- O Estado de S. Paulo
Vai piorar, disso ninguém duvida, e os brasileiros já vão mal antes de começar o arrocho para valer. O desemprego chegou a 7,9% no primeiro trimestre, embora a austeridade nas contas públicas, nesta altura, seja pouco mais que uma promessa. Com a indústria em crise e o empresariado à beira do pânico, a economia nacional entra muito fraca na fase do aperto. O pacote inicial do ajuste continua no Congresso, foi amaciado e deverá render menos que os R$ 18 bilhões estimados inicialmente. Os primeiros cortes no Orçamento ainda serão anunciados. O governo terá de agir com mão pesada, nos próximos meses, se quiser mesmo entregar o resultado fiscal prometido - um superávit primário de R$ 66,3 bilhões para pagar juros da dívida pública. A crise do Tesouro é evidente e por enquanto se manifesta em sinais esparsos, como a limitação de verba para o financiamento a estudantes. Mas a terapia pesada está só no horizonte e tentar adiá-la jogaria o País num buraco muito mais fundo.
Quem garante, nesta altura, a execução do programa de ajuste? Os negociadores inicialmente escalados pela presidente, seus petistas de confiança, foram afastados por indisfarçável inépcia para a função. Passaram a negociar em nome do governo o vice-presidente, Michel Temer, e o ministro da Fazenda, Joaquim Levy.
Acuada e incapaz de se defender, a presidente Dilma Rousseff cumpre a rotina funcional de forma limitada e discreta. Não demonstra disposição para enfrentar os panelaços nem para cobrar apoio de seu partido. Petistas votaram a favor da Medida Provisória 665, na Câmara, porque foram enquadrados pela liderança do PMDB. Os principais temores e esperanças do governo são hoje representados por figuras peemedebistas, especialmente pelos presidentes do Senado e da Câmara, Renan Calheiros e Eduardo Cunha, e pelo vice-presidente da República.
O aliado mais importante converteu-se na verdadeira base do governo, porque os líderes do PT se negaram, até agora, a suportar o custo político da reparação dos danos causados na última fase da gestão petista.
Enquanto o ministro da Fazenda busca apoio ao seu programa e o vice-presidente se consolida como a imagem política do Executivo, a economia afunda no atoleiro. A inflação oficial diminuiu de 1,32% em março para 0,71% em abril, mas o cenário dos preços continua aterrador. A inflação chegou a 4,56% em quatro meses, superando a meta oficial para todo o ano, 4,5%. A alta de preços acumulada em 12 meses chegou a 8,17%. Se a taxa mensal de 0,71% se repetir até dezembro, o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) subirá 10,65% neste ano.
A combinação de inflação elevada com desemprego imporá aos trabalhadores um sacrifício desconhecido há vários anos. O desemprego continuará a aumentar se a indústria permanecer em crise. A produção industrial diminuiu 0,8% de fevereiro para março. No primeiro trimestre foi 5,9% menor que a de um ano antes. Na comparação de dois períodos consecutivos de 12 meses a queda foi de 4,7%.
Não haverá recuperação segura sem maiores investimentos, mas isso parece, por enquanto, fora da agenda. Nos 12 meses até março a produção de bens de capital, isto é, de máquinas e equipamentos, foi 13,8% inferior à dos 12 meses anteriores. De janeiro a abril a importação de bens de capital foi 12,3% menor que a dos meses correspondentes de 2014. A redução de compras de máquinas e equipamentos ocorre há mais de um ano. Não se tem cuidado da ampliação nem da modernização da capacidade produtiva. Isso significa perda de eficiência e de poder de competição.
Com os erros acumulados nos últimos quatro ou cinco anos, o governo montou um conjunto de bombas interligadas. A gastança, os benefícios fiscais mal concebidos e a estagnação econômica - prova do fracasso de todos os truques - arrasaram as contas públicas. O déficit fiscal, incluído o gasto com juros, chegou a 7,8% do produto interno bruto (PIB), um dos piores resultados do mundo. A gastança, o populismo e o crescente descompasso entre a demanda interna e a capacidade produtiva provocaram uma inflação muito acima dos níveis observados nos países desenvolvidos e emergentes. O enfraquecimento da indústria derrubou a exportação de produtos manufaturados. O País tornou-se ainda mais dependente das vendas de bens primários e, portanto, do crescimento da China, hoje sujeito a uma política de ajustes internos.
Com a inflação disparada, o Banco Central tem sido forçado a elevar os juros básicos da economia. A taxa passou a 13,25% no fim do mês passado e provavelmente voltará a subir nos próximos meses. Isso aumentará os custos financeiros de um Tesouro muito endividado e ao mesmo tempo dificultará a reativação dos negócios, especialmente da atividade industrial. Com os negócios em marcha mais lenta, a receita tributária será prejudicada e o ajuste das contas públicas ficará mais difícil. O quadro poderá melhorar nos próximos meses se o governo retomar as concessões de infraestrutura e de exploração do petróleo com eficiência maior que a exibida nos últimos anos. Mas isso também dependerá de maior realismo quanto às condições de negociação. Obviamente a Petrobrás será incapaz de manter os padrões de participação observados nos últimos anos. Nada disso ocorrerá, é claro, sem aumento da confiança dos investidores no governo e nas possibilidades da economia brasileira.
Na sua fantasia, a presidente Dilma Rousseff continua incapaz de admitir ou, talvez, até de entender os próprios erros. Falando a sindicalistas antes da festa de 1.º de Maio, ela atribuiu os males do País à crise internacional e a “anos contínuos de seca no Brasil”. Houve seca em algumas áreas, mas desde 2004-2005 a produção de grãos e oleaginosas só diminuiu na safra 2008-2009. Em todos esses anos o agronegócio foi de longe o setor mais dinâmico. A indústria foi muito mais vulnerável às bobagens de um dos governos mais incompetentes da História nacional.
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*Jornalista
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