Bolsonaro e Guedes negociaram a proposta de Renda Cidadã com líderes do governo no Congresso, mas ainda não existe maioria no Senado nem na Câmara para sua aprovação
A
proposta de Renda Cidadã, anunciada ontem pelo governo, não teve boa aceitação
no Congresso, nem no mercado financeiro. O projeto foi embarcado na chamada PEC
Emergencial pelo seu relator, o senador Marcio Bittar (MDB-AC), com o propósito
de obter de R$ 25 bilhões a R$ 30 bilhões a mais que os recursos destinados ao
Bolsa Família, que será extinto pelo presidente Jair Bolsonaro porque é a cara
do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). A intenção do governo é
conceder um auxilio de até R$ 300 para cada beneficiado, ampliando a base do
programa para um número maior de pessoas, mas esses recursos não estão
disponíveis no Orçamento da União de 2021.
Os
parlamentares são a favor da transferência de renda para as parcelas mais
carentes da população, mas não quanto à origem dos recursos, que muitos
interpretam como uma maneira de burlar o teto de gastos (o aumento das despesas
do governo não pode ultrapassar a taxa de inflação) e a Lei de Responsabilidade
Fiscal. Esse dinheiro sairia dos recursos destinados aos precatórios, que são
as dívidas judiciais do governo já transitadas em julgado, uma espécie de
calote temporário, e de uma parcela do Fundo Nacional de Desenvolvimento da
Educação Básica (Fundeb), que levaria uma mordida de 5%, a pretexto de que o
dinheiro seria vinculado à obrigação de as crianças das famílias beneficiadas
frequentarem a escola.
Segundo
Bittar, o valor do benefício ainda não foi fixado, devendo ficar entre R$ 200 e
R$ 300 (o Bolsa Família chega até R$ 205 para cinco beneficiados).
Especialistas em contas públicas avaliam que a proposta adia indefinidamente o
pagamento de dívidas da União, além de mascarar a ultrapassagem do teto de
gastos ao destinar recursos do Fundeb para o Renda Cidadã, o que muitos
interpretam como um desvio de finalidade. A reação do mercado foi péssima: a
Bovespa desabou e o Banco Central (BC) teve de vender dólares para evitar que
subisse muito.
O
presidente Jair Bolsonaro e o ministro Paulo Guedes negociaram a proposta com
Bittar e os líderes do governo no Congresso, mas ainda não existe massa crítica
no Senado nem na Câmara para aprovação do novo programa. A construção dessa
maioria não será fácil, mas não é impossível, porque muitos parlamentares, nas
duas Casas, defendem uma política de transferência de renda para as pessoas que
ficaram desempregadas ou sem seus pequenos negócios durante a pandemia.
Entretanto, aprovar um calote nos precatórios e tirar recursos do Fundeb é
outra história. Os lobbies dos advogados e da Educação são muito ativos e
fortes. A inclusão da proposta na PEC Emergencial dificulta muito a aprovação,
porque exige quorum elevado, mas, em contrapartida, reduz as possibilidades de
judicialização do Renda Cidadã.
A
grande aposta de Guedes para viabilizar o programa continua sendo a reforma
tributária, na qual pretende criar um imposto digital, que está sendo chamado
de nova CPMF, a pretexto de compensar a desoneração da folha de pagamentos.
Ocorre que o Congresso não é nada simpático à criação de um novo imposto às
vésperas das eleições municipais. Bittar anunciou também a criação de gatilhos
para manter o teto de gastos e a redução em até 25% dos salários dos
servidores. As duas propostas também terão dificuldades para aprovação, mas o
Palácio do Planalto está mais confiante na capacidade de articulação de seus
líderes no Congresso e na força do chamado Centrão.
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