terça-feira, 7 de novembro de 2017

Cunha nega compra de silêncio por Joesley

Murillo Camarotto | Valor Econômico

BRASÍLIA - O ex-deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) disse ontem em depoimento à Justiça Federal que a tese de compra do seu silêncio pela JBS foi forjada para forçar a derrubada do presidente Michel Temer. Segundo ele, o ex-procurador-geral da República Rodrigo Janot cometeu uma série de equívocos na ânsia de tirar o presidente do cargo. Cunha admitiu ter promovido reuniões entre Temer e empresários, inclusive Joesley Batista, mas negou que os encontros trataram de propina.

"Queriam atribuir isso (a compra do silêncio) para justificar uma denúncia que pegasse o mandato do senhor Michel Temer. Prova forjada, deram uma forjada e o senhor Joesley foi o cúmplice dessa forjada", disse Cunha ao juiz Vallisney de Oliveira, da 10ª Vara Federal de Brasília. Cunha é réu em processo relativo à Operação Sepsis, que investiga um esquema de cobrança de propina relacionado ao FI-FGTS, braço de investimentos do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço.

Em quase seis horas de depoimento, Cunha não fez qualquer acusação contra Temer. O único integrante da alta cúpula do governo atingido por ele foi o ministro da Secretaria-Geral da Presidência, Moreira Franco, acusado por Cunha de mentir em depoimentos à Justiça. O ex-deputado, entretanto, não relatou nenhum episódio de recebimento de propina por parte do ministro, mas disse de forma irônica que, "em se tratando de Moreira Franco, ele deve ter recebido". Procurado, o ministro disse que "são notórias as divergências políticas entre mim e o ex-deputado, portanto, não me surpreende qualquer juízo de valor."

Preso há pouco mais de um ano, o ex-deputado admitiu que promoveu pelo menos um encontro entre Temer e Joesley. O encontro teria acontecido em 2012 e tratou de um pedido de apoio ao empresário para a campanha do então candidato do PMDB à Prefeitura de São Paulo, Gabriel Chalita.

O ex-deputado passou a maior parte do depoimento contestando afirmações do operador Lúcio Funaro, que é réu na mesma ação e fez acordo de delação premiada. Cunha afirmou que seus advogados irão protocolar na PGR um pedido para anulação ou rescisão do acordo de Funaro, que estaria repleto de falhas causadas pela pressa de Janot em fechar a delação para pegar Temer.

O operador, segundo Cunha, omitiu os nomes de uma série de parlamentares que teriam negócios com ele. Funaro também teria omitido suas operações com o ex-senador Delcídio Amaral, que foi cassado após ser flagrado em uma trama para evitar a delação do ex-diretor da Petrobras Nestor Cerveró.

Cunha também negou que ele e Temer tenham recebido propina do grupo Bertin, como Funaro disse em depoimento prestado na semana passada. Segundo o ex-deputado, o grupo empresarial queria ter uma relação institucional com os políticos e ofereceu doações eleitorais legítimas.

Sobre as acusações constantes no processo da Operação Sepsis, Cunha também negou ter cometido ilegalidades. De acordo com as investigações, ele e Funaro controlavam as ações do ex-vice-presidente da Caixa Econômica Federal Fábio Cleto, que teria sido indicado por Cunha e que tinha assento no Conselho Curador do FGTS, onde atuava em defesa dos interesses de empresas que pagavam propina ao grupo.

Cunha disse que a indicação de Cleto resultou de uma lista tríplice entregue pela bancada do PMDB ao então ministro da Fazenda, Guido Mantega, que foi o responsável pela escolha. Cleto, segundo Cunha, não tinha currículo condizente com o cargo, mas Mantega teria "se enamorado" por ele e o escolheu.

Já sobre a indicação ao conselho do FGTS, Cunha disse que o responsável foi Jorge Hereda, ex-presidente da Caixa e ligado ao PT. Ainda assim, alegou o ex-deputado, Cleto era praticamente uma "rainha da Inglaterra", ou seja, não tinha poderes para aprovar sozinho os financiamentos requeridos pelas empresas.

Cunha reconheceu a longa relação com Funaro e disse que eles chegaram a ser amigos. Rechaçou, contudo, qualquer tipo de sociedade para negócios ilícitos e o recebimento presentes do operador, como carros de luxo e um flat adquirido do ex-jogador de futebol Vampeta. O ex-deputado garantiu que foi ele, e não Funaro, quem pagou pelo imóvel.

Em um desabafo ao juiz, Cunha disse estar vivendo uma "penúria" financeira e que seu advogado está trabalhando sem receber. O ex-deputado lembrou que está com os bens bloqueados desde o ano passado e que sua transferência definitiva para Brasília é fundamental para que a ampla defesa possa ser exercida.

Cunha está preso há um ano em Curitiba, mas permanece em Brasília desde o fim de setembro por conta dos depoimentos da Operação Sepsis. Seu advogado solicitou a transferência definitiva para a capital federal. O pedido já foi rejeitado pelo ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal (STF).

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