Valor Econômico
Redução da Selic pode ocorrer em março ou no meio do ano, quando comitê do BC for totalmente indicado pelo atual governo
“Gabriel não deveria ir agora”, disse à
coluna um integrante da ala política do governo. Era 2023 e Gabriel Galípolo,
então secretário-executivo do Ministério da Fazenda, havia sido indicado pelo
ministro da Fazenda, Fernando Haddad, para uma vaga na diretoria do Banco
Central. Posteriormente, seria alçado à presidência.
Na visão do palaciano, Galípolo poderia seguir mais um tempo na Fazenda, onde fazia um bom trabalho na articulação com o Congresso Nacional para aprovar pautas da área fiscal, em vez de compor um colegiado majoritariamente composto por indicados do governo anterior. “Para quê?”, questionava a fonte.
Esse era um ponto de vista que havia naquela
ala do governo quando o presidente Luiz Inácio Lula da Silva começou a mudar a
composição do Comitê de Política Monetária (Copom), o colegiado formado pela
diretoria do Banco Central que é responsável pela definição da taxa de juros
básica da economia, a Selic. Era como se a taxa de juros fosse uma decisão
primordialmente política, daí porque o governo ter maioria de votos era
determinante.
A insatisfação com o desempenho de Galípolo,
externada na semana passada pela ministra das Relações Institucionais, Gleisi
Hoffman, mostra que o plano de constituir maioria no Copom frustrou quem achava
que, dessa forma, faria prevalecer a visão do governo sobre a política
monetária.
A ata da mais recente reunião, divulgada na
terça-feira (11) diz que o Copom decidiu manter os juros em 15% “por período
bastante prolongado” para que a inflação convirja para a meta de 3%. Hoje, as
projeções indicam inflação de 4,5% em 2025 e 4,2% em 2026. No segundo trimestre
de 2027, chegaria a 3,3%.
Por outro lado, a diretoria disse ter “maior
convicção” de que o atual nível dos juros é suficiente para colocar a inflação
na meta. Ou seja: os juros não caem logo, mas também não será necessário
elevá-los.
O governo, porém, está desconfortável. Na
sequência do posicionamento de Gleisi, para quem Galípolo deixou a desejar,
Haddad disse considerar que há espaço para reduzir os juros. Porém, evitou
criticar diretamente o presidente do Banco Central, a quem elogiou pela atuação
na regulação das fintechs.
Também nesta terça-feira, saiu o resultado do
Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) de outubro: 0,09%, abaixo do 0,14%
esperado pelo mercado, segundo pesquisa do Valor Data. O desempenho reforçou as
expectativas de redução dos juros.
Na visão do Copom, o cenário à frente ainda
traz desafios para a inflação. Por exemplo, o cenário externo incerto e o
mercado de trabalho ainda aquecido.
Outro ponto de dúvida são as contas públicas.
“A política fiscal tem um impacto de curto prazo, majoritariamente por meio de
estímulo à demanda agregada, e uma dimensão mais estrutural, que tem potencial
de afetar a percepção sobre a sustentabilidade da dívida e impactar o prêmio a
termo da curva de juros”, diz. “O comitê reforçou a visão de que o
esmorecimento no esforço de reformas estruturais e disciplina fiscal, o aumento
de crédito direcionado e as incertezas sobre a estabilização da dívida pública
têm o potencial de elevar a taxa de juros neutra da economia, com impactos
deletérios sobre a potência da política monetária e, consequentemente, sobre o
custo de desinflação em termos de atividade.”
Os efeitos da isenção do Imposto de Renda da
Pessoa Física (IRPF), que entrará em vigor no ano que vem, foram incorporados
nas contas do Banco Central de forma preliminar. A ideia é esperar mais dados
para então calibrar os impactos.
A cautela acontece porque, quando foi lançado
o crédito consignado para trabalhadores privados, o Copom alertou para seu
“efeito mitigador” em relação à política monetária. Esse, porém, se mostrou
mais fraco do que o esperado.
Apesar da chiadeira no governo, a manutenção
dos 15% na próxima reunião, em 9 e 10 de dezembro, pode ser positiva para a
estratégia eleitoral do presidente Lula, avaliou um integrante do governo em
recente conversa com a coluna.
Hoje, ainda há no Copom dois integrantes
remanescentes do governo anterior: o diretor de Política Econômica, Diogo
Guillen, e o diretor de Organização do Sistema Financeiro, Renato Dias de Brito
Gomes.
Em 2026, ano eleitoral, o Copom será 100%
indicado por Lula. E, possivelmente, vai começar a cortar os juros - na reunião
de março ou mais para o meio do ano, apostam integrantes do mercado. Será a
hora de colher os dividendos políticos, ainda que os efeitos econômicos do juro
menor demorem a aparecer.
“Tem o trabalho e tem o barulho”, costumava
dizer Paulo Guedes quando era ministro da Economia e queria separar as medidas
econômicas das narrativas políticas. O Copom vem fazendo seu trabalho debaixo
de um barulho que não deve arrefecer tão cedo.
É um quadro ruim do ponto de vista
institucional, porque coloca em dúvida a independência do Banco Central. É
também ruim para o governo, pois o Copom politicamente pressionado pode ser
forçado a ser mais conservador, para demarcar sua autonomia.

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