- O Estado de S. Paulo
Em política quase nada é impossível, mas nem tudo é plausível. Há especulação de todo tipo, mas parece claro que, ao final, algumas dezenas de políticos sejam implicados com a Operação Lava Jato. Não parece plausível que a denúncia do procurador-geral da República ao STF possa melhorar o ambiente, improvável que seja apenas “mais uma flechada em São Sebastião”. Mais lógico que agrave o ambiente e mais confusão daí resulte.
A não ser que a montanha venha a parir um rato, os pedidos de abertura de inquérito farão com que pencas de políticos tenham de se explicar. Será um “deus nos acuda”, com acusações de todos os lados e um jogo de pressões e chantagens. A agenda do país, ficará, é claro, paralisada — mais do que já está. Não cabe culpar o mensageiro, o procurador faz seu trabalho. A mensagem será mesmo negativa e as alternativas limitadas. A presidente e o PT podem até torcer para que também a oposição seja alvejada; culpar governos anteriores, apontar o cisco no olho do outro. Mas, abraços de afogado são como jogar esterco no ventilador: compromete a todos, sem resolver o problema.
O quadro tem se agravado em progressão geométrica. Há meses, discutia-se apenas o problema econômico; hoje, sabe-se que a economia não se revolverá por si ou pela simples ação (ou capitulação) da presidente. A política tornou-se variável prejudicial: incapaz de mitigar problemas econômicos, aprofunda o drama; as crises se alimentam mutuamente.
A piora do ambiente político mina a governabilidade e impede o bom manejo de ajustes que coloquem a economia nos trilhos: o ambiente econômico se deteriora e escândalos — como os revelados pela Lava Jato – são menos tolerados. Não há condescendência no humor da opinião pública e, assim, “melar o jogo” com questionamentos processuais, como no passado, é mais difícil ou impossível. O cachorro devora o próprio rabo.
O que esperar deste cenário? Difícil dizer. Mas, possível intuir que se caminha para “um tipo piorado de sarneyzação”: estagnação econômica e crise política. “Piorado” porque, ao longo dos anos, houve rebaixamento da qualidade dos políticos. Falta à Dilma Rousseff a experiência que José Sarney já trazia em seu tempo. Também o Congresso é um deserto de personagens capazes de conduzir o processo a bom termo. Eduardo Cunha não é Ulysses Guimarães; o conflito se agudizou, o Centro é mais fisiológico que político, o baixo-clero triunfou e o governo carece de operadores eficazes. Ao final, a denúncia do procurador-geral pode prenunciar um perigoso vazio.
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Carlos Melo, cientista político. Professor do Insper.
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