumentos da política cambial e dispõe de reservas internacionais de grande
dimensão. A fiscalização do sistema bancário está completamente em suas mãos. E
mais, o Banco Central é o único agente econômico que simplesmente pede ao
Tesouro que emita títulos públicos para reforçar sua posição patrimonial e
fazer frente a seus custos.
Ou seja, embora tenha um poder imenso, o Banco Central utiliza
apenas um instrumento para executar a política monetária: a marcação da taxa
básica de juro da economia via fixação da taxa Selic. É estranho que todos os
outros instrumentos de controle da liquidez e do crédito tenham sido
completamente abandonados.
Os efeitos negativos de uma taxa real de 10% ao ano no longo
prazo, afinal, é este o brilhante remédio que o BC nos oferece, não são
pequenos. A começar pela dívida pública. Se a dívida do Tesouro é de 79,5% do
Produto Interno Bruto (PIB), o juro real deve atingir algo como 8% do PIB. E o
mais incrível é que o BC não perde a chance de jogar na “fragilidade” da
política fiscal a culpa pelo juro alto.
Os efeitos não param aí. No segundo trimestre de 2025, os dados do
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) mostram queda de 2,2% na
formação bruta de capital, em relação ao primeiro trimestre. Embora maior, em
2025, do que no ano anterior, a taxa de investimento (relação FBCF/PIB) ficou
em 16,8% no segundo trimestre de 2025.
É lógico que o Brasil precisa de investimentos que destravem os
torniquetes que foram se construindo no tecido econômico, com ênfase na
infraestrutura. Mas quem, em sã consciência, pode investir diante de uma taxa
de juro real de 10% ao ano?
Vale frisar, com a debilidade da criação de nova capacidade
produtiva, jamais o produto potencial crescerá de maneira razoável. E, por
isso, o hiato de produto sempre condicionará a política de juros do BC a níveis
elevados.
A decisão neste momento de manter o juro no patamar elevado afeta,
igualmente, os fluxos de capital. O diferencial entre as taxas de juros brasileira
e americana caiu, dada a decisão do Federal Reserve (Fed), banco central dos
EUA, de reduzir sua taxa. Evidente que os investidores terão mais apetite por
papéis brasileiros pela expansão do diferencial de taxas. O subproduto é a
valorização do Real frente à moeda americana. É tudo o que os exportadores
brasileiros não precisam neste momento tão complexo por conta da volatilidade
das decisões do governo americano.
Outro aspecto de grande importância é que uma taxa de juro desse
tamanho é o motor para desequilíbrios nas cadeias produtivas do País. Aqueles
que dependem de capital de giro ou os que estão submetidos a períodos de
investimento muito longos enfrentam grandes prejuízos. O mesmo vale para
atacado e varejo que se defrontam com a inadimplência em suas vendas
financiadas.
O mais surreal é que as apostas do mercado apontavam para IPCA de
outubro de 0,10 a 0,16%, indicando uma tendência de queda expressiva. E o
índice anunciado acabou sendo ainda menor, 0,09%. As indicações de convergência
do índice para a parte interna das bandas de variação em torno dos 3% da meta
são inequívocas. E, convenhamos, apostar tudo numa meta de 3% de inflação,
mesmo com a turbulência com que o mundo tem convivido, é uma insanidade.
A decisão do Banco Central sobre os juros, em novembro, indica que o País parece ter feito uma opção pela estagnação.

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