Ruído entre STF e Forças Armadas, enquanto Bolsonaro se aproxima de antilavajatistas
O
novo foco político está no mal-estar entre as Forças Armadas e o Supremo, após o ex-comandante do Exército Eduardo
Villas Bôas confirmar, em livro-entrevista da Fundação Getúlio
Vargas (FGV), o que me disse em 4 de abril de 2018 e publiquei no Estadão:
suas mensagens no Twitter contra um habeas corpus para o ex-presidente Lula
sair da prisão não foram pessoais, foram combinadas com o Alto Comando do Exército.
Na reportagem, depois da forte repercussão à sua manifestação pelas redes sociais, ele me disse que a sua fala “expressa a posição do Alto Comando do Exército e é exclusivamente a da Força”. Ou seja, o general não foi ao Twitter por conta própria, e sim pelo Exército. Só fez uma ressalva: que não combinou com Aeronáutica e Marinha.”
No
livro Villas Bôas: conversa com o comandante (Editora FGV, 2021, 244 págs), de
Celso Castro, o general detalhou em setembro de 2019: “O texto teve um
‘rascunho’ elaborado pelo meu staff e pelos integrantes do Alto Comando
residentes em Brasília. No dia seguinte, remetemos para os comandantes
militares de área. Recebidas as sugestões, elaboramos o texto final, o que nos
tomou todo expediente, até por volta das 20 horas, momento que liberei (para
divulgação)”.
O Alto Comando reúne os generais-de-Exército, de quatro-estrelas, que chefiam as regiões militares e os principais departamentos e secretarias da Força. Foram eles quem produziram os dois textos que Villas Bôas publicou em 3/4/2018, véspera do julgamento do Supremo sobre manter ou não Lula preso – o que faria, como fez, toda a diferença na eleição presidencial, meses depois.
Primeiro
tuíte do general: “Nessa situação que vive o Brasil, resta perguntar às
instituições e ao povo quem realmente está pensando no bem do País e das
gerações futuras e quem está preocupado apenas com interesses pessoais?” Em
seguida: “Asseguro à Nação que o Exército julga compartilhar o anseio de todos
os cidadãos de bem de repúdio à impunidade e de respeito à Constituição, à paz
social e à Democracia (...)”.
Assim
como Villas Bôas não falou sozinho, a reação do decano do STF também não foi
pessoal. Celso de Mello, hoje já aposentado, não citou o comandante,
mas classificou a manifestação dele como “claramente infringente do princípio
da separação de Poderes” e criticou “insurgências de natureza pretoriana que, à
semelhança do ‘ovo da serpente’, descaracterizam a legitimidade do poder civil
instituído e fragilizam as instituições democráticas”. Em nota de ontem, na mesma
linha, o ministro Edson Fachin considerou “intolerável e inaceitável qualquer forma ou modo de
pressão injurídica sobre o Poder Judiciário”.
À
FGV, Villas Bôas, que é da reserva e sofre de ELA, uma doença degenerativa,
disse que sua manifestação foi “um alerta, antes que uma ameaça”. Ele, porém,
repetiu o que também já me dissera em sua primeira entrevista como comandante
do Exército, publicada no Estadão em dezembro de 2016, um ano e
quatro meses antes do julgamento do HC de Lula. Segundo ele, “tresloucados e
malucos” batiam às portas das Forças Armadas (FA) pedindo a volta dos militares
ao poder. Algo, dizia, que tinha “chance zero”.
O livro de Villas Bôas vem numa hora de noticiário desfavorável às FA e em que Bolsonaro, contrário a Celso de Mello, Fachin e Alexandre de Moraes, já identificou um elo no Supremo: o antilavajatismo. Por essas ironias da história, ou espertezas da política, o presidente que usou Sérgio Moro como troféu se une aos algozes de Moro e defensores de Lula para proteger filhos e Centrão. E que, eleito com um empurrão dos militares, usa símbolos das FA e libera o uso do nome delas, em vão, para insinuar golpes. Podem ser meras bravatas. Ou não.
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