O programa que o PT levou ao ar na última terça-feira e os últimos acontecimentos na Câmara dos Deputados confirmaram que, do poder, o partido quer apenas as delícias. Já o pesado fardo de ser governo, que fique com a presidente Dilma Rousseff e com os partidos da base aliada.
Esse comportamento explica por que razão PT e Dilma estão brincando de esconde-esconde: já não se sabe mais, a esta altura, quem quer mais ardentemente desvincular-se de quem – se o partido da presidente ou o contrário.
Consta que Dilma não apareceu no programa petista na TV por sugestão de seu padrinho, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Na verdade, ela nem poderia mesmo ter participado, pois o programa parece ter sido produzido para promover um partido de oposição.
Como se a presidente não fosse petista, o programa do PT informou aos eleitores que o partido entende a necessidade do ajuste fiscal, para “corrigir o que está errado”, mas exigiu que essas medidas “não afetem os mais pobres, mas sim quem tem mais recursos”.
“No ajuste econômico que o governo está fazendo agora, o PT tem defendido que não se cortem direitos dos trabalhadores”, disse um dos apresentadores, fazendo ar sério, para enfatizar o tom de advertência ao mencionado “governo”. Nem o dedo em riste faltou.
No fundo da tela lia-se que o “PT defende direitos dos trabalhadores”, uma mensagem explícita contra aqueles que, como o ministro da Fazenda de Dilma, Joaquim Levy, defendem reformas que racionalizem ou cortem alguns benefícios em nome da urgente necessidade de reorganizar as depauperadas contas públicas.
Mas a estrela foi mesmo Lula. No momento em que Dilma luta para reconquistar sua base aliada no Congresso, justamente para conseguir aprovar o ajuste fiscal, o líder petista usou o programa do partido para atacar a Câmara por ter aprovado o projeto que regulamenta a terceirização da mão de obra.
Lula chegou a dizer que “esse projeto faz o Brasil retornar ao que era no começo do século passado”, um tempo “em que o trabalhador era um cidadão de terceira classe, sem direitos, sem garantias, sem dignidade”. A fala do demiurgo petista e o tom do programa causaram compreensível espanto entre os parlamentares do PMDB, principal sócio da base governista. O líder peemedebista na Câmara, Leonardo Picciani (RJ), chegou a dizer que seu partido terá muita dificuldade em apoiar o ajuste “até que o PT nos explique o que quer”.
Não é difícil de responder a essa questão. O PT quer os dedos e os anéis. Lula, que nunca primou pela lealdade aos companheiros de viagem, não pensará duas vezes antes de atirar Dilma aos leões, se isso for necessário para sua estratégia de manutenção do poder. Lula não quis Dilma no programa do PT porque teria de defender um governo detestado pela maioria absoluta da população.
Dilma, por seu lado, não tinha alternativa senão deixar de aparecer em um programa tão manifestamente danoso aos interesses de sua base aliada, de seu governo – e, por que não dizer, do País.
Embora Lula tenha dito recentemente que Dilma e o PT “têm de ser que nem unha e carne” – uma imagem que serve apenas para constranger sua afilhada a se dobrar ao partido –, a presidente parece ter optado pelo distanciamento prudente. Prova disso é que o ministro da Secretaria de Comunicação Social, Edinho Silva, correu a declarar que o grande panelaço que se ouviu durante a transmissão do programa petista não era dirigido a Dilma. Segundo Edinho, seria um “erro” considerar PT, Lula e governo como se fossem uma coisa só, pois “cada um tem seu espaço de trabalho e sua agenda”.
Pois neste momento a agenda da presidente Dilma é tentar acalmar os ânimos e articular com as demais forças políticas uma maneira de tirar o País do buraco em que ela o enfiou no primeiro mandato. Já a agenda do PT – e, em especial, de Lula – é bem outra. Indiferente às agruras políticas de Dilma no Congresso, o líder petista parece apostar no confronto, especialmente no momento em que o partido aparece como protagonista de escândalos em escala nunca vista na história deste país.
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