Presidente
americano quer deslegitimar voto pelo correio que pode dar vitória a democrata
Faltando
pouco mais de um mês para as eleições presidenciais, os Estados Unidos podem
ver o atual presidente não reconhecer eventual derrota e se negar a fazer uma
transição pacífica caso a eleição se decida com os votos pelo correio.
Trump
foi questionado duas vezes, recentemente, se se comprometia com uma transição
pacífica de poder se vier a perder as eleições; uma em entrevista à Fox News,
em julho, e outra em entrevista coletiva na Casa Branca, na última quarta-feira
(23). Nas duas ocasiões, preferiu não se comprometer. Na convenção do partido
Republicano, em agosto, disse que só perderia a eleição se houvesse fraude.
Em
2016, mesmo tendo vencido, Trump acusou Hillary Clinton de ter se beneficiado
de milhões de votos de imigrantes ilegais —alegação feita sem nenhum
embasamento.
Nas
últimas semanas, Trump tem dado em média quatro declarações diárias colocando
em dúvida a confiabilidade do voto postal. Esse tipo de voto, no qual o eleitor
recebe as cédulas com antecedência e as envia pelo correio, é utilizada desde o
século 19 e tem um nível de segurança aceitável.
Na
verdade, esse ou qualquer outro tipo de fraude eleitoral é muito infrequente
nos Estados Unidos.
Levantamento
do Centro
Brennan, ligado à Universidade de Nova York, mostrou que fraudes
apuradas variam de 0,0003% a 0,0025% dos votos, o que, no universo de uma
eleição presidencial, com cerca de 155 milhões de eleitores, equivale a menos
de 3,9 mil votos —uma quantidade quase certamente incapaz de afetar o resultado
final.
Apesar
disso, o fantasma da fraude no voto postal pode gerar um perigoso impasse.
Em
tempos normais, não há diferença significativa na opção pelo voto por correio
entre eleitores democratas e republicanos, mas durante a pandemia pesquisas têm
mostrado que democratas --que consideram a Covid mais grave —pretendem fazer
mais uso do voto pelo correio.
A
diferença é tão grande que simulações da empresa de dados Axios dão
como altamente provável que a apuração com os votos presenciais dê vitória
parcial a Trump, mas, após a contagem dos votos pelo correio, Biden saia
eleito.
A
incerteza é como Trump vai agir no intervalo entre a publicação do resultado
parcial e do resultado final.
Reportagem
da revista The Atlantic mostra
que líderes do partido Republicano estudam, em alguns cenários, declarar
suspeição das eleições, de modo que deputados estaduais determinem qual vai ser
o voto de todo o Estado —uma possibilidade prevista na Constituição, mas jamais
colocada em prática, e que pode jogar o país numa crise sem precedentes.
*Pablo Ortellado, professor do curso de gestão de políticas públicas da USP, é doutor em filosofia.
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